"O homem está condenado a ser livre, condenado porque ele não criou a si, e ainda assim é livre. Pois tão logo é atirado ao mundo, torna-se responsável por tudo que faz".
- Jean Paul Sartre
****
Aos doze anos, minha vida começava a se despedaçar. Lembro-me de acordar feliz naquele dia, afinal, era o retorno das aulas, estava ansiosa para reencontrar meus coleguinhas de classe. Era primavera e o sol brilhava lá fora, o dia estava lindo, lindo demais...
Nem mesmo em pesadelos poderia imaginava a grande bola de neve que minha vida iria se tornar a partir dali.
Naquele dia minha mãe nos deixaria.
Flashback:
15 de setembro de 2012
Finalmente havia chegado o grande dia, desço as escadas alegre e corro em direção a cozinha, encontro meus pais arrumando a mesa do café da manhã - bom dia meu amor - minha mãe diz assim que me sento a mesa, lhe respondo com um sorriso contido. Eles já se encontravam prontos para o trabalho, ambos com suas devidas roupas sociais, trabalhavam no "Escritório de advocacia Klein's" o qual construíram juntos, assim como nos filmes de romance eles se conheceram ainda na faculdade, e o que era amizade, virou amor.- Ansiosa pelo primeiro dia, filha? - meu pai me pergunta com uma careta, escuto a risadinha de minha mãe ao fundo. Qual é?? Até que estava contida.
- Um pouco, Gabi e Lucas viajaram nas férias, não pude vê-los. Tenho saudades - faço um beicinho vendo os dois darem um sorriso largo.
~~
Estava totalmente vidrada na explicação que Ana, nossa professora dava, quando somos interrompidos por batidas na porta, a diretora baixinha se revela na sala nos dando um bom dia e pedindo um minutinho com a professora. Algum aluno já teria aprontado no primeiro dia? Quando retornaram a sala, vi o pesar nos olhos das duas ao me encararem.
A diretora pediu para lhe acompanhar até a secretária, pois uma amiga de meu pais viria me buscar, minha cabeça se lotou de dúvidas, tentei a todo custo conseguir respostas, mas... só recebia que logo estaria com meu pai e ele me daria todas.
Meia hora se passa e vejo tia Veronica, amiga de anos da família, vindo em minha direção, sua feição era de preocupação e medo. Ali soube que independente do que havia ocorrido, era algo bem sério.
Meu coração batia desesperado em meu peito, uma das informações que tia Veronica havia me dado, era que mamãe havia passado mau e estava sendo atendida. Eu só queria vê-la e saber que tudo ficaria bem...
Estávamos a caminho do Hospital e o clima no carro era de completa tensão, nunca havia passado por isto, não sabia como agir, o que falar... nunca em minha vida havia sentido essa bagunça de sentimentos em meu interior.
Assim que chegamos no Hospital, vamos juntas em direção a recepção, de longe vejo meu pai e corro em sua direção, saltando em seu colo, sinto suas bochechas molhadas e consigo ouvir seus afoitos sussurros:
"minha garotinha... vai dar tudo certo... vai sim, vamos superar isso..."
Após instruções da recepcionista, nos dirigimos a sala de espera, estava sentada ao lado de meu pai balançando minhas perninhas impacientemente, esperavamos o médico responsável com as devidas informações. Olho para meu pai e o vejo com sua cabeça inclinada para trás e os olhos fechados, respirava profundamente. Veronica havia se recusado a sair do nosso lado, segurava firmemente minha mão, tentando me passar segurança...
- Familiares de Rebeca Klein? - um moço rechonchudo e de jaleco chega de repente, tirando todos de seus devaneios.
"aqui" pulamos da cadeira de imediato.
- E minha mulher, doutor? Como ela está? O que houve? - meu pai começa a disparar centenas de perguntas, o médico me olha, e vejo em sua face o sentimento de pena e compaixão.
- podemos nos sentar? - ele aponta para as poltronas que ficavam ao canto da sala de espera - Bom... entendem o que é um AVC? A senhora Rebeca sofreu um AVC hemorrágico, não é um tipo tão comum, mas casos vem a acontecer... eu e minha equipe entramos com todas as medidas cabíveis, mas Rebeca teve uma parada cardíaca durante a cirurgia, infelizmente...
Fim do Flashback.
Em minha cabeça, após esta famosa frase, tudo vira um borrão. Começava ali um caminho de linhas tortas para mim. Perdi minha mãe aos doze anos e a partir dali, fui perdendo meu pai também. Marcelo, que era um homem de sorriso fácil, de ótimos conselhos, de bons abraços... depois da morte de minha mãe, se jogou em um abismo e me levou junto.
"minha garotinha, vai dar tudo certo... vai sim, vamos superar isso..."
Eu acreditei.

VOCÊ ESTÁ LENDO
Luz Luna
Romance"Porque você se foi mamãe ? papai precisava de você aqui. Eu precisava..." Luna se vê perdida sem ter em quem se apoiar após a morte de sua mãe, seu pai que era o seu porto seguro, passou a ser o seu abismo. Seus dias passaram a ser escuros, dias...