*** 1994. O eSQUILO. ***

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*** 1994. SeTeMBRO. DOMINGO. O eSQUILO. ***

Aline estava limpando a garagem. Passava o esfregão no chão quando ouviu um motor de carro se aproximando. Conhecia bem o som do Voyage turbinado do tio do Pereba. Era todo turbinado e rebaixado como o do Alefester. Sentiu uma apreensão subir pelo corpo. Por um breve momento. Uma apreensão que passou logo. Decidida, agachou-se com destreza e largou o esfregão no chão como uma ninja. Saltou por sobre o cabo, sem soltá-lo de todo, ganhando a porta que levava ao pátio interno e correu para avisar os demais. Eles estavam atarefados dedicando atenção à bagunça que tinha sido transportada para o porão. Olhou para Kennedy que saia do porão com dois baldes de tinta repletos de terra, um em cada mão. Atrás dele vinha Pereba com uma picareta e uma pá, sujas de terra preta e nacos de barro, carregando-as como quem carrega um corpo nos braços.


- Pê, teu tio tá chegando aí... Ele não ia voltar só no final da tarde?


O rapaz largou as ferramentas no chão e esbravejou:


- Já... Mas que pústula! Bosta! Tô indo lá...

Kennedy terminou de virar o segundo balde de terra no jardim e segurou o amigo pelo pulso:


- Volta aqui, bro. Deixa que a Aline dá uma atrasada no coroa enquanto tu me ajuda com o porão.


Pereba soltou-se da mão do rapaz e começou a limpar o pulso sujo de terra, virando-se devagar para a garota, como se concordasse.


Aline protestou:


- O quê? O coroa não vai com a nossa cara, Kenne. Deixa o Pereba subir e dar um guento nele.


Kennedy retrucou de pronto, empurrando o Pereba de volta para o porão enquanto gritava com Aline:


- Volta lá pra cima, poxa! Precisamos dos músculos do cara aqui embaixo, ainda mais agora que vamos ter que acelerar. Ou tu vai arriscar quebrar as unhazinhas aqui na obra que tu aprontô para nós?


Aline concordou e, sem dizer nada, subiu correndo as escadas na direção das garagens que ficam no andar da rua de cima. Quando entrou na garagem-estúdio pela porta interna encontrou o tio do Pereba entrando no cômodo pela porta externa.


- Oi, tio do Pê! Tudo bem com o senhor?


- Oi, Aline. Tudo bem comigo.


- Ah, comigo também. O senhor voltou mais cedo?


- Mais cedo do que quem? Eu moro aqui! Cadê o Pedro? Vocês não iam ensaiar aqui na sexta-feira?


- O Pereba tá no porão. Começamos a ensaiar na sexta, mas ficamos compondo uma música nova até agora. O senhor vai gostar. Essa o senhor vai conseguir colocar a tocar na rádio?


- Pedro!

- Desculpa?


- Pedro. O nome dele é Pedro. Ele está fazendo o que no porão? Por que não estão aqui compondo, então?

Aline ficou um pouco sem jeito, mas por um breve momento. Como de costume. Pensou em responder à altura. Na altura que ela sempre quis responder para o produtor musical tio do Pereba, mas foi interrompida como todas as outras vezes anteriores em que pensou em fazê-lo desde que o conheceu. Pereba entrou pela porta e tomou a palavra:


- Aline, o Kenne Dee quer te ver lá embaixo. Ele não sabe onde colocar os vasos que você trouxe para o jardim do tio.


Assim que a garota começou a se mover para voltar para o porão, o rapaz juntou o esfregão do chão e começou a varrer a garagem enquanto retomava o diálogo, agora com o tio:


asM3M. Songbook. Playlist para o quarto volume.Onde histórias criam vida. Descubra agora