Cap. 3

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Ano de 520, capital do reino de Canaã, Nortúmbria.

Relato de Pietro Haro

Eu, o jovem príncipe Pietro e minha irmã Sofia, sempre nos perguntávamos o por que de meu pai mentir e esnobar por toda a sua vida.. se era em colheitas, por mais mal que fosse, ele mentia para o povo, se a economia iria mal, ele mentia para o povo; e além disto por que tratar empregados e plebeus como inferiores de um jeito tosco e rude como aquele? Nenhuma destas pessoas é animal. E nem animais merecem ser tratados assim. Um rei deveria proteger e amar todos do seu reino, defende-los custe oque custar.. mas eu acho que essa história não é mais um dos contos de fadas que eu lia para Sofia quando mais jovem. A sociedade tende a ser bem mais cruel quando você entende que o poder te dá oportunidades e posições inimagináveis.. como decidir quem vive ou morre, quem é sacrificado ou quem conta de herói. No final das contas eu não quero ser um herói, ou bancar de um. Quero apenas ser um rei melhor do que meu pai, do que toda esta palhaçada que a realeza prega. Quero que as pessoas sejam donas de si mesmas e não um estado sendo dono delas. Quando eu assumir o trono, e finalmente o poder for meu, farei do poder o instrumento para varrer o escárnio real.

°°°
Era manhã e o sol raiava plenamente sob a grama verde bandeira, o inverno passara e o mundo parecia um pouco mais justo. Pelos campos, as colheitas desabrochavam como flores em plena primavera, era sim um tempo de prosperidade.. embora a plebe soubesse que muito mais da metade do seu trabalho duro iria para a mesa farta da burguesia e principalmente da realeza. Eloá do campo avistava Gael saindo de casa, a miragem distante à fazia sorrir, e mesmo com o sorriso estonteante, branco gelo, seu coração também se apertava.. por que ela sabia que ao sair de casa, todo dia.. magos corriam riscos.
Gael carregara um pedaço de pão e uma bacia pequena com leite de vaca, esta mísera refeição que no entanto parecia um banquete para aqueles que não tinham nada para saborear, seriam levadas até Ruan.
Gael embora tivesse sua rivalidade com Ruan na caverna dos magos, era seu melhor amigo e não importa oque houvesse.. ver o amigo passar fome não era uma das suas opções.
Gael então seguiu o caminho de pedra observando a paisagem daquele dia quente, e embora vestido da melhor maneira que achasse, suas roupas ainda pareciam mal trapilhos para aqueles habitantes cujo a condição era melhor. A andada seguiria até o comércio da cidade, onde Gael sabia que Ruan estaria, pedindo pão, água ou seja lá oque for para matar sua fome e sede.
Ruan nunca roubou nada de ninguém, e pelo contrário do que sua cara de durão parecia, Ruan era doce e generoso com todos e principalmente com outros mendigos. Magos sentiam outros magos, e Ruan sentia que embora fosse apenas um pedinte, ele podia se defender caso o destino por infortúnio te tirasse algo.. embora ele já não tivesse mais nada para ser tirado. Já os outros, humanos comuns, vivendo à margem da sociedade como ratos em esgostos, procurando migalhas para sustentar por via das vezes, famílias inteiras..
Era cruel. Este mundo era cruel, o racionamento e nenhuma liberdade de mercado apenas proporcionava a falsa organização, gerando um caos por déficit, imensurável; e não havia nada que nenhum destes dois jovens pudessem fazer para mudar a realidade.. ao menos, por agora.

Com o tempo, a caminhada de Gael parecia menos árdua e cansativa. Gael embora tudo, carregava o sorriso no rosto, por saber que veria seu amigo e que faria algo bom no seu dia. Ele ajudaria alguém, ele mudaria o dia de alguém; e para Gael, um feito como este.. alegrara sua alma de forma tão abundante e sincera que nenhum esforço parecia demasiado.

Chegado no comércio o fluxo de pessoas é intenso demais, conerciantes, pedintes, e até alguns raros burgueses, todos se esgueirando sob as brechas que sobravam para a passagem. Haviam também animais correndo como galinhas e bezerros.. fugindo do abate e da compra da sua carne.
Mas escorado em uma lacuna e sentado no chão, estava Ruan. Os olhos azul céu de Gael, avistaram o amigo logo, e o sorriso se abriu. Aquela visão não parecia tão miserável pra ele.
Lá estava Ruan, vestido trapos feitos de saco, e ainda assim continuava a ser uma bela paisagem. Seu cabelo baixo em contraste com seus olhos verde claro e sua boca carnuda revelavam a beleza e a face de um guerreiro.

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