capítulo 1.

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Levanto e caminho rapidamente pela ampla sala de carpete com dezenas de computadores e cadeiras de rodinhas. Em um braço, uma pilha de documentos a serem assinados por um velho alto com óculos redondos, ternos cinzas e gravatas vermelhas, que alguns chamam de Roberto e outros, de senhor diretor. No outro, um copo de café gelado. Aperto o elevador e entro. Me olho no espelho e penso nos anos de faculdade desperdiçados para que no fim eu me tornasse secretaria. Respiro forte. Logo serei promovida. Eu sou excelente. Eu mereço.

As portas do elevador se abrem e eu vou ao encontro da sala do homem que há meses estou tentando impressionar. Bato na porta e entro sutilmente.

Os documentos no meu braço não foram se quer vistos. Como sempre, sua reclamação foi o café. Não estava frio o bastante.

Penso no meu currículo. Tenho ótimas habilidades matemáticas, diversos cursos que envolvem gestão, administração e logística, sou graduada em ciências contábeis e fluente em inglês, espanhol e italiano. Passei a minha vida inteira estudando, preocupada com minha futura carreira e o quanto eu ganharia no auge da minha juventude. Eu planejava ser bem sucedida, rica e valorizada. Porém, o destino nunca foi piedoso comigo. Não tem problema. Eu aguento. As coisas vão melhorar. Eu terei uma vida boa. Mas antes disso, eu preciso respirar e trocar o café de um cara que nunca precisou saber a tabuada de cor pois herdara a empresa de seus pais.

Saio vagarosamente, sem demostrar nenhum sinal de descontentamento. Em frente ao elevador, o aguardo abrir com o copo de café rejeitado em minha mão. A porta se abre e um rapaz alto sai apressadamente, esbarrando em mim. Sinto meu corpo gelar e tento limpar apressadamente a mancha escura da bebida derramada em uma das minhas pouquíssimas roupas sociais. Ouço uma voz conhecida tentando me ajudar. Rafael. Ah não.

- Acho que você vai precisar trocar de blusa. - ele diz me olhando com uma das sobrancelhas arqueadas.

Encaro ele com desdém e viro de costas, tentando caminhar na direção oposta, mas sou contida pelos seus grandes braços tatuados.

- Eu te ajudo.

- Eu não preciso da tua ajuda.

- Ei, ei, ei. Tu ainda tá bolada pelo negócio de semana passada? Olha, me desculpa, eu e a loirinha não tínhamos nada sério, se eu soubesse que ela ia surtar eu nunc...

- Tudo bem. Esquece. Já passou. Vamos fingir que nada aconteceu. - digo tentando desesperadamente mudar de assunto.

-... nunca teria ficado com ela. Tu sabe que eu gosto de você. Sempre gostei.

Desde que eu entrei na empresa, ele dá em cima de mim. Não que eu ache isso ruim, na verdade sempre fiquei meio boba. O rafa é lindo. Meio mulherengo, mas mesmo assim muito lindo. Um moço alto, forte, cabeça raspada e corpo tatuado. Apesar de não receber muito mais do que eu, anda sempre com roupas de marca. Gosta de rock e cantar karaokê, ainda que ele tenha uma voz horrível. Mas eu nunca dei muita moral. Meu foco sempre foi ser promovida. Nunca quis me relacionar com ninguém devido ao meu desastroso histórico amoroso. Até semana passada...

Estávamos no bar mais próximo da empresa, após uma longa sexta feira de trabalho. Não precisei ficar bêbada pra enxergar o quanto eu queria ficar com ele. Bastou dois goles na cerveja mais barata para que eu aceitasse o seu convite para conhecer seu apartamento. Não reparei muito nós detalhes. Em pouco tempo, eu já estava sem roupa em seu colo, me perguntando o porquê de não ter aceitado sair com ele antes. Enquanto ele beijava meu pescoço e acariciava minhas coxas, ouvi a porta da sala se abrindo. Em poucos segundos, uma loira com cabelos cacheados, pernas grossas e uma blusa dos beatles nos encarava enquanto Rafael, desesperado, se cobria com a coberta. Ela saiu do quarto e ele foi atrás, tentando encontrar uma desculpa para explicar o ocorrido. Me vesti e deixei o apartamento enquanto ela chorava e ele implorava por perdão.

Eu nunca pensei que tivesse uma queda por ele. Até aquele dia. Não era como se eu sonhasse viver um romance com ele, mas depois de tantos bombons na minha mesa e corações desenhados por ele com o nosso nome na minha agenda, uma parte de mim se emocionava um pouco. De todos os caras que eu conhecia, ele havia sido o mais querido. Descobrir que ele namorava e partira o coração de outra era como um soco no estômago.

Em poucas horas, e após vários potes de sorvete, eu me recuperei e já estava pronta para voltar à rotina normal. Jurei à mim mesma nunca mais beija-lo novamente.

Ali, na minha frente, estava o cara que há 5 dias atrás partira o meu coração. Eu passei aquele final de semana inteiro stalkeando ele e a ruiva. Vanessa. Enquanto o instagram do rafa havia apenas meia dúzia de foto dele sozinho na academia, o de Vanessa era quase só de foto deles. Fazia dois meses que eles estavam juntos. Ela ainda não havia apagado nenhuma foto, me deixando em dúvida se eles se resolveram ou não.

Caminho para longe de Rafael, e não sou contida por ele novamente. Não consigo mais sentir tristeza, apenas nojo.

senhorita Onde histórias criam vida. Descubra agora