1950

Vênus, Marte e Júpiter

Arabella estava deitada em sua cama com Vênus a ronronar em seu colo, estava absorta a luz matinal que percorria pelo carpete de seu quarto, seus cabelos esvoaçantes com alguns fios caídos em seu rosto angelical, métricamente desenhado, suas mãos brancas de unhas compridas em um tom rosado acariciavam os pelos sedosos da gatinha que se deleitava sob suas carícias. Usava uma camisola branca de cetim e sentia sua mente vagar pelos últimos acontecimentos.

Yoongi havia deixado claro que gostaria de manter algo com a garota e fez questão de enfatizar que iria para ela onde fosse, mesmo que isso significasse ir embora de Barcelona, coisa que Arabella não cederia.

Estava encantada pela cidade. Após anos observando-a através de cartões postais e imaginando momentos alegres com seu melhor amigo por essa cidade, quando finalmente estava a sentir seus pés farfalhando pelas ruas tão bonitas e movimentadas, não poderia ir embora. Sentia uma espécie de milhões de elefantes em seu estômago, já não eram mais borboletas, era algo mais efervescente e forte, elefantes e girafas, zebras e cangurus bagunçavam seu interior todas as vezes que sentia a fragrância natural quase mentolada do menino que tanto sombreava as paletas de sua mente.

Sentia-se atordoada por permitir que um ser humano mesclasse tons pastéis, cores frias e alguns resquícios de sombras escuras em seu peito, temia os movimentos de Yoongi, em um falso passo o garoto tomaria seu coração em suas mãos e estilhaçaria como cacos de vidros. Todo o seu ser se agitava. Embora não achasse de todo ruim que Yoongi tivesse seu coração para si, rezava baixinho para que ele não a ferisse, e de certa forma, confiava nisso, caso ao contrário não estaria a mercê de seus beijos de cerejas e canelas e perdida em sua fragrância única.

A porta se abre vagamente e logo vê o semblante de seu melhor amigo.

Jeon Jungkook trajava uma de suas camisas listradas em tons de brancos e azuis, calças jeans claras e os fios de cabelos já compridos estavam enfeitados sob o gel, ao estilo atual. Em seu pulso uma corrente delicada de prata estava dando o toque final para sua beleza irradiante.

Creio que em outra vida, Jeon poderia ter sido filho de afrodite, a deusa da beleza, ou quem sabe herdar a masculinidade de Apolo, embora outrora fosse Hélios, o deus do sol. Sua boca rósea estava moldurada em um belo sorriso de dentes alvos e leitosos, um sorriso adocicado por tomilho e alecrins, leite e mel pingavam de seus lábios bonitos.

Seus olhos guardiões de toda a magia presente na Terra brilhavam belamente como mil estrelas em um céu pentecostal, ofuscando qualquer vestígio do sol brilhante que na presença do moreno, não ousou enfrentar a sua luminosidade e optou por esconder-se através das nuvens, quem sabe, envergonhado por estar na presença de uma grande figura iluminada, atraente e fervorosa. Jeon Jungkook também era uma estrela.

O amigo lhe convida para irem até ao seu ateliê, o que rouba um sorriso largo que temia rasgar a face de Arabella, sentia-se transbordar de orgulho de seu amigo, ele finalmente conseguiu um ateliê para si, para suas obras, sua arte e para explorar tudo aquilo que há de mais valioso dentro de seu coração amanteigado.

O ateliê de Jeon ficava um pouco distante do centro da cidade, perto da vila onde reinavam quitandas e casas simples, e isso pintava um perfeito cenário que combinava fielmente a simplicidade conjuntura da personalidade brilhante do moreno.

Seu ateliê mais parecia uma casa vitoriana com arbustos e calêndulas enfeitando os tons amarelos e laranjas. Havia uma placa com letras bonitas ramificando-se em imagens de morangos, magnólias, nuvens e um pequeno desenho do sol e da lua em contraste, formando a palavra Morangos Mofados, o nome de seu ateliê.

Seu ateliê retratava com maestria e não pecava na falta de detalhes e simbolismos que compunham o garoto bonito que agora se punha a tagarelar no ouvido de sua melhor amiga.

Arabella respirou aliviada o ar puro e percorreu seus olhos verdes tão curiosos sobre o estúdio de arte de Jeon, era tudo tão bonito e a moda, um pequeno espaço, uma pequena fábrica de magia.

Pode-se sentar e abrigar-se de um bom vinho enquanto cantarolava Paul Anka observando as costas largas de seu amigo viradas para si enquanto as mãos abrigavam o pincel como se já fizesse parte de seu corpo, mente e alma.

Era um misto de sensações quentes observar Jeon pintando em aquarelas, seja qual for o bordado que ele deseja criar em suas telas, sempre é crítico, inteligente, astuto e audacioso. Uma mente brilhante em uma década retrógrada.

Permitiu-se viajar nas lembranças de anos atrás onde Jungkook recebia insultos da classe por dizer com veemência "Quero ser pintor e viver da minha arte, quero desprender as amarras do mundo e tornar tolos como vocês em grandes sonhos fugazes" e céus, sentia seu peito contrair em orgulho e gratidão por estar diante de uma alma corajosa como ele, como a sua. Sempre em harmonia, sintonia, unindo-se, ramificando e entrelaçando o amor vívido que compartilhavam.

Sentiu o sino tocar agudo indicando que alguém havia chegado e não esperava cruzar com aquele par de olhos melancólicos tão cedo.

Min Yoongi estava divino. Camisa branca, calças jeans, meus olhos queimavam em sua direção, era como James Dean com certeza, bonito e doentio como um câncer.*

Seus olhos sorriram para mim em sintonia de seus lábios rosados, uma boca enluarada, macia e desejosa para se beijar. Eu poderia passar horas a fio apenas degustando do sabor de canelas e cerejas de sua língua aveludada. Ele era lindo a distância, mas sob o toque se desmanchava em beleza e decalcomania a meu olhar.

- Olá Ara, como vai? - Diz abraçando-me delicadamente e ainda sim com um instinto protetor e fogoso em combustão. Eu poderia desfalecer em suas mãos.

- Yoon! Eu não esperava vê-lo aqui. Senti sua falta... - Sussurro a última frase mais baixo, ao pé de seu ouvido percebendo os pelos de seu corpo se arrepiarem enquanto minha pele formigava por conta de sua reação.

- Eu sinto sua falta todos os dias, posso sentir sua falta até mesmo aqui, quando estou em sua frente, em seus braços. - Disse baixinho com seu tom rouco percorrendo um frio por minha espinha, céus, eu nunca me acostumarei com sua beleza infinita.

- Ei! Será que os pombinhos podem deixar para ter momentos íntimos quando estiverem a sós? - Ouço a voz de Jeon soar brincalhona, mas em um tom de aviso, a pontada de ciúmes protetor de Jungkook era engraçada, confesso.

Jeon e Yoongi cumprimentaram-se e logo estávamos todos a companhia de vinho, músicas e arte.

Debruçada ao chão eu escrevia os capítulos de minha nova história, e ao meu lado Yoongi trabalhava em sua música, Jeon a nossa frente pintava um de seus quadros, cada um dos três alinhados em uma mesma órbita, redigindo o nosso próprio sistema planetário. Eu seria Vênus, o segundo planeta mais próximo ao sol, reverberando brilhante no céu, ficando atrás apenas da Lua e do Sol. Yoongi, seria Marte frio, gelado, composto por duas luas, Fobos e Deimos, Medo e Pânico, com sua intensidade descomunal, marca-se em tempestades de poeiras, um planeta que embora haja opiniões contrárias, é possível haver vida, e sim, era lindo depositar-se sobre o planeta vermelho. Jeon, seria Júpiter o maior planeta, visível a olho nu, marcado por sua Grande Mancha Vermelha, é o quarto objeto mais brilhante do universo, Jeon é lindo, grandioso, valente e irrevogavelmente belo.

Em rotação estamos prosseguindo, navegando em trojans, permitindo que quando um sistema fraqueje, possamos pegar carona na calda do cometa do outro, estamos construindo uma vida improvável e impossível, cultivando sentimentos desconhecidos e se entregando sem medo ou questionamentos, permitindo aproximação, aprimorando a arte enquanto traçamos nosso próprio caminho. Estamos nos despindo, camada por camada.
Será lindo, e Barcelona inteira irá presenciar a colisão ou difusão dos três magníficos planetas solares.

*- Referência a Blue Jeans, a canção maravilhosa e linda da rainha Lana Del Rey

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Eu amo vocês 🌘