Capítulo 1

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Era uma vez...

Talvez eu não tivesse aberto o jogo por medo do que viria depois, nunca fui muito boa em lidar com esse tipo de sentimento. O mundo é superficial demais e se alguém julgasse o que eu carrego em meu coração como algo "da boca pra fora" eu me sentiria ainda pior. Eu não gostava dele como todas as garotas da minha idade gostam daqueles mauricinhos, eu o amava. Embora fosse cedo para dizer isso, aquela era a única certeza que eu carregava em meu coração.

- Por que não me contou antes, Manu?

Aquela pergunta ecoava em meu pensamento e eu tentava encontrar uma resposta por não ter contado nem ao meu melhor amigo sobre esse primeiro amor.

- Eu não gosto de sentir isso. Queria poder esconder até de mim, Ítalo!

- Mas acontece com todo mundo, você não tem culpa.

Era esse o maior problema, eu nunca gostei de me encaixar nos padrões de "todo mundo". Sempre achei as pessoas superficiais demais e eu não era assim, nunca fui, eu sabia que podia ser melhor que esse "todo mundo", não no sentido literal, mas em algum outro sentido que esse mundo maluco carrega. Eu sabia que era capaz de ir além, todos são.

- Se aconteceu comigo é por que, de fato, eu tenho culpa.

- Não, não tem, Manu! As pessoas se apaixonam, isso é tão normal quanto sentir fome.

- Ele é meu amigo há séculos, isso não é tão normal quanto sentir fome!

- É sim, o problema é que você não olha pelo lado certo. Todo coração está aberto a novas descobertas, Manu.

- E agora, Ítalo?

Aquela era a única pergunta que me interessava naquele momento. Queria poder descobrir o que viria depois, assim cortava logo o mal pela raiz, embora eu já tivesse percebido que aquela raiz estava fincada na terra há muito tempo e que um broto já havia dado origem a uma árvore. A primeira árvore do meu jardim.

- Agora é hora de assumir esse sentimento a si e se acostumar com a situação. Vamos ver no que dá, Manu, estou contigo nessa.

Era bom saber que Ítalo existia e que estava me apoiando naquele momento. Ele conseguia ser o pior amigo do mundo, algumas vezes, mas nunca me restaram dúvidas de que ele seria sempre o melhor pra mim.

- Obrigada, de verdade.

- Não me agradeça por isso, Manu.

Ítalo me puxou para a varanda de casa de onde era possível enxergar claramente o sol dando adeus por trás dos prédios. Senti, pela primeira vez depois dessa confusão começar, meus olhos marejarem. Um arrepio percorreu todo o meu corpo ao pensar no que eu teria que enfrentar, mas ao mesmo tempo eu me senti mais segura do que nunca. Eu podia estar prestes a desabar de um precipício, mas por ele eu estava disposta a fazer qualquer coisa, inclusive a aprender a voar.

O céu mudava de cor a cada minuto, o que me trazia uma sensação de nostalgia e impotência ao mesmo tempo. Se nem eu tinha mais controle sobre a minha vida, quem teria? Se nem eu era capaz de resolver todos aqueles problemas, quem resolveria? Se nem eu tinha mais controle dos meus próprios sentimentos, quem os controlaria? Se nem eu sabia um rumo correto a seguir, quem saberia? Mais difícil do que encontrar todas essas respostas era assumir que eu já tinha todas elas estampadas em meu coração. Por que era tão difícil entender que ele fazia parte de mim?

Essa era, na verdade, a única pergunta realmente sem resposta perdida em meu pensamento tão bagunçado quanto às cores que se uniam no céu, rumo à escuridão completa. Ítalo fingia não perceber meu incômodo com aquela situação, talvez porque soubesse que eu não precisava de nada além de sua presença ali comigo, naquele lugar, naquela hora, exatamente como estávamos.

O vento balançava meus cachos longos e escuros e refrescava o ambiente depois do calor intenso feito durante todo o dia. Estávamos apoiados na grade da varanda da minha casa, onde morava, desde que nasci, com minha mãe. Senti o olhar acolhedor daquele meu amigo, que nunca havia se provado tão prestativo assim, pesar sobre mim em alguns momentos, jorrando preocupação e segurança ao mesmo tempo. Só que todos esses pensamentos juntos não eram capazes de combater a força daquele outro pensamento que sondava minha cabeça. Era ele, e agora era o nome dele que eu colocaria a frente de cada decisão da minha vida. Theo era o garoto que carregava meu coração consigo sem ao menos saber disso e um primeiro passo já havia sido dado: eu o amava, e fui forte o bastante para assumir isso a mim e ao meu próprio coração.

O tal do para sempre - É isso que dá brincar de pega-pega com o destinoOnde histórias criam vida. Descubra agora