Sei que é falta de educação demorar muito tempo embaixo do chuveiro na casa dos outros. Mas a água quente me traz uma sensação tão boa que nem vejo o tempo passar. Vejo as pontas dos meus dedos enrugadas e chego à conclusão de que já passei dos limites.
Desligo o chuveiro e puxo a toalha para me secar. Na pia do banheiro tem uma legging preta, uma camiseta branca e um par de lingeries ainda lacrados na embalagem. Visto tudo, as roupas ficam um pouco cumpridas, mas não tem problema. Pelo menos me livrei do vestido. Penteio os cabelos com as mãos mesmo, no meu rosto ainda há resquícios do lápis de olho e do rímel, mas não me importo.
Recolho as minhas coisas, jogo dentro de um saco que estava junto as roupas e saio do quarto.
Encontro Rafael na cozinha, junto com Tonta. Um mexe no celular e o outro dorme. Em cima do balcão têm duas caixas de pizza e uma Coca-Cola.
— Desculpa, acabei demorando demais — peço, envergonhada.
Eu faço o cara correr uma maratona comigo, ele me dá abrigo, eu choro feito uma desequilibrada e ainda esvazio sua caixa d'água. Esse vai para o céu.
— Não tem problema, você precisava de um tempo. — Ele levanta, pega a sacola da minha mão e puxa uma cadeira para mim. — Deixa que eu vou por isso em um lugar, amanhã você pega.
Assinto e me sento na cadeira oferecida. O cheiro de pizza invade as minhas narinas e logo o meu estômago ronca.
Rafael leva a sacola para algum lugar e volta para o meu lado.
— Como eu não sabia do que você gostava, pedi uma de frango com catupiry e margherita e outra portuguesa com calabresa.
— Eu amo todas.
— Então vamos atacar. Costumo dizer que pizza com Coca-Cola aplaca qualquer tristeza.
— Concordo.
Pego uma fatia de frango com catupiry e Rafael uma de calabresa.
Quando coloco um pedaço na boca percebo o quanto estava faminta. Eu estava só com o café da manhã e o dia foi bem desgastante para me preocupar com alimentação, até agora.
— Então, o que fez nesse tempo fora? — pergunto para puxar assunto.
— Eu fui morar com o Maurício em Praga, terminei o ensino médio e descobri a minha paixão por fotografia, então decidi me especializar na área. Me formei na FAMU de Praga, fiz algumas especializações, pós e mestrado por lá mesmo.
Caramba, ele deve ter o quê, uns vinte e sete anos e já tem toda essa bagagem.
— Caramba, que máximo. E o que você gosta de fotografar?
Rafa serve mais uma fatia de pizza para cada e eu encho novamente os nossos copos com Coca.
— Tudo — responde animado. — Não tenho algo específico, eu só gosto que seja natural. As minhas fotos preferidas são aquelas que capturam coisas que as pessoas normalmente não veem. Um exemplo é em um casamento, aquele olhar que um dos noivos dá quando o outro não está olhando, aquele que todos estão ocupados demais para apreciar.
Sorrio fracamente e uma fisgada me atinge no peito. Será que eu recebi esse olhar do João? Claro que não, se ele me amasse a essa hora eu estaria na minha festa e não comendo pizza com um "quase desconhecido".
— Entendo — respondo com um suspiro, não queria parecer tão desanimada, mas foi mais forte que eu.
Rafael limpa as mãos no guardanapo e puxa a minha mão que brincava com o copo.
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Short StoryDesde os cinco anos de idade Luíza sonhava com o dia em que encontraria o seu príncipe encantado e viveria o seu felizes para sempre. Finalmente esse dia chegou, mas antes do tão sonhado sim, o príncipe virou sapo e o conto de fadas virou conto de t...