Capítulo 8: Limpando o caminho

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A próxima profissão que Carlos exerceria envolvia ter certo condicionamento físico.

E quem foi que disse que ser gari era pros fracos?

Varrer diversas ruas por dia, correr atrás do caminhão carregando sacos e mais sacos de lixo, enquanto pessoas passavam jogando mais lixo pela rua... Extremamente cansativo. Mas Carlos estava satisfeito de cumprir com seu trabalho voluntário.

Conhecer seu Gilson foi uma das grandes recompensas do trabalho.

Ele tinha 55 anos, mas uma aparência além da idade. Parecia muito cansado e abatido, mas apesar de tudo vivia sempre sorridente. Cumprimentava a todos que passavam por ele e varria a cantar um pagode conhecido.

Sua presença alegrava a todos e Carlos estava fascinado por aquilo.

Como pode alguém sofrer tanto e ter tanta alegria mesmo assim?

Por fim  decidiu se aproximar e o puxar o papo daquele dia.

_ Essa eu nunca ouvi seu Gilson. _ Diz varrendo um pouco do seu lixo para o trás.

_ Não fale uma coisa dessas, garoto, quem não conhece samba, bom sujeito não é. _ Diz com aquela gargalhada seca e intrínseca da sua voz.

Carlos ri balançando a cabeça.

_ Não consigo mais segurar a pergunta que está entalada na minha garganta.

Seu Gilson ri

_Mas, diga garoto!

_ Como o senhor consegue ser tão alegre o tempo todo?

Ele para de varrer e se encosta no cabo da vassoura.

_ Deixe eu te contar uma coisa menino, ser feliz é mais uma questão de gratidão do que sobre as condições em que a gente se encontra na vida. As coisas passam, mas a vida continua.  E vida, meu rapaz, é benção!

Carlos o observa com atenção. 

_Vou lhe contar uma pequena história que vai te fazer compreender:

 "Havia um cavalo que todos os dias levava seu dono pelos campos para trabalhar. Então, no final da tarde o senhor o conduzia a um pasto bem verdinho onde ele podia comer a vontade e descansar. Ele ficava muito satisfeito pois sabia que seu dono cuidava bem dele.

Mas, acontece que veio um tempo de muita seca e as gramas verdinhas desapareceram do lugar. O pasto já não era o mesmo. Então, o homem  que o montava o levava para tomar água num pequeno poço no chão e lhe dava palha para comer.

 A palha não era tão saborosa quanto a grama, mas o sustentava do mesmo modo. E agradecido pelo alimento ele levava seu dono a cavalgar alegre pelos campos.

_ Seja na fartura ou na falta o seu dono sempre cuidava bem dele e esse era o maior motivo para o cavalo ser feliz. _ Diz finalizando a história.

E Carlos não diz simplesmente nada.

O que poderia dizer depois de tudo o que tinha acabado de escutar?

Seu Gilson assim como ele tinha todos os motivos do mundo para ser feliz, pois, seja na fartura ou na falta eles também tinham quem cuidasse bem deles. 

Foi o que ele pensou.

E depois de dar uma boa gargalhada da expressão pensativa no rosto do menino, seu Gilson volta a varrer e a cantarolar seu samba de sempre.

"E aos trancos e barrancos, lá vou eu. E sou feliz e agradeço por tudo que Deus me deu"


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Referência musical: Zeca Pagodinho

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