Seu Policarpo, um senhor no auge de seus 83 anos , guarda em sua cama, a sua porquinha de barro. Seu grande tesouro que havia herdado de seu pai que havia herdado do pai dele e do pai do pai dele. Era praticamente uma extensão do seu corpo e ele tinha muito cuidado com ela. Algum dia, a muito custo, ele teria de passar sua pequena fortuna para suas filhas, Adélia, Cássia e Maria.
Certo dia, a mais velha de suas três filhas, a Adélia, resolveu que queria casar com o filho do dono do mercadinho. Mas seu pai ainda não sabia disso, ela apenas havia contado para a empregada da casa, Josefa.
ADÉLIA: Ai, Josefa! Já rezei pra tudo que é santo. Agora estou me apegando ao Santo Expedito!
JOSEFA: O santo das causas impossíveis? Tá tão desesperada assim, menina? Olha que isso não é coisa que uma menina de família de respeito se faça! O que é que a cidade vai pensar se vê a filha do Seu Policarpo rezando pro Santo Expedito? Vão dizer que tá desesperada por alguma coisa, que a família ou alguém quer te fazer mal. O certo seria rezar pro Santo Antônio. Esse sim é o santo pra arranjar marido! Não vê eu e o Etelvino? A gente já tá noivo!
ADÉLIA: Noivou, mas não casou. E o meu caso é mais urgente.
JOSEFA: Urgente, causo de quê?
ADÉLIA: Urgente, porquê se não caso logo com o Inocêncio, meu pai há de me casar com o primeiro filho de fazendeiro rico que aparecer. E se for pra casar, que seja com alguém que eu amo!
JOSEFA: É, mas se for mesmo pra ser com o Inocêncio, a gente precisa ter um plano. Porque aquele ali é devagar quase parando. Se pelo menos a menina Cássia estivesse conosco. Ela tem tino pra essas coisas. Muito inteligente, a sua irmã.
ADÉLIA: Cássia foi morar com a madrinha dela por causa dos estudos. Quer ser bibliotecária. Bibliotecária nem sei de onde, porquê a gente vive num país que ninguém lê.
JOSEFA: Nasceu pra dar murro em ponta de faca, coitadinha. Uma santa, a sua irmã.
ADÉLIA: Já a demônia, vive no outro quarto.
JOSEFA: Não fale assim de sua irmã, menina Adélia. Ela só é diferente.
ADÉLIA: Diferente... Diferente. Diferente é ilusão. Se eu fosse você, cuidava muito bem do seu noivo. Antes que aquela peste cuide dele.
Seu Policarpo grita da sala de refeições.
POLICARPO: MEU CUMÊ! CADÊ MEU CUMÊ, JOSEFA!
JOSEFA: Já vou servir! Ora... Seu pai não vive sem mim. Quero só ver como vai ficar quando eu me casar e me for daqui.
ADÉLIA: Tem certeza que vocês vão mesmo embora?
JOSEFA: E tem outro jeito? Já faz 10 anos que seu pai não me paga nenhum tostão. Nem a mim e nem ao Etelvino. Seu pai é um bom homem, mas a gente num é relógio pra trabalhar de graça não, menina Adélia.
POLICARPO: Ô, MULHER SURDA! TÁ ME OUVINDO CHAMAR, NÃO?
Josefa suspira e vai servir ao patrão.
JOSEFA: Mais alguma coisa, Seu Policarpo?
POLICARPO: Sim. Que da próxima vez que eu lhe chamar, você venha de imediato. É pra isso que eu te pago, mulher mal agradecida!
JOSEFA: Mas o senhor não me paga.
POLICARPO: Lhe pago sim. Por acaso, não tens um teto pra morar? Uma cama pra dormir? Comida pra comer? Te trato quase como se fosse minha filha?
JOSEFA: ...
POLICARPO: Pois bem. Quero que arrume meu quarto e lustre bem lustrada a minha porquinha.
JOSEFA: Aquela porca velha?
POLICARPO: Velha é a senhora sua mãe. A minha porquinha é donzela. Uma linda donzela que dorme comigo todas as noites!
JOSEFA: Tem doido pra tudo.
POLICARPO: O que disse?
JOSEFA: Que vou limpar tudo nela! Até o rabinho!
POLICARPO: O rabinho? Olha... Pensando bem, fique longe do meu quarto. E longe do meu tesouro. Deixe que eu mesmo cuido dela. Vá vá vá lá cuidar das meninas. Das duas que ainda não me abandonaram. As duas que me restam. Eu, um pobre coitado!
Josefa sai, mas não sem antes trocar um sorrisinho amistoso com seu noivo Etelvino que adentra o recinto.
ETELVINO: Bom dia, Seu Policarpo!
POLICARPO: E o que é que tem de bom? Toda vez que você me vem com esse sorrisinho meia boca é porquê quer me arrancar dinheiro. Mas já vou avisando que não tenho nenhuma mísera moeda.
ETELVINO: Que ideia! Longe de mim pedir uma coisa dessas ao senhor!
POLICARPO: E então?
ETELVINO: É o Seu Zeca Boca Torta, o dono do mercadinho. Ele disse que não vende mais nada se o senhor não pagar o que deve.
POLICARPO: Ai de mim! Ai de mim! Tão pobre e os ricos ainda querem me esfolar vivo!
ETELVINO: Meu pai sempre me dizia que "ninguém é tão rico que não haja nada a receber ou tão pobre que não tenha nada a ofertar".
POLICARPO: Seu pai era louco! Sou um pobre miserável. Não tenho como pagar o dono do mercadinho. Ele sim é que é rico. Deve ter muito a oferecer. Não eu, um pobre velho e coitado. Vocês querem é me matar... Ai de mim!
ETELVINO: Então, que digo a ele?
POLICARPO: Diga o óbvio. Que não tenho como pagar e que pendure mais um pouco porquê preciso comer. Agora vá. Vá vá fazer o que estou dizendo. E não se demore que quero você na plantação de feijão. Tá em época de colheita e feijão verde vale ouro!
ETELVINO: Sim, senhor!
Etelvino se retira do recinto e vai para a cozinha pegar um balde bem grande para ter onde pôr o feijão durante a colheita. À espreita estava Maria, só de camisola e sorrateira a se aproximar. Coloca suas mãos a cobrir os olhos dele.
MARIA: Advinha quem é?
VOCÊ ESTÁ LENDO
50 Histórias para ler antes de dormir
Short StoryNormalmente as histórias de caráter sexual começam com "Ele era bilionário, lindo e sexy, já ela era apenas uma estagiária recém-formada que mal sabia se vestir", ou então "Ele estava distraído quando reparou pela janela do seu quarto a sua vizinha...