02 | Pescado

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No dia seguinte, ou melhor, assim que o relógio bateu às sete horas, eu acordei do sonho que estava tendo. Estranhamente, o primeiro-ministro da Noruega me perseguia por um corredor escuro acompanhado por seus vários seguranças. Ele me acusava de não ter cumprido a missão como me foi solicitada, e eu apenas corria, sem retrucar. 

Pessoalmente, eu nunca havia visto nosso primeiro-ministro, mas de alguma maneira ele estava presente no meu pesadelo. Sempre tive sonhos esquisitos, no entanto, este havia superado todos os outros, tanto que até bufei em desprezo quando me coloquei sentado no sofá de três lugares da sala de Svein, enrolado em duas mantas quentinhas que ele havia me dado na noite passada.

Era estranho ter que colocar cortinas pretas na janela para simular a escuridão da noite, já que o sol, naquela época do ano, nunca se punha nos céus do Ártico. Quanto maior a latitude, por mais tempo esse período se estende. Por acaso, Skjånes estava a exatos 70,8° de latitude Norte, ou seja, a comuna era iluminada durante quase todo o verão, e pouco importava se os relógios marcassem duas horas da manhã ou três da tarde.

Sentindo um leve desconforto no corpo, possivelmente por um mau-jeito na hora de dormir, apoiei os pés no chão de madeira gelado e subsequentemente os cotovelos nos joelhos, ficando meus braços pendidos para dentro. Respirei fundo, torcendo levemente as vértebras da minha coluna e sentindo algumas estalarem.

"Desculpe por não ter uma outra cama pra você. Se quiser, posso arranjar uma." Disse Svein, trazendo consigo um belo sorriso e indo em direção à janela. Ele abriu as cortinas e a luz dourada iluminou o interior da sala, atravessando algumas partículas que pairavam no ar.

"Não precisa, minha estadia será curta, mas obrigado mesmo assim. Ainda vou me sentir em dívida com você." Sorri vagamente, olhando-o entre as ondas escuras dos meus cabelos caídos sobre minha testa. Esse era um belo traço em comum entre nós, os cabelos compridos. 

"Ah, não é problema. Você me parece ser alguém legal." Falou, virando-se para mim enquanto coçava atrás da cabeça e jogava para as costas os longos fios desordenados de um loiro quase castanho em um gesto que achei charmoso. "Gosta de pão e café?"

Estiquei a coluna, por fim, tirando as mechas caídas sobre meu rosto ao mesmo tempo em que dizia que sim. Apesar de ser um café da manhã simples, era o que eu costumava comer. E além do mais, eu não estava em um hotel cinco estrelas para pedir uma refeição melhor. Svein me hospedou por boa vontade e eu não queria que ele perdesse a simpatia por mim, embora eu me achasse um tanto... sem graça.

Svein, vestido em seus jeans escuros e suéter azul, cujas mangas pareciam estar sob constante ameaça de estourar pela espessura de seus músculos dos braços, foi em direção à cozinha e desapareceu atrás da parede. Eu balancei a cabeça negativamente ao dar um sorriso mínimo. Ainda na sala, perguntei se poderia usar o banheiro enquanto vasculhava minha mochila atrás da minha escova e do meu creme dental. Ele permitiu, e disse que me esperaria para comermos juntos.

Logo após o café da manhã simples, porém ótimo, Svein perguntou se eu não queria conhecer mais alguns dos que viviam ali naquele fim de mundo. Eu, com foco em minha missão, disse que adoraria, que seria bom para desvencilhar-me um pouco das pessoas de Oslo, pois muitas me irritavam. E claro, essa última parte era mentira. 

Ele então olhou a temperatura num pequeno termômetro na parede entre a cozinha e a sala e disse que não precisaríamos de casacos pesados. Certamente naquele dia a temperatura subiria um pouco mais. Sendo assim, eu peguei o casaco leve que estava usando no dia anterior sob o mais pesado e o levei enrolado na cintura, caso precisasse. Minutos depois, saímos da casa. Vi que ele não trancou a porta. 

O tom límpido do céu perfeitamente azul acima de nós revelado por aquele luminoso, embora frio, sol da manhã era a característica que eu nunca me cansaria de observar em Skjånes, além, claro, daquela paisagem exuberante do norte do mundo. 

NORUEGUÊS - Série NaçõesOnde histórias criam vida. Descubra agora