Capítulo VIII

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Os outros dois braços de Rosivaldo surgiram da silhueta que estava diante de quatro defeituosos derrotados.
— Rosivaldo? Você é o cara que tentou salvar o menino bode e não conseguiu, né?— perguntou Drakin.
— Cala a boca— rebateu Rosivaldo.
O homem de quatro braços pulou e ficou logo a frente do mago de olhos brilhantes.
— Você deve ser muito covarde pra roubar uma criança e ameaçar outra...— Rosivaldo estalou todos os dedos —Espero que reconheça seus erros, garoto mágico.
Drakin sorriu de lado.
— Você quer seu menino de volta, né? Não acho que ele seja útil mais...
Uma esfera de contenção surgiu ao lado de Drakin. Nela estava Bumi, completamente inconsciente e indefeso.
— Pega. Todo seu.
Os olhos de Rosivaldo se encheram de lágrimas e o mesmo avançou em Drakin para atacá-lo, sendo enganado por seu desaparecimento. O mago de olhos brilhantes havia ido embora.
— Rosivaldo...— Luana disse, baixinho.
— Como eu faço pra abrir essa coisa?— Rosivaldo observava a esfera.
Dois de seus braços socaram a esfera, provocando uma pequena rachadura. Rosivaldo continuou socando até que a esfera ficasse toda rachada e, enfim, libertasse o menino bode. A esfera se partiu em vários pedaços. Bumi caiu em cima de alguns fragmentos, se ferindo um pouco. O homem de quatro braços se aproximou, pegando seu menino no colo e encostando suas testas.
— Ah, Bumi... Achei que tinha te perdido...
— Rosivaldo?...— Luana interrompeu —Eu queria me desculpar por ter decidido algo sem falar com você...
— Tá tudo bem...
— Sério?
— Se você não tivesse falado pra essas criaturas irem pra minha fazenda, ninguém viria salvar o Bumi, nem mesmo eu seria capaz sozinho...— Rosivaldo caminhou com Bumi no colo até Luana, colocando uma de suas mãos no ombro da garota —...Obrigado.
Luana sorriu, olhando em seguida para Needle, que estava do seu lado.
— Precisamos levar todos eles... Alguns estão muito machucados!
Rosivaldo olhou em volta e viu uma banheira grande com rodas instaladas em um cantinho da sala do botão que Needle havia apertado. Pegou a banheira, mesmo não sabendo o porquê de estar ali, e colocou, cautelosamente, Bumi deitado. Luana viu a situação e se ofereceu para ajudar, colocando um cobertor que estava em sua mochila no fundo da banheira. Rosivaldo andou até Robson e o pegou cuidadosamente, colocando o homem deitado no "veículo". Andou até James e Needle, fazendo o mesmo.
— Ué... Eu tinha certeza de que tinha mais uma...
— Ela está presa embaixo daquela pedra!— lembrou Luana.
Rosivaldo segurou a pedra e usou toda a sua força para removê-la. Quando conseguiu, viu que a rocha estava com a marca do corpo de Helvetica, como se tivesse derretido. Se aproximou da garota com perna de bode e quase queimou parte de sua mão. O corpo de Helvetica estava tão quente que sua pele estava completamente vermelha e florescente.
— Luana, temos um problema...
— O que foi?
— Ela está muito quente... Não consigo segurá-la.
Luana pensou em como poderia resolver aquela situação e lembrou-se dos tubos cheios de água do salão. Se dirigiu para lá com um balde que havia achado na mesma salinha e pediu para que Rosivaldo quebrasse uma parte de um tubo que estava preso ao chão. Assim o fez. A garota encheu o balde e levou de volta para onde Helvetica estava, jogando a água por todo o corpo da menina. A temperatura diminuiu. Logo foi colocada junto com os outros.
— É melhor levar todos de volta à fazenda, mas como a gente vai sair desse desfiladeiro?...— perguntou Luana.
— Não tem como subir de novo. Vamos ter que seguir o caminho do riacho até a passagem das pedras. Dali a gente segue o caminho da floresta até a fazenda...
— Mas isso vai demorar muito! Eles precisam de um cuidado o mais rápido possível!
— É melhor tomar essa providência do que tentar arrumar um jeito de levar essa banheira pro alto do desfiladeiro...
— Você não pode carregá-los?
— Mesmo assim não teria um jeito de levar todos pra cima.
— Certo...
Rosivaldo empurrou a banheira de rodinhas para fora da caverna, tomando os cuidados para não balançar tanto. Luana seguiu o mesmo, cabisbaixa e ao mesmo tempo feliz por ter encontrado seu amigo. O caminho acompanhava o riacho daquela paisagem até a subida de volta a floresta. Dois olhos totalmente negros surgiam de um canto na água. Alguém vigiava o percurso dificultado pela derrota de quatro defeituosos. Logo esses mesmos olhos submergiram naquele riacho, sumindo vagarosamente.
