Capítulo 6

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   Um travesseiro mais macio que o meu e um cheiro recém familiar, me fizeram acordar sem pressa. Pelo menos, até perceber que havia dormido no apartamento de Zendaya, lembrar disso me fez levantar da cama num pulo. 

— Bom dia, Bela Adormecida. — A voz da minha anfitriã veio da janela, o que fez tomar mais um susto. Ela estava sentada numa cadeira com os pés apoiados na escrivaninha, tinha um livro nas mãos. — Desisti de tentar te acordar, parecia uma pedra. 

— Eu peguei no sono ontem, me perdoe por dormir na sua cama. — Senti as bochechas ruborizarem, Zendaya parecia se divertir com a minha agitação. — Que horas são?

— Não se preocupe com isso. — Ela levantou, deixando o livro numa pequena prateleira. — Estamos nos aproximando das nove da manhã, espero que não tenha perdido nenhuma aula. 

  Estava no meu dia de sorte, minhas aulas do dia aconteceriam no período vespertino. Sim, eu decorei meus horários. 

— Não perdi. Posso usar seu banheiro? 

— Claro. — Ela apontou para uma discreta porta que ficava entre prateleiras.  — Depois venha comer alguma coisa, estava só te esperando. Não sou uma anfitriã tão ruim. — Colocou as mãos nos bolsos da bermuda que estava vestindo, ainda com aquele sorriso habitual no rosto. 

   O banheiro tinha a arquitetura proporcional à dos outros ambientes desse condomínio, então estava tentando não ficar deslumbrada com os cômodos luxuosos. Quando olhei no espelho, tinha uma expressão relaxada no rosto, comprovando uma ótima noite de sono. Não me estendi, fiz o possível para escovar os dentes só com o creme dental e lavar o rosto, meu cabelo era simples de desembaraçar.

  Quando retornei, o quarto estava vazio. Resolvi procurar minha companhia no andar de baixo, sendo surpreendida pelo lugar todo limpo, como se não houvesse acontecido uma festa cheia de pessoas na noite anterior. Tudo perfeitamente organizado, pareciam móveis intocados. 

— Eu tô aqui, Bella. — A voz soou da cozinha, apenas segui o trajeto. — Sou péssima cozinhando qualquer coisa, preferi comprar nosso café, para não te colocar sob risco de infecção alimentar ou algo parecido. — A mesa da cozinha estava repleta de variedade, claramente a quantidade era exagerada. 

— Não sei você, mas estou faminta. — Meu apetite matinal era bem presente, o que ficou bem visível quando devorei várias fatias de um bolo com cobertura de chocolate. Zendaya parecia se divertir conforme eu me deliciava, apesar de não ter tocado em nada exceto sua xícara de café.

— Acho que está passando por um dos efeitos colaterais de fumar maconha. — Inclinei a cabeça e franzi as sobrancelhas, sem entender. — Geralmente, as pessoas sentem bastante fome. 

  A droga de rubor apareceu no meu rosto outra vez, e tentei esvaziar minha boca cheia de bolo. Zendaya ficou com a xícara sob os lábios por mais tempo que o necessário, mas eu sabia que estava rindo de mim.

— Eu poderia até usar essa desculpa, mas realmente quero me casar com o confeiteiro que preparou esse bolo. 

— Pode ser uma confeiteira também, você se casaria? 

— Hm... Provavelmente eu me tornaria amiga dela. — Falei. Zendaya deu um sorriso, não tão bonito quanto os antigos, esse era forçado. — Então, quem limpou esse lugar? 

— Eu limpei tudo, já que minha convidada apagou. 

— Você acordou bem cedo então, porque eu tenho certeza que não foi uma tarefa simples.

— Na verdade, quando todos foram embora, eu recolhi as bagunças e separei no lixo. Depois fui conferir se você estava viva, então eu limpei tudo com a companhia do Spotify. 

— Quanta disposição. — Ela deu de ombros. — Dormiu na sala?

— Tenho energia pela madrugada. E não, eu dormi no quarto de hóspedes. Nem pense em se apropriar do meu travesseiro na próxima vez. — O fato dela falar próxima vez, queria dizer que ela pretendia me deixar dormir aqui em outras ocasiões. Isso não deveria, mas me fez sentir alegria no peito. Era muito esquisito assimilar algumas reações.

— Ah, fala sério. Aquele travesseiro me fez ter uma das melhores noites de sono em tempos, não seja cruel. — Forcei uma expressão de tristeza, que arrancou um sorriso de verdade da boca de Zendaya. Meu novo passatempo estava se tornando decifrar os diferentes sorrisos dessa garota.

— Ok, só não faça essa cara de traidor de namorada arrependido, vou pensar no seu caso. 

— A vitória é doce. 

— Só não é precipitada.

— Que seja. — Fiz minha melhor cara de deboche. — Então, a sua namorada não ficou ontem pra te ajudar com a bagunça? — Não consegui evitar me intrometer, mas a curiosidade estava me corroendo.

— Namorada? Não tenho uma namorada. — As sobrancelhas arqueadas em sinal de confusão no rosto de Zendaya, não deveriam me fazer sentir alívio. Não mesmo.

— Estou falando da Alexa, é que ela vive empoleirada em você, achei que namorassem. — Eu não deveria falar assim de uma garota que nunca fez para para me prejudicar. Era uma série de "eu não deveria".

— Nós apenas passamos tempo juntas, não é nada sério. — Ela respondeu, mas eu ainda queria uma resposta mais completa. 

— E as duas estão de acordo com essa configuração de relacionamento? — Foi a vez de Zendaya revirar os olhos.

— Não leve a mal Bella, mas nem todo mundo quer se casar ou ter algo duradouro com uma pessoa. O que Alex e eu temos, não pode nem ser classificado como um namoro aberto, porque não é um relacionamento. Somos apenas corpos interagindo. — Sei bem o que esse interagir de corpos significa. 

  Resolvi não tocar mais no assunto, era informação demais para a minha mente romântica e convencional. Os assuntos que seguiram foram aleatórios, indo dos acontecimentos da noite anterior, até as nossas playlists incompatíveis. A manhã passou voando, e quando Zendaya estacionou o carro na calçada dos alojamentos, desejei ter mais um tempinho para jogar papo fora. 

   Não foi tão empolgante me preparar para a aula da tarde, e mesmo com a pontadinha de culpa, respondi as mensagens de Gregg no modo automático. Não estava nos meus planos conhecer uma pessoa tão... diferente. Não diferente pelo fato de ser homossexual, mas porque nunca tinha esbarrado em alguém tão interessante, em que nunca houvesse vontade de dizer tchau e encerrar o assunto.

   Quando estava saindo do alojamento para a aula, esbarrei numa caixa retangular com um grande laço vermelho, no chão perto da minha porta. Decidi retornar ao quarto para desembrulhar a caixa misteriosa, o conteúdo dentro me fez abrir um sorriso imenso. 

Era um travesseiro, idêntico ao de Zendaya, a diferença era que esse estava na embalagem. Um pequeno bilhete chamou minha atenção, me fazendo parar de abraçar meu novo presente favorito.

Bella, não fique com o ego muito elevado, esse presente tem apenas o objetivo de suprir minhas necessidades pessoais, como te manter longe dos meus pertences. Apesar disso, lhe desejo bons sonhos.

Forte abraço, de uma admiradora da sua expressão de traidor arrependido.



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