Velha e Louca - Mallu Magalhães
Londres, Fevereiro de 2023
O primeiro mês em Londres não poderia ter sido melhor, mesmo com a visita do Eduardo logo depois que eu cheguei. Apesar de ter havido certa tensão, ele me passou serenidade e conseguiu de alguma forma confortar meu coração.
"Nara, eu sei que o que eu fiz não foi certo, e durante esses 10 anos você, sua mãe, sua avó e meus pais, se saíram muito melhor com o Arthur do que eu, você abriu mão de tanta coisa, enquanto eu fui imaturo desde o primeiro momento."
Estávamos sentados num café perto do hostel que eu estava hospedada, Eduardo ainda tinha os mesmos olhos cor de mel que muda pra esverdeado conforme o humor, - ou o tempo - o cabelo comprido e cacheado, foi cortado de forma que fique mais apresentável, para o engenheiro que ele se tornou. Mas o jeito que ele fala, sempre tão cauteloso e preocupado, mostra que o garoto de 15 anos por quem eu me apaixonei ainda está ali.
"Eu juro, que eu não quero tirar o nosso filho de você e nem vou impedir que quando você volte pra Portugal, o Arthur não vá morar com você de novo, só estou te pedindo um ano com ele, pra que eu possa de alguma forma compensar pelo meus erros, eu não estava presente quando você precisou" cada palavra dele ali, amolecia um pouco a armadura que eu havia criado ali, que por mais imbecil que fossem algumas de suas atitudes, ele nunca foi mentiroso "eu só quero que você tenha tudo o que você sonhou, mesmo com um atraso de 10 anos nos seus planos"
Voltei a realidade calçando as botas pretas por cima da meia-calça, já estava acostumada com o frio europeu, então optei por usar um vestido simples pra ir para o apartamento da Sarah. Hoje faríamos uma noite das meninas, aproveitar o tempo que tínhamos juntas é sempre prioridade, então optamos por massas e vinhos, no apartamento mesmo, onde poderíamos falar nossas besteiras, rir alto e fazer chamada de vídeo junto com a Jé, a Kath e a Ray, que ainda estavam no Brasil. Carol chegou do Brasil faz alguns dias, já tinha arrumado um crush - brasileiro por sinal -, e vai morar no mesmo prédio que a Sarah.
Eu não via a hora de sair do hostel, que por mais aconchegante que fosse, era cansativo, porque não tinha a minha cara, e eu não podia decorar o pequeno quarto do jeito que eu queria, mas tinha uma coisa boa, eu consegui um quarto individual, então não precisava me preocupar em dividir o quarto com alguém estranho.
Meu celular vibrou indicando uma mensagem, achei que era de alguma das meninas perguntando se eu ia demorar, porque como sempre eu estava atrasada, mas dessa não vez a culpa não foi 100% minha, Vivian pediu de ultima hora que eu fosse em uma loja buscar um tecido que ela havia encomendado o que atrasou todo o meu serviço e fui obrigada a sair mais tarde do ateliê. Mas era uma mensagem da Jé perguntando como estavam as coisas, e me falando mais uma vez que ela teria que adiar a viagem dela.
Eu e a Jé já éramos amigas fazia um tempo antes das M-girlz, mas ter entrado pro grupo só nos fortaleceu ainda mais, e confesso que estava morrendo de saudades dela, a vida dela no Brasil estava super corrida e ela mal tinha tempo pra falar no grupo, as mensagens eram raras e sempre um grande resumo de tudo, pra não perder tempo com as trivialidades. Respondi a mensagem dela, e já mandei mensagem para as meninas no grupo avisando que já estava indo.
"Senhora Nara" Mary a recepcionista do hostel, devia ser mais velha que eu, mas não perdia a cordialidade, é o charme britânico não é?!
"Sim Mary"
"O senhor John do quarto ao lado do seu pediu pra lhe entregar isso" fui em direção a Mary e peguei os tickets de um festival de música que iria no próximo sábado em um parque um pouco distante da cidade.
"Ele não tem jeito né"
John era meu vizinho de quarto, um australiano típico, corpo sarado, branco, olhos azuis e loiro, estava de passagem por Londres por 3 meses, chegou poucos dias depois que me hospedei, e não perdia uma oportunidade de dar em cima de mim, e envolver Mary nas tentativas frustadas de sair comigo.
"O que tem eu?" ele disse me assustando parando na porta da recepção
"Boa noite John, você não cansa de tentar sair comigo?" eu disse com um sorriso no rosto.
John sempre transpassava uma calma imensa no olhar, e no seu porte físico, mas eu conseguia ver através daqueles olhos azuis, e sabia que por trás dessa serenidade toda tem um furacão e que se eu deixar com certeza vai virar a minha vida de cabeça pra baixo, o problema é que se eu permitir que o furacão John entre, eu com certeza vou me ferrar, já que esse possível romance tem prazo de validade.
"Eu sou incansável, linda" e me deu uma piscadinha, capaz de molhar qualquer calcinha, inclusive a minha naquele momento.
Ficamos nos encarando por alguns segundos, até meu celular receber uma mensagem, da May um áudio de 35 segundos, brigando comigo por eu estar atrasada ou falando que Carol estava nervosa com o atraso, porque isso com certeza não estava na planilha dela de afazeres para nossa noite.
Nem ouço o áudio, mas respondo dizendo que estou indo. O apartamento da Sarah é apenas 3 quarteirões de onde estou hospedada, então se eu for rápido chego em 10 minutos. Vou em direção a porta, quando John segura meu braço me impedindo de sair.
"Te espero na porta do seu quarto as 14horas no sábado, ta bom linda?"
"Eu tenho alternativas?"
Ele só deu mais uma piscadinha sedutora, soltou meu braço e foi em direção a escada. As meninas vão ter um treco quando eu contar o que aconteceu, o sonho delas, é que eu fique logo com ele, e por mais que eu diga que eu não queria, confesso que estou ansiosa pra que sábado chegue logo.
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Nothing Changes.
Romance" Há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à...