01 - Luíza

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Aos cinco anos de idade eu fui florista do casamento da minha tia Isabel. Ou apenas tia Isa, como eu a chamo. Eu nem sabia direito o que era relacionamento e muito menos como era complicado estar em um. Mas isso não me impediu de fantasiar, na minha cabeça infantil e cheia de flores, que eu queria me casar.

Quando a tia Isa entrou com seu vestido branco ela parecia um anjo. Lembro-me de olhar para ela com um enorme sorriso e naquele pequeno instante eu a achei a mulher mais lindo mundo. Observei a cerimônia totalmente fascinada, na minha inocência, nunca havia visto algo tão belo. Mesmo que as palavras do padre fossem apenas um monte de palavras para mim.

Daquele dia em diante, tornei-me a louca por casamentos. Dava pulos de alegria quando mamãe dizia que tínhamos um para ir. Era o meu sonho. Desde o casamento da tia Isa, me tornei a garota que sonha com príncipes em cavalos brancos, amores eternos e casamentos cinematográficos.

Então, não me levem a mal, mas quando vi João, meu noivo, em cima de um cavalo, olhando diretamente nos meus olhos, achei que ele era o meu príncipe.

Deixa eu explicar melhor isso.

Papai sempre amou cavalos, então depois que se aposentou decidiu se dar ao luxo de virar associado de uma hípica. Eu estava de férias e decidi acompanhá-lo um dia. Estávamos próximos a cerca, vendo algumas pessoas treinando e foi quando um manga larga veio trotando na minha direção. O seu condutor usava uma blusa branca apertada, que abraçava os seus músculos e o deixava estupidamente delicioso. Os seus olhos verdes encontraram os meus e eu soube que havia encontrado o meu príncipe encantado.

João era doce, prestativo e me tinha como a sua princesa. Ele era tão incrível que, em menos de dois meses, me pediu em casamento. Claro que aceitei.

O meu conto de fadas finalmente estava se realizando.

Agora, seis meses depois, estou me olhando no espelho e encarando a minha versão noiva. Um vestido modelo sereia abraça as minhas curvas, o meu cabelo está preso em um coque chique e leva uma pequena tiara no topo. Estou linda, mas os meus olhos estão divididos entre raiva e decepção.

Você deve estar se questionando por quê? Esse é o dia do meu casamento, o mais feliz da minha vida, a realização do meu sonho e blá, blá, blá...

Seria, se eu não tivesse recebido um envelope com fotos do meu noivo com três, isso mesmo, TRÊS mulheres diferentes, todas dos últimos seis meses.

Os últimos meses passam pela minha cabeça, as reuniões até tarde, as viagens de negócios, os almoços com investidores. Tudo era a porra de uma mentira.

Olho novamente para o espelho e sorrio friamente.

— Deveria ter escolhido uma tiara com um par de chifres, cairia melhor — zombo de mim mesma.

Lágrimas ardem, mas me recuso a chorar. Eu posso ser uma idiota sonhadora que acredita em contos de fadas, mas não ao ponto de aceitar ser traída por aquele que eu pensei me amar. Afinal princesas carregam tiaras na cabeça e não pares de chifre.

— Luíza, filha, está na hora — minha mãe diz do outro lado da porta. — Posso entrar?

— Um minuto, mãe.

Rapidamente escondo as fotos no envelope e enfio em uma bolsa no puff perto de mim. Respiro fundo e aviso que ela já pode entrar.

Um frio se apossa do meu estômago quando mamãe entra e seus olhos brilham por lágrimas de emoção.

— Você está linda — balbucia, emocionada —, mas alguma coisa aconteceu, me diga.

Não adianta, não dá para esconder nada da mãe da gente. Elas têm um radar que avisa quando as coisas vão mal.

Quando vou abrir a boca para dizer que está tudo bem, ela me abraça e sussurra:

— Eu sei que esse é o seu sonho, mas você tem uma vida toda pela frente para realizá-lo.

Mamãe nunca foi muito com a cara do João, mas quando a questionei ela só me disse que o importante era que a garotinha dela estava feliz. Eu sou a mais nova de cinco irmãos, todos tentativa do papai e mamãe terem uma menina. Luciano, Leandro, Leonardo, Luiz e Luíza, eu. É, meus pais têm algo com a letra L. Sempre fui tratada como uma princesa, mas sem ser transformada em uma mimada egoísta, mimada talvez um pouco, egoísta jamais.

— Eu estou bem, não se preocupe. — Beijo o seu rosto. — Vamos, não quero me atrasar.

Mamãe me examina por vários segundos e assente.

— Você sabe que nós estamos aqui para te apoiar em qualquer coisa, não sabe?

Assinto com a cabeça, eu queria dizer algo, mas sei que se disser as lágrimas vão descer soltas.

O caminho até a Paróquia São Bento é feito de forma automática. Um plano foi se formando na minha cabeça e de repente as lágrimas pararam de teimar em querer sair e um sorriso tomou conta de mim.

Na hora de entrar papai está ao meu lado, suas mãos suam e ele está visivelmente emotivo. Sua filhinha vai se casar. Esse não é só o meu sonho.

— Pronta? — ele pergunta.

Assinto e com um sinal a música A Thousand Years da Christina Perri começa a tocar. João cantou ela para mim quando me pediu em casamento e achei que ela seria perfeita para marcar esse momento.

O coração acelerado

Cores e promessas

Como ser corajoso

Como posso amar

As primeiras frases me vêm à mente e não poderiam ser mais apropriadas agora.

Caminho lentamente, todos os olhos estão em mim e o meu está no João. O seu belo rosto esculpido tem um sorriso falso e sinto nojo dele nesse momento. Os seus lábios desenhados estão curvados para cima e imagino em quantas bocas e outras partes eles já passaram.

Puxo o ar e conto mentalmente, eu não posso perder o controle. Não agora. Não aqui.

Papai me entrega a João, o beijo que deposita na minha testa antes de ocupar o seu lugar me dá mais forças para ficar de pé.

João segura a minha mão e olha diretamente para mim.

— Você é a noiva mais linda que já vi.

Por um instante, imagino que a última hora tenha sido coisa da minha cabeça e me questiono se esse homem à minha frente seria capaz de me trair? Incrivelmente, a resposta é sim. Acho que a gente sente quando o chifre aponta.

O padre dá início à cerimônia e assim como quando eu tinha cinco anos de idade, presto atenção em cada detalhe. Até que a tão esperada pergunta é feita.

— Luíza Silva Magalhães, é de livre e espontânea vontade que aceita João Ricardo Munhoz de Bragança como seu legítimo esposo?

Olho para João e sorrio ao dizer a palavra que nunca esteve em meus planos dizer no altar, no dia do meu casamento.

— Não!


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