Pelos Teus Olhos [COMPLETA]

Vadia Narcisista

      Lilia andava em passos rápidos. Já era fim de tarde de sexta-feira e tinha acabado de sair de seu trabalho. Apesar do esforço que sua profissão demandava, tentava manