A noite... Sempre foi algo que me atraiu, tão sombria, misteriosa, tão bonita...
Sempre tive a impressão de que a noite era mais curta para me punir, para que eu não pudesse aprecia-la por tanto tempo. Eu era apaixonada por ela, tão profunda, e silenciosa como só ela.
Foi em uma noite assim que a minha vida mudou, eu nem imaginava. Estava sentada perto da janela, olhava as estrelas como se aquilo me trouxesse paz.
Morava em um apartamento pequeno, para pessoas com baixa renda... Renda, coisa que eu já não tinha mais. Estava desempregada fazia dois meses, apenas esperando o momento em que o senhorio me colocaria para fora.
Não teria coragem de pedir mais dinheiro aos meus pais, eles já foram totalmente contra quando eu quis sair de casa, principalmente para morar em um bairro de reputação tão duvidosa.
Talvez quando eu estiver morando na rua, minha mãe me chame para voltar... Eu não consigo me imaginar no meu antigo quarto, com a minha antiga vida.
Acho que me mataria se tivesse que conviver com os dois outra vez. Eram tantas brigas, tantos gritos, tantas palavras de ódio. Não sei como eles ainda não se mataram. Eu certamente não me surpreenderia.
Mas essa história não é sobre a minha família disfuncional, tão pouco sobre mim. Era tudo sobre ela, a noite, e como fui me tornando parte dela.
As estrelas me acalmavam de fato, mas minha vida estava cada vez mas monótona, eu queria me acalmar de que afinal de contas? Eu queria algo pelo que lutar, algo que me fizesse levantar da cama, me fizesse sair da rotina.
Eu mentiria se dissesse que sai de casa naquela noite sem um propósito. Eu tinha um propósito, queria algo que fizesse meu coração bater mais rápido, pois a muito sentia que ele estava parando.
Sem dinheiro, não se pode ir muito longe, pensei em andar pela rua apenas, mas seria perigoso a essa hora da noite. Eu queria um pouco de perigo, mas queria de preferência voltar para casa com vida.
Desci quatro lances de escada até chegar no que deveria ser a recepção. O síndico deveria ficar por lá, mas nunca ficava, o vigia noturno muito menos. Em uma salinha do lado havia uma sala de jogos. Ou pelo menos é o que deveria ser.
Lembro que com o passar do tempo as mesas de jogos foram sumindo, diziam que o síndico havia vendido para reformar o apartamento dele. Não sabia se era verdade, mas fazia sentido.
A única coisa que sobrou naquela sala foi uma mesa de sinuca, com o espaço vazio o porteiro e o síndico se juntaram para fazer um pequeno bar e lucrar em cima dos moradores que em sua grande maioria eram velhos bêbados e jovens viciados...
Quando entrei sentia algumas pessoas olhando para mim, boa parte ali eram homens, senti-me um pouco desconfortável, mas se eu voltasse para casa sem ter feito nada empolgante, me odiaria para sempre.
Respirei fundo e entrei então. Fui até o balcão improvisado que não passava de várias mesas juntas uma ao lado da outra. Coloquei a mão no bolso da calça e de lá tirei alguns trocados. Não tinha mais que 8 reais. Pedi uma cerveja para o síndico que ao invés de estar na recepção estava lá brincando de barman. Ele me deu uma latinha de uma marca que eu não conhecia.
-Quer copo? - Perguntou sem um pingo de delicadeza.
-Não, obriga. - Abri a latinha e tomei um gole. Era tão aguada que eu me senti realmente arrependida de ter saído de casa.
Já que não podia apreciar a bebida, comecei a olhar em volta, vários vizinho, um já brigou comigo por conta do lixo, o outro dizia que eu fazia muito barulho, tinha uma senhora que reclamava do meu gato. Que por sinal desapareceu. Ainda acho que ela deu sumiço no meu gato. Mas o que eu menos precisava era arrumar confusão com vizinho.
VOCÊ ESTÁ LENDO
The Bite
RomanceCansada de uma vida monótona, Amélia sai em uma noite decidida a fazer algo interessante. Ela só não imaginou que aquela noite mudaria a sua vida para sempre e que sua mais nova amiga assinaria a sua sentença de morte.