Memórias Para River C (COMPLETO NA AMAZON)

Prólogo

O cheiro de cerveja barata e borracha queimada chega em minhas narinas e eu lanço um largo sorriso ao garoto na minha frente. Ele está com as mãos no meu quadril, descendo um pouco mais sempre que tem a oportunidade. Ele tem olhos famintos e pelo modo como sua boca está perto da minha, acredita cegamente que vamos acabar em algum lugar essa noite. Meu sorriso aumenta. A música está alta e o burburinho ao nosso redor também, porém isso não me impede de ouvir alguém no microfone anunciar que a corrida vai começar em trinta minutos.

— Já se divertiu o bastante, Doçura? — Ouço a voz atrás de mim perguntar. Ela é grave, ainda que rouca. Familiar e cheia de sarcasmo.

O garoto na minha frente pisca algumas vezes, mas não tão rápido quanto tira as mãos da minha cintura. Ele se afasta e encara a figura atrás de mim com uma expressão de medo impagável. Suspiro. Eu conheço a pessoa que causa essa reação. Conheço muito bem. Giro sobre meus calcanhares e encaro os olhos azuis brilhantes. River Cusack pode ser muito intimidador, eu confesso. Mas eu conheço todas as suas fraquezas, todos os seus medos. Não há nada em River que me assuste. Não mais.

— Defina "bastante" — O sarcasmo em minha voz não era proposital, era mais como uma técnica de defesa que eu desenvolvi contra River com o passar dos anos. 

Ele vira a cabeça e seu cabelo cai sobre os olhos.

— Já se divertiu o suficiente para ir para casa. — ele diz, com uma das mãos envolta do meu braço. River me arrasta por menos de um metro antes que eu consiga me soltar e empurrar sua mão para longe.

— Você não manda em mim, Sr Cusack. — River odeia o seu sobrenome, então faço questão de usá-lo. Conviver com ele me ensinou que a arte de irritar está nos detalhes.

— Eu adoraria ver você gritando e enlouquecendo de desespero em algum lugar dessa pista, mas eu não estou a fim de ouvir seu choro a madrugada toda. Eu já te disse que depois que a corrida começa, esse lugar é perigoso. — Ele balançou as mãos ao nosso redor, como se apontasse para onde o perigo está. A questão sobre River é a hipocrisia. Ele está esquecendo de apontar para sí mesmo. Ele é o único perigo aqui.

Com "ouvir seu choro a madrugada toda" ele estava se referindo ao fato de que somos vizinhos e de que se algo ruim acontecesse comigo ele realmente iria me escutar a madrugada inteira. Não posso evitar e sorrio diante da imagem de River inquieto no seu quarto, sem conseguir dormir por minha causa.

— Bem, é um risco que eu vou correr. — digo e dou as costas para River, voltando para onde o garoto de minutos atrás tinha ficado.

— Eu vou estar de olho em você, Olly! — Eu pude ouvi-lo gritar mesmo por cima da música alta.

— Boa sorte com isso. — sussurrei.

O garoto que estava comigo há minutos atrás havia simplesmente desaparecido. Era como se seu corpo tivesse virado pó e se misturado à areia em nossos pés. Eu não posso culpá-lo por ter se sentido intimidado. River fazia isso com a maioria das pessoas. Não é que ele seja do tipo que sai batendo em caras mais fracos por pura diversão, mas ele é inquestionavelmente forte e definitivamente gostava de uma briga. Eu cresci ao redor de River e sempre vi o modo como as pessoas o temiam. Ele tinha uma pose de durão, mas eu sabia que não era exatamente assim. 

Olho ao redor, procurando por algum rosto conhecido e desisto. Lydia devia estar com algum garoto bem longe daqui e Matt provavelmente prefere ficar no bar improvisado até cair. Meus amigos são horríveis. Mesmo assim, começo a andar pelo local na esperança de encontrar pelo menos um lugar legal para ficar quieta. Não queria ficar no meio da multidão, porque infelizmente River estava certo. Era um lugar perigoso quando as coisas esquentavam.