Teste 12

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Um longo suspiro foi dado, o ar fresco do campo a ajudando a se acalmar. Quanta coisa pode acontecer em tão pouco tempo? Quase não sabia como havia acabado ali.

Quase.

Embora, talvez o suposto furo na memória não fosse mais do que uma forma de negação, o que a presença da outra moça não permitia acontecer. Afinal, a explicação fazia perfeito sentido. O que mais explicaria tudo de estranho que parecia envolver ela, se não o domínio de vetores? E o que mais explicaria o seu envelhecimento bizarramente rápido, se não que se tratava de uma silpelit?

Era uma sortuda, e uma grande sortuda, por ter conseguido sua amizade. Afinal, sentia os olhares de nojo dos outros sobre si.

-- E esse é o lar que conseguiram?
Foi uma frase murmurada, inaudível para qualquer um mais longe do que a que a havia trazido.

-- Exatamente. -- a de chifres disse rápido, e com certo tom de orgulho -- Não poderíamos prosperar sem nos organizar, e um dos passos para conseguir seria nos centralizar. Os donos antigos não precisam mais, estão mortos, e aprendemos por conta própria a cuidar desses campos. Aqui temos tudo o que precisamos, e se o aumento do número de habitantes exige que o nosso território se expanda, bom, o ponto de nos unirmos é exatamente tomarmos o lugar. É claro, passar para outros continentes ou ilhas é mais punk, mas vamos dando um jeito. É apenas a natureza, Asra.

No fim ela deu de ombros. Parecia desinteressada, e talvez essa fosse exatamente a parte mais assustadora.

-- É isso então? -- disse baixo de novo, esperando que o pouco volume encobrisse sua vontade de gritar -- Extermínio para expansão? Natureza? A natureza não permite que ambos coexistam? É mesmo necessário um estado de guerra permanente? Por que isso, você sabe?

Antes da resposta verbal recebeu uma bufada, pesada e sem paciência, como se a de chifres estivesse diante da rainha dos tolos.

-- Quem não aprende com o passado não entende o presente, ein? E você é prova disso.

-- O quê? Eu não quero filosofias, Glinda, eu quero respostas.

-- Sua resposta está no passado.
O tom foi muito mais firme, e sua postura mudou. Parecia muito, muito mais séria do que quando explicava a hierarquia. Para qualquer outro que visse, oferecer cada resposta de mão beijada era como jogar moedas em um poço, mas para ela, o poço poderia sim aproveitar o valor delas, se tivesse a inteligência para tal.
-- Você sabe que o homo sapiens chegou a coexistir com o homo neanderthalensis, mas no fim o homo sapiens prevaleceu. Você sabe o porquê, Asra?

-- Por conta da capacidade cognitiva superior. -- o tom foi mais alto, um tapa mental dado pelo medo -- O cérebro do ser humano foi favorecido pela evolução em relação ao dos neandertais, e por conta disso a nossa capacidade de sobreviver em situações críticas prevaleceu, e o resultado final...

-- Histórias pra boi dormir, ou melhor, para parecer que foi apenas um presente. É verdade que o cérebro superior foi um favorecimento enorme, mas uma espécie não é extinta naturalmente porque "outra superou", se fosse assim não existiriam abelhas europeias. Um marco grande da prevalência do homo sapiens foi o genocídio. Batalhas por território que, pela diferença minúscula nos genes, foram vencidas em maioria pelos homo sapiens. O que acontecia depois era que os homo neanderthalensis que viviam naqueles territórios eram exterminados ou forçados a emigrar, mas para onde emigrar quando já não existe território livre?

Para lugar nenhum. Eles foram todos mortos.
Aquilo fazia tanto sentido que não achava espaço para tentar negar. A frase não foi dita, mas ecoava em sua mente quase em frenesi. É possível uma voz entrar em frenesi?

