Tinha que ser

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Ao chegar ao destino planejado, paguei o taxista e descemos. Retirei a cesta e fui abrir a porta para Aurora, que estava belíssima. Ela tinha um estilo peculiar de quem havia saído da série da Anne Whit an "E". E isso me deixava deslumbrado. Após nossa pequena intimidade no interior do táxi me senti confiante, segurei sua mão e a guiei. Fizemos um percurso a pé, debaixo de um céu nublado, com um sol que às vezes aparecia por detrás das nuvens, tímido. Pelo visto, o resto do dia seria assim.
- É aqui. Falei, ao chegar no local mais afastado da entrada do bosque.
Aurora olhou ao redor e sorriu.
- Eu simplesmente amei!. Disse com os olhos brilhando.
O local tinha um velho carvalho meio tombado, um lago pouco mais à frente e o melhor, uma pequena gruta ao lado. Lembro de vir muitas vezes aqui com os meus pais. E minha mãe me contar estórias, aqui é um lugar que sempre amei estar. Minha mãe costumava falar que essa gruta lembrava o lugar favorito de uma personagem de livro que ela amava. O nome da personagem era Sofia e o nome do livro, Mundo de Sofia, a diferença que o esconderijo secreto da Sofia era uma espécie de arbusto que cresceu e ficou em forma de caverna. Minha mae sempre amou ler, e sempre viu sentido em tudo, ela amava refletir. Claro que isso deve também a profissão que escolheu, ela era filosofa e morreu quando eu tinha 18 anos, vitima de um acidente de carro. Meu pai, era um poeta nato, formado em literatura, conheceu minha mãe na universidade que ambos trabalhavam. Eles diziam que foi amor à primeira vista. Hoje em dia meu pai tem 69 anos e se renega ser chamado de velho. Ele diz que sua mente sempre será jovem e que se não fosse as dores na coluna e nas pernas, estaria viajando o mundo. Hoje ele vive com a namorada em uma bela casa com um jardim impecável na Carolina do norte. A namorada se chama Dulce e tem 55 anos, ama tomar chá na varanda, enquanto meu pai recita alguma poesia.

- Aurora. Chamei. - Tinha planejado fazer o piquenique debaixo desse carvalho. Mas pelo que vi, logo, logo vai chover. Então sem muitas opções o que acha de deixarmos nossas coisas na gruta?
- Acho ótimo.
Entramos naquele pequeno espaço. Mas que abrigava muito bem umas quatro pessoas. Retirei da cesta a toalha, as duas mantas e as comidas. Era uma cesta grande, então abasteci bem.
Depois de arrumado, eu e a Aurora saímos para olhar o lago. Nos sentamos e conversamos.

*
Hoje definitivamente está sendo um dos dias mais felizes da minha vida. Estou com o Heitor em um lugar lindo. Quando vi o cuidado dele em preparar tantas coisas gostosas para nosso dia, meu coração se encheu de alegria. Ele estava mesmo disposto a se redimir.
Ao terminamos de arrumar o local que ficaram nossas coisas, saímos para conversar. O dia como já havia imaginado, não estava lá essas coisas. Mas sinceramente não importava, eu estava com meu amor.

*
Tivemos um excelente dia. Tomamos café da manhã, depois Aurora e eu conversamos sobre tudo. Ela era engraçada e me fazia rir, também era boba, pois ria das minhas piadas como ninguém. E olha que nem piadas sei contar.
A manhã passou tão rápido que nem percebemos. Só nós atentamos à isso por que sentimos fome. Às 12:30 entramos na gruta para almoçar. Havia levado suco na garrafa térmica, sanduíches e frutas. Após o nosso almoço,super leve, escutei as primeiras gostas d'água lá fora. Estava começando a chover.

E naquela tarde choveu como nunca mais havia chovido. Resolvemos adentrar mais a gruta, pois a ventania trazia o ar frio e molhado para a entrada. Depois de nós organizarmos, sentamos em cima da toalha e cada um pegou uma manta. O clima estava ficando frio e o tempo fechou.
Percebi que a Aurora estava ficando preocupada e com frio. Me senti meio culpado por isso. Pois foi eu quem a trouxe para cá. Vendo seu estado, tratei logo de fazer o que podia. A confortei com palavras e com calor. Me aproximei dela, de modo que nossas mantas ficaram mais juntas.
- Me desculpe por isso. Não imaginava que fosse cair esse temporal. Tenta não se preocupar, você está segura comigo. E tenho uma notícia boa...
Ela sorriu
- Ah é?, Qual?
- Comida. Ainda temos bastante comida.

A tarde findou e a chuva não passou, já estava muito preocupado. Não conseguiríamos sair dali durante a noite. O percurso da gruta para um local mais movimentado era longe e só dava pra ser feito a pé. Infelizmente teríamos que passar essa noite aqui. Resolvi deixar Aurora à par dessa situação, confesso que estava preocupado com a resposta dela.
- Aurora, me desculpe mesmo por essa situação, mas não teremos como sair hoje daqui.
- Tudo bem, já imaginava. O caminho não é nada fácil durante o dia, imagina a noite. Pelo menos aqui estamos seguros.

Fiquei feliz em saber que ela estava calma. Com o clima frio não vimos outra opção, nos deitamos e colocamos as duas mantas, uma em cima da outra por cima de nós. Tratei de emprestar meu moletom pra ela e ficamos ali, agasalhados em silêncio. Após horas de um silêncio constrangedor, ela falou.
- Heitor que coisa mais louca tudo isso. Há uns dias achava que nunca conseguiria falar com você, e hoje me vejo aqui, vestida com seu moleton, dividindo o mesmo cobertor, dentro de uma gruta em meio a uma tempestade. E gargalhou, me lembrando também, que tudo aquilo era surreal.
- Verdade. Sorri. Quem diria que eu estaria com uma mulher linda depois de tantos anos sem vir a esse local?
Sabe Aurora, estou muito feliz por ser você. Você tornou esse lugar duas vezes mais especial pra mim agora. Você foi a primeira a vir aqui, é, acho que tinha que ser você.

Quando me dei conta a Aurora tinha se sentado ao meu lado e chorava. Eu me perdi na situação, e em um pulo também me sentei,preocupado e tentando recapitular algo de errado que tivesse falado.
- O que foi? Falei algo errado? Me desculpa...
- Não. Você não falou. Eu, eu... Eu só não posso... Heitor, eu te amo. Mas não posso.

Minha cabeça girou.
- O que você não pode meu bem? Me diz. Obrigada por me amar, mesmo sendo um cara com poucos atributos. E forcei um riso para quebrar o clima que havia se instalado.
-Confesso que você despertou em mim sentimentos adormecidos, sinceros. Sei que isso parece loucura, e por isso gostaria muito de te levar pra sair mais vezes e ter você mais tempo por perto . Assim nos conheceríamos melhor.

Segurei a mão dela, e levantei seu rosto. Dei um beijo cálido, e intenso. Ela me devolveu o beijo na mesma intensidade. Nossas mãos se encontraram e ficamos assim, por muitas horas, trocando carícias, beijos, cheiros e afagos. Até o cansaço bater e adormecemos um no braço do outro.
Lembro de ter sonhado com ela a noite inteira.
É Heitor, tinha que ser ela.

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