III. novo início

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Taehyung acordou entre bocejos. Se espreguiçou ao que ficava sentado na cama, coçando os olhos. Ah, sim. Estava indo embora naquele dia. Longe de casa, atrás do desconhecido.

Aproximou os pés no canto da cama, tocando os dedos no soalho frio, caminhando lentamente direto para o banheiro. Ligou o chuveiro e deixou a água morna cair sobre seu rosto. Abaixou a cabeça em seguida, deixando que seu corpo também tivesse o contato. A quentura o fazia arquear as costas, o despertando do resto de sono. Terminou sua higiene e foi em busca de suas roupas para aquele dia - que fizera questão de organizar na noite passada. Estava finalmente indo em busca de seus... sonhos?

Entrar em uma faculdade já não parecia tão acolhedor, visto que teria que sair de Busan. Sorriu triste ao perceber que agora era ele que estava indo embora.

Terminou de se vestir e borrifou o perfume sobre o pescoço, fitando seu rosto em frente ao espelho.

Um homem feito e... sozinho.

Era um fato que sua mãe ficou totalmente feliz com a novidade, mas por motivos diferentes. Tanto por ter o filho em uma faculdade prestigiada depois de tanto este se esforçar, quanto por ele finalmente sair do quarto.

Não queria ter que "expulsar" o filho, em contrapartida a faculdade veio em boa hora. Taehyung sempre ficava isolado no quarto, só saindo para coisas totalmente necessárias. Não conversava muito, e sua mãe sabia que sua saúde não estava muito boa.

Ela tentou ser o mais compreensível possível, mesmo que ver o mais novo preso em um mundo apenas dele a deixasse preocupada.

Taehyung saiu do quarto indo em direção a cozinha, onde seu pai preparava o café da manhã. Sentou na cadeira e esperou que sua presença fosse notada.

- Preparado? - Seu pai perguntou ao que trazia uma xícara de leite e alguns biscoitos em uma vasilha, posicionando na mesa em frente ao ruivo.

- Com medo. - Falou sincero. Apesar de que apenas diria aquilo a seus pais. Todos que não conviviam ao seu lado deveriam apenas ver o que ele mostrava. Nada mais. - Onde está Jiwoo?

- Ela está terminando de se arrumar, pretende te acompanhar até o aeroporto. - Disse enquanto puxava a cadeira e sentava de frente para o filho. - Ficará bem?

- Eu tenho que ficar. - O ruivo deu um sorriso acolhedor. Suas bochechas estavam ruborizadas pelo frio daquela manhã, e seus lábios mantinham uma linha reta.

Alguns minutos se passaram tão depressa quanto a vontade de Taehyung desistir de sair de casa. Precisava enfrentar bem mais que algumas aulas. Necessitava conviver com pessoas novamente, algo que privou a si mesmo depois da despedida de Jeongguk.

Jeongguk... Era um nome tão vago agora. O que a distância causou a eles?

Seu coração não permitiu uma cicatrização rápida sobre aquele corte profundo. Preferiu que Taehyung aprendesse a lidar sozinho com sua dor. E assim ele fez. E faria.

- Vamos? - Jiwoo falou enquanto colocava sua mão junta a do filho, sorrindo gentilmente. Sua criança estava indo para longe de seus cuidados.

- Preciso te pedir um favor, mãe. - O ruivo suspirou audível enquanto juntava as palavras. - Tenho uma caixa debaixo da cama com todas aquelas cartas... - Seu tom de voz diminuindo a quase um sussurro. Há muito ele resolveu apenas escrever para si mesmo. - Preciso que jogue-as fora.

- Mas querido, você sempre as jogava na praia... - Disse quase em espanto.

- Preciso parar com esse hábito bobo. Eu já sei que nenhuma lua dorme em água nenhuma, mãe. E que ela também não ler o que eu escrevo ali. - Sua garganta estava seca, e ele apertou a mão de sua progenitora. - Não sou mais uma criança, e você precisa entender isso.

Jiwoo assentiu com certa mágoa. Seu filho tinha razão. Talvez estivesse cobrando dele coisas que apenas em um passado distante o ruivo se sentia confortável em fazer.

Precisava mudar, assim como ele.

- Tudo bem, querido. Mas você ainda continua sendo a minha criança. - Sorriu do bico de desgosto que o filho fez, e o abraçou forte. - Vamos.

[🎡]

Já estava tudo organizado. Taehyung sabia. Só precisava permanecer por mais alguns minutos sentado ali até que seu voo fosse sair. Aguardou pacientemente. Os minutos contados como horas. Taehyung mordia as cutículas do dedo, suspirava pesado, esfregava as mãos sobre a calça preta, bagunçava os cabelos ruivos, e quando olhava para o relógio, apenas um minuto havia se passado.

O tempo brincava com sua paciência e ansiedade.

Quando finalmente percebeu que era o horário correto, virou para Jiwoo que o olhava apreensiva.

- Está tudo bem, mãe. Eu sei me cuidar. - Disse enquanto mostrava seu sorriso tão maravilhosamente peculiar. Aquele formato de um coração que sua mãe tão bem conhecia.

- É disso que tenho medo. - Brincou enquanto puxava seu filho para o último abraço. - Sentirei saudades.

Taehyung guardou as lágrimas. Precisava passar tranquilidade para sua mãe, e não era deixando seus sentimentos aflitos tomarem de conta de si que conseguiria isso.

- Preciso ir. - Se limitou a dizer, deixando um selar sobre a testa de sua mãe.

A mais velha assentiu enquanto Taehyung se afastava de verdade, mesmo sabendo que ele já estava longe demais fazia anos, e ela sabia o motivo.

[🎡]

Taehyung esperou enquanto o céu se mostrava grande e impertinente para si através da janela do avião. Sempre havia admirado o céu, mas ali de cima, em contato com o azul vibrante tão perto, se sentiu minúsculo.

Não demorou para que finalmente tivesse chegado no aeroporto de Seoul. Sabia que havia dormitórios na faculdade, então precisava ir apenas em direção ao local. Chamou um táxi, e logo estava rondando pelas ruas tão desconhecidas para si. Desceu do automóvel assim que chegou, pagando o motorista. Observou o lugar ao seu redor.

A primeira vista era imenso. Pensou se poderia andar por ali sem ser obrigado a fazer algo. Apenas andar com calma e em descanso da mente. Aquilo era necessário demais, já que seus pensamentos estavam incertos desde muito tempo atrás.

Adentrou a faculdade, e na mesma hora foi como se a realidade fosse jogada contra si.

Pessoas. Muitas delas.

Há quanto tempo não falava com alguém além de sua mãe e pai? Mesmo quando ia para a escola só falava o necessário, afinal, não desejava mais ninguém ao seu lado se não Jeongguk, este que Taehyung nem mesmo se lembrava direito. A face sendo acobertada por camadas de poeira. O tempo consumia tudo.

Pensou em apenas evitar. Sim, evitaria. Não falaria mais do que o necessário e assim não precisaria ficar nervoso.

Suspirou firme. Estava fitando o chão de cabeça baixa. Não podia fraquejar ali. Seria forte, e assim foi.

Levantou a cabeça e fitou adiante. As pessoas continuavam andando preocupadas demais com seus afazeres. Deveria fazer o mesmo.

O primeiro passo foi difícil ser dado, mas logo um segundo foi adicionado. Estava aprendendo a caminhar sozinho novamente.

Todavia, em meios aos seus passos, o pretérito adentrou sua mente e seus olhos ameaçaram derramar todas as lágrimas que o ruivo jurou guardar para si.

A voz era fraca, mas ainda sim, audível. Era aguda e delicada. A face do garoto que clamara aquela voz era suave, angelical. Tão cortante como uma faca percorrendo seus dedos. Acelerou os passos para distante dali, e mesmo que não tivesse certeza de nada, sua mente retornou para a mesma voz.

Era impossível fugir do passado.

Cartas Para Lua | taekookOnde histórias criam vida. Descubra agora