Enquanto seguiam pelo caminho do riacho, Luana observava as árvores no topo do desfiladeiro, imaginando como estaria a situação em sua ilha. Seu pai enlouquecido pela falta da filha, sua mãe preocupada com o sumiço da mesma, a ilha em estado de emergência por causa de sua fuga rebelde... Isso não a incomodava tanto, apenas se preocupava com os pais. O caminho do riacho tinha 10 quilômetros até a subida das pedras. O fato de Rosivaldo ser um mutante de quatro braços não tinha nenhuma significância por ter que levar uma banheira junto, portanto seria como uma viagem normal que qualquer criatura ousaria cumprir. Em um determinado percurso do caminho, algumas pedras começaram a despencar em direção ao homem e à menina.
— Eles estão aqui.
— Quê?— perguntou Luana, assustada.
— Os magos estão aqui! Rápido, corra para aquele beco na parede!
Ambos correram, trazendo a banheira com os defeituosos. Uma pedra estava no rumo de uma das rodinhas da banheira, balançando os que estavam desmaiados. Logo, ouviu-se três magos sobrevoando e conversando.
— ...Sinceramente, eu não gosto muito dela, ela se acha no direito de nos chamar só pra procurar aquela banheira estúpida...
Ambos se entreolharam assustados, se perguntando o porquê daqueles magos terem uma conversa tão óbvia. Quem seria o dono da banheira que roubaram?
Esperaram alguns segundos assim que os magos saíram para se retirarem da caverna, seguindo pelo caminho e atentos para qualquer volta de criaturas indesejáveis. Logo, um tremor atingiu o homem e a menina, assustando ambos e sugerindo um possível ataque.
— ACHEM AQUELE HOMEM DE QUATRO BRAÇOS E A MENINA DE ORELHAS PONTUDAS!!— alguém com uma voz feminina e pouco endemoniada gritava, podendo ser escutada pelas gotículas da água.
— Lascou...— Rosivaldo disse baixinho, se preparando para correr carregando uma banheira.
Logo um vento forte atingiu o lugar em que estavam. Parte das moléculas de água que estavam no riacho se levantaram, tentando atingir os "ladrões". Luana começou a correr junto de Rosivaldo, carregando a banheira com os defeituosos.
— ROSIVALDO! O QUE TÁ ACONTECENDO?!
— NÃO SEI, NÃO IMPORTA! SÓ CORRE, MENINA!
Os mesmos magos que haviam cruzado o caminho anteriormente apareciam de novo, dessa vez com sangue nos olhos. A imagem dos magos em perseguição só deixava o homem de quatro braços e a garota da ilha mais desesperados e nervosos. Enquanto corria carregando a banheira, Rosivaldo catou rapidamente uma rocha pesada do chão e se preparou para arremessar com um dos braços que estavam livres. Sortemente, a pedra atingiu um dos magos que estavam sobrevoando o desfiladeiro. Então os outros dois magos aproveitaram da ofensiva do mutante e invocaram um feitiço que conjurou todas as pedras perto dali para serem arremessadas contra os fugitivos e a banheira.
— ROSIVALDO, SEU BUNDA MOLE!!— gritou Luana, furiosa.
— DESCULPA, EU TAVA TENTANDO AJUDAR!...
— BOM, ENTÃO OBRIGADA. AGORA TEM ÁGUA E PEDRA PRA MATAR A GENTE!!
— FAZ MELHOR, CRIANÇA ARRETADA!
Luana olhou ao redor enquanto corriam, atenta a qualquer coisa que ajudasse a se livrar dos magos. Avistou um pequeno túnel, não muito longo. Olhou para Rosivaldo e fez sinal para que ele a seguisse. Assim o fez. Fugindo de pedras e de golpes de água, assim que Luana pegou uma pedra média no chão antes da entrada, os dois fugitivos adentraram o túnel escuro e a garota da ilha retirou de seu bolso um pequeno estilingue.
— Tu guardou isso aonde, guria?— perguntou Rosivaldo, surpreso.
— AGORA NÃO, QUATRO BRAÇO.
Luana atirou a pedra às pressas, acertando uma das rochas pesadas que ficavam no teto do túnel. Esse simples ato causou a queda dessa rocha, que desencadeou a queda de todas elas por cima dos magos. Saíram pela outra entrada, escapando da fumaça que o desastre estava causando.
— Isso aê!— Rosivaldo estendeu um de seus braços para um 'toca aqui.
— Haha! Consertei a besteira que você fez!— Luana retribuiu, não deixando o homem no vácuo.
Enquanto cantavam vitória, a pulsação da terra aumentou e as partículas de água se deslocaram. Quando olharam para o riacho, com medo do que poderia ser, algo saltou, levando consigo uma rajada de água em direção a ambos. Havia uma criatura de olhos totalmente negros dentro da água. Era uma sereia demoníaca e extremamente magra, de cabelos compridos.
— Vocês...
— Ah, bom dia moça, se me der licença eu vou correr mais um pouquinho...— disse Rosivaldo, com a voz aguda e falha.
— VOCÊÊÊÊS!!...— a sereia fez um gesto, levantando uma onda de água e prendendo Rosivaldo —Seus ladrões... Vão pagar por terem roubado a minha banheira...
— DESCULPA! Nós precisávamos pra levar os nossos amigos...
— NÃO INTERESSA!— a sereia apertou o punho, sufocando Rosivaldo pela onda, deixando sua respiração inativa.
Luana pegou outra pedrinha no chão e atirou na criatura com seu estilingue pequeno. A sereia abriu seu punho, libertando Rosivaldo. O mutante deu uma tossida e logo correu para pegar a banheira, correndo novamente. A sereia olhou diretamente para Luana, com uma expressão ameaçadora, e invocou grandes ondas de água para perseguir os dois, de novo.
— OK, AGORA EU REALMENTE NÃO SEI O QUE FAZER!— gritou Luana.
— CONTINUE CORRENDO, ESTAMOS QUASE CHEGANDO NAQUELA OUTRA CAVERNA!...
A sereia invocou uma onda que atingiu ambos e os levou para onde Rosivaldo havia mencionado. Acalmando o nível da água, a sereia adentrou a mesma caverna diante de dois fugitivos e uma banheira cheia de defeituosos desacordados.
— Vejam se aprendem a não roubar nada de uma criatura de Noxus!...
A sereia levantou seu braço, invocando uma onda enorme, prestes a atingir ambos. Rosivaldo olhou para Luana, como se fosse o fim. Luana fez o mesmo, fechando os olhos e se preparando para receber o ataque. Antes que a sereia pudesse findar a vida de todos ali, deu uma risada maligna e logo foi surpreendida. A onda que havia invocado simplesmente abaixou e ficou imóvel. Ambos olharam para a banheira, que parecia estar emitindo calor.
— QUÊ? COMO...
Helvetica havia despertado.
— Eu não gostar de peixe mau— Helvetica fechou a mão, evaporando toda a água que movia a sereia, fazendo com que ela caísse no chão da caverna.
— Menina insolente...
— Peixe burra! Você insolente, e Helvetica inteligente.
A sereia estava se desidratando lentamente, o que foi enfraquecendo a mesma. Logo ela saiu se arrastando em direção à saída da caverna. Helvetica abaixou seu braço, ficando fraca e desmaiando novamente. Rosivaldo olhou para Luana, confuso e surpreso.
— Você também achou isso estranho?
— Ahan...— respondeu Luana, assustada.
Uma luz acesa no meio de uma sala totalmente escura.
— Senhor Kin...
— Fala, Darius...
— A Elisa solicita uma conversa com você.
— Elisa? Sério?— Drakin deu uma bufada —Manda ela entrar.
A voz da sereia aumentava a cada momento enquanto reclamava numa cadeira de rodas, totalmente desidratada.
— ...E DEPOIS DISSO EU VOU MANDAR VOCÊ PRA PU...
— Elisa.
A sereia se calou, olhando diretamente para Drakin com um ar sério.
— ...Eu espero que você tenha uma ÓTIMA explicação pra ter deixado dois ladrões vivos no covil do desfiladeiro! Eles levaram minha banheira!
— Agora a princesa vai ficar sem o banho das cinco?
A sereia emburrou.
— Você vai voltar pro desfiladeiro e matar todo mundo naquela porcaria.
— Não vou matar ninguém...— os olhos de Drakin ficaram mais vibrantes —...ainda.
— Para de enrolar! Mata de uma vez! Por que você tá deixando eles viverem e fazerem esse tanto de coisa??
— Eles ainda são úteis pra mim, diferente de você.
A sereia emburrou de novo.
— ...Já peguei o que eu precisava com o Bumi, mas depois que vi as habilidades daqueles defeituosos, parece que temos uma vantagem aí...
— Não tem nada de bom vindo deles. Tudo lixo.
— É, mas ainda podemos usar esse "lixo"...— um sorriso malicioso aparecia lentamente no rosto de Drakin.
— Reciclagem é bom.
— NÃO, SUA BURRA!— Drakin se levantou, ainda de costas para a sereia —Darius...
— Sim, Senhor Kin...
— Leva ela daqui e mete essa louca na caixa d'água pra ela calar a boca.
— Ok.
— Drakin...— Elisa se esforçava para falar —...Eu vou vingar minha banheira...
— Tá. Tchau.
Elisa começou a gritar asneiras, reclamando de tudo novamente enquanto Darius levava a cadeira de rodas. Drakin ficou em silêncio por um tempo até outro sorriso ser esboçado em seu rosto.
— Alguém vai deixar de montar blocos de feno...

Ramwari - Uma História de Heróis e VilõesOnde histórias criam vida. Descubra agora