Capítulo 3

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   Não lembro da última vez em que estive tão atrasada, precisava lembrar de nunca mais ir dormir tão tarde. Pulei a etapa do café da manhã, e me vesti com a primeira calça que encontrei no armário, era melhor me preocupar com o horário do que com a aparência. Por sorte, não morava longe do campus e consegui chegar vinte minutos atrasada, poderia ter sido bem pior. 

A sala estava organizada com a cadeiras formando um círculo, e não consegui identificar nenhum rosto adulto que possivelmente seria o professor de Ciência Política, como informava o cronograma. Halston agitou os braços me indicando a cadeira que guardou para mim, pelo menos não chamaria mais atenção em busca de um lugar vago. 

— Como algumas pessoas chegaram depois, vou repetir parte das explicações. — A garota que falou estava sentada na parte central do círculo, tinha as pernas cruzadas e a sobrancelha arqueada deixou transparecer um pouco de impaciência.  — Sou Alexa Damie, uma das organizadoras do coletivo feminista da Briar. O professor de Ciência Política precisou resolver um compromisso familiar, então a coordenação pediu que nós, veteranas do curso de Ciências Humanas e do Coletivo, organizássemos uma roda de conversa. 

  Passei os olhos pela sala, os rostos familiares da minha turma estavam bem interessados no que a tal Alexa falava, várias pessoas veteranas do curso também estavam sentadas ouvindo atentamente. A agitação que senti ao bater os olhos em Zendaya foi uma sensação nova, mas ela não pareceu ter notado minha presença, estava mais interessada em observar seus coturnos. 

— Ela estava falando sobre sororidade entre nós, mulheres. — Hal sussurrou, me lembrando de prestar atenção. 

— ... nós realmente precisamos parar de cair nas armadilhas do patriarcado, estamos unidas na mesma causa, que é derrubar esse sistema machista. Por isso é importante falar de sororidade, não somos rivais, somos todas iguais. — Alexa falava. Suas aparência era impecável, parecia ter acabado de sair de uma revista da Vogue. 

— Desculpa Alex, mas preciso fazer uma pequena colocação na sua fala. — Zendaya falou, chamando atenção para si. Alexa não pareceu tão contente com a interrupção, mas aguardou. — Estamos aqui conversando sobre feminismo dentro do sistema de supremacia branca, então é importante ter consciência que as políticas feministas contemporâneas, surgiram dentro desse contexto. — A sua oratória era impecável, além da tranquilidade enquanto assimilava os pensamentos. — Eu concordo com cada observação sua, e acredito na importância da sororidade, exceto quando disse que somos todas iguais. Não somos iguais, o que temos em comum é somente o gênero. Distinguimos na cor, classe, religião, orientação sexual, e muitas outras classificações. Quando entramos no discurso da igualdade, acabamos seguindo caminhos muito problemáticos, precisamos aprender a falar sobre as diferenças. 

  Foi uma sensação esquisita, mas senti algo parecido com orgulho quando Zendaya terminou de falar. A sala permaneceu em silêncio e Alexa parecia precisar de uns segundos para assimilar uma réplica, Zendaya permaneceu com a postura relaxada e a atenção voltou-se para seus coturnos novamente.

— Obrigada pela colocação, Zendaya. — Finalmente, Alexa segurou as rédeas outra vez. — Mas eu realmente não entendi porque achou tão importante falar de mulheres como grupos divididos, isso enfraquece o movimento. 

— O que enfraquece o movimento é feminista é a visão racista, neocolonial, classista e homofóbica que não faz os recortes necessários. — Mesmo com as verdades cortantes, Zendaya falava aquilo na maior tranquilidade. — Não estou dividindo, estou pautando as problemáticas que existem. Vou exemplificar, acredita mesmo que o significado de emancipação feminina é o mesmo para uma mulher milionária em contraste com uma mulher que trabalha com serviços ditos subalternos? — Ela deu um pequeno espaço para Alexa tentar responder, mas o silêncio continuou. — Então, é sobre isso. Não existe feminismo global como um pensamento unificado, são diferentes reivindicações. Uma mulher branca pode lutar para sair da visão paternalista de pureza, enquanto uma mulher negra reivindica o direito de não ser mais hipersexualizada. 

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