— Isso não está certo. — Anastácia batucava os dedos contra as costas de sua outra mão. — E vocês sabem disso.
Os olhos azuis claros estavam tempestuosos, mostrando toda sua indignação, todos sempre a disseram que seus olhos eram extremamente expressivos. Algo que puxou de sua mãe, que nem chegara a conhecer.
Anastácia de fato herdara muitas coisas de sua mãe, como o cabelo loiro do qual nem seu irmão obtinha, sua curiosidade, seu gosto pela música. Mas também herdara seu senso de bondade e não conseguia ficar calada quando sabia que uma situação estava errada.
Mount Weather sempre fora seu lar, tudo o que conhecera, consequentemente tudo o que amava. Porém seu lar também era sua prisão. Décadas antes de nascer o planeta se tornava inabitável, e enquanto alguns iam ao espaço outros se confinaram a esta montanha.
Assim como seu pai e seu irmão, sonhava com o momento de sair dali. Colocar seus pés em solo, poder toda as plantas e explorar o mundo a fora.
Ela sabia o que acontecia com aqueles que eram expostos a radiação e como eram curados, sempre enojou a maneira de como usavam humanos para seu próprio bem.
Isso tudo piorou quando ouviu o plano insano de seu irmão de usar os jovens que vieram do espaço para que finalmente realizassem seus objetivos.
— Sei que isso tudo parece uma ideia radical, mas olhe pelo meu lado. São apenas dezenas deles, para centenas de nós! — Seu irmão tentou mais uma vez justificar seus planos, o que estava fazendo já a uma hora.
— Tem razão... — Anastácia comentou, sua expressão neutra, mas estava borbulhando de raiva por dentro.
Um sorriso aliviado surgiu no rosto de seu irmão, quando pensou finalmente convencer sua irmã mais nova de ficar ao seu lado. O que era uma raridade, já que ela sempre parecia apoiar seu pai, e todos sabem que dois tem mais chance que um.
— É uma ideia além do radical! - Ela continuou, sua voz um pouco mais rude, desfazendo o sorriso de Cage. — Eles são pessoas, como nós, Cage! Estão vivendo conosco e confiando na gente.
Ela nunca pensou que estaria tendo uma conversa como essa. Quando Jasper e Monty vieram falar com ela sobre seus receios e teorias, ela quase rira deles, nunca que sua família os machucaria.
Agora, ela não poderia estar mais errada.
Seus olhos suplicantes correram até seu pai, que estivera em silencio o tempo todo. Pode ver Cage fazendo o mesmo, dois filhos esperando o apoio de seu pai.
— Eu ainda nem sei o porque de estarmos discutindo isso. — Dante finalmente se pronunciou.
O coração de Anastácia tropeçou em algumas batidas. Ela sabia o quanto seu pai era um homem bom, mas a ganancia podia destruir até o melhor dos homens, e ali na balança estava pesando a liberdade de seu povo.
— Não iremos prosseguir com isso, Cage. — A voz dele era baixa, mesmo que estivessem em um lugar reservado, não queria qualquer um ouvisse aquilo.
— Mas, pai. Você não está considerando... — Dante tentou mais uma vez, sendo rapidamente interrompido.
— Basta, eu ainda mando em tudo aqui. — O patriarca o cortou. — Eu já não te dou liberdade demais em seu laboratório, brincando de médico e monstro?
A garota sentiu todo seu estômago revirar e pode lembrar-se de seu café da manhã. Há pouco tempo descobrira o que o irmão tanto fazia, claro que por conta própria.
Ela roubara um cartão de acesso e fora escondida até o covil de seu irmão e virá com seus próprios olhos a crueldade forjada para os terrestres. Já não bastava usar seu sangue como remédio, seu irmão brincava de Deus e tirava a sanidade dos mais fortes.
Tais lembranças recentes mexeram com o seu emocional por longos dias e continuava mexendo. Assim sem falar mais nada, ela se ergueu da poltrona rapidamente e saiu da sala com a porta batendo em um baque surdo.
Passou a mão pelo rosto diversas vezes, provavelmente o deixando vermelho, uma tentativa de esquecer aquelas cenas, mas fora por agua a baixo quando a porta abrira novamente e seu irmão surgia a sua frente.
— Olha, eu sei que é muito para digerir, mas pense em todo nosso povo. — Ele começou com sua voz calma contrariando sua expressão.
A verdade era que Cage também estava cansado, ele não fazia tudo aquilo apenas por diversão. Ele protegia Mount Weather com seu experimentos, e também poderia trazer a liberdade para todos.
— Se não por eles, por nosso pai, por mim. — Suplicou agarrando o braço de sua irmã com mais força do que o necessário. — Entenda, Anastácia!
Talvez seu rosto tenha a denunciado, porém não podia controlar suas feições com tanta tristeza e pavor entalados em sua garganta. Como seu irmão - de seu sangue e criado por bons pais - poderia ter deixado a ganancia o corrompe-lo desta maneira.
— Eu nem sei mais quem você é. — Sussurrou com a voz embargada.
Quando viu que isso não o abalou, mesmo depois de segundos em silencio, ela puxou seu braço e correu. Como uma covarde que não podia enfrentar sua própria família para ajudar seus novos amigos.
Talvez fosse as lágrimas embaçando sua visão ou a velocidade a qual não estava acostumada que ocasionaram a fazer bater em algo, talvez um parede. Ela fechou os olhos, pronta para sentir seu corpo chocando-se contra o chão, serviria de lição para não correr mais desgovernadamente por ai.
Porém o tombo não ocorrera, diferente do que imaginara, grande mãos seguraram seus braços. Firmes, porém não de forma rude como seu irmão fizera segundos atrás.
— Obrigada.
Fora tudo o que dissera ao guarda que apenas acenou positivamente em resposta. Mantendo a cabeça baixa, com o boné escondendo um pouco de seu rosto, Bellamy voltou a trilhar seu caminho, curioso sobre o que deixara a garota tão aflita.
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SURVIVOR • Bellamy Blake
FanficSOBREVIVENTE | Um dia a gente aprende a conviver com uns, e a sobreviver sem outros. Anastácia Wallace nunca pensou que sairia do conforto que era seu lar, para tentar sobreviver todos os seus dias no caos que era a Terra. Porém, ao trair todos que...