-- O mesmo aconteceu com os próprios homo sapiens entre si. As disputas entre nativos? A colonização dos Estados Unidos? Genocídio, emigração forçada, ou ambos. Todos os grupos são gananciosos, mas cometem o erro de ficarem se desgastando lutando entre si em vez de aproveitarem a herança que cada subdivisão tem para oferecer. Veja conosco, veja a nossa Rainha. Ela é o oposto do Charles Segundo da Espanha. Os melhores de cada subdivisão de cada grupo tendo filhos entre si, até chegar um ponto em que tudo de bom que poderia ocorrer com seleção reprodutiva se juntou em uma única fêmea. A diferença é que a natureza cuidou de a formar, não uma arrogância que impedia de ver como a união favorecia. E agora, do mesmo jeito que o homo neanderthalensis foi eliminado para a prevalência do homo sapiens, o homo sapiens seráeliminado para a prevalência da nova espécie dominante.

Havia um certo tom de deleite na voz dela enquanto falava, o que só pareceu aumentar quando viu a expressão de horror com impotência no rosto da humana, um tipo de deleite sádico, que tratou de se livrar antes de prosseguir. Não estava lá para a fazer mal, o vínculo de confiança que tinham era a única coisa que garantiria a sua não total miséria.

-- O que não é a única via. Há silpelits lá fora, muitas, muitas delas. Elas passam o vírus para os homens para que tenham filhas silpelits, e às mulheres nas nossas investidas são tomadas vivas. O quão bem ou maltratadas serão vai depender do comportamento.

-- O que fazem com elas?
Foi mais alto, mas era trêmulo, e agarrava suas roupas era disfarçar. O que havia com tudo aquilo? O que planejavam, se faziam genocídio mas as mulheres eram sequestradas?
-- O que farão comigo?

-- Será bem tratada, se fizer o que eu disser. -- o tom mudou novamente, sua voz era meiga, como tentando passar conforto; confortar de uma perturbação que ela própria havia causado, mas não via assim porque se tratava apenas da verdade -- Você sabe, uma espécie prosperar não depende apenas da morte de outra, é necessário deixar descendentes. A força de cada um é valiosa, já foi observado que queens ficam mais fracas quando estão grávidas, e para o nascimento de um diclonius basta que um dos pais carregue os genes.

A risada que saiu da garganta de Asra era rouca e trêmula, a risada de uma louca, o que oh, como adoraria ser nesse momento, para poder acreditar que nada daquilo era real!

-- São feitas de éguas reprodutoras, é isso? É por estupro, não é? É o que me espera? Estupro coletivo?

-- Não se me escutar lá dentro. -- outra respiração pesada, uma exigência de paciência, pois mesmo a reação sendo esperada ter que escutar essas conclusões equivocadas era um pé no saco -- Estupro só acontece para as que realmente nos dão nos nervos, as que não aceitam derrota e continuam a nos infernizar mesmo depois de subjugadas a nível de impotência. Nesses casos, sim, as que o fizeram já não tem braços, pernas, olhos ou dentes. Não me olhe assim! Não vai tudo de uma vez, demora para chegar a parte de punição física, até porque não queremos que morram. São casos extremos, até agora só cinco. O segundo pior são as que nos perturbam mas não ao ponto de punição física, nessa caso elas são dopadas e permanecem inconscientes o processo inteiro. Ainda é estupro, mas com certeza é melhor estar dormindo e acordar sem dores, não?

Asra não achou espaço para a questionar, ou fazer contato visual.

-- Ei, eu estou dizendo, eu vou te ajudar. Tem um monte de meio termos, os piores são os mais difíceis de acontecerem. Vou te ajudar, garota. Siga as minhas dicas, e você será admitida dentro da nossa comunidade. Uma hora, uma das chefes irá te introduzir a um King que acreditar que "clica" com você e permitirá que tome seu tempo para o aceitar como parceiro. Só lembre, tenha filhos. De preferência quão logo conseguir consentir relação carnal com ele. Se demorar demais, o seu nível cai.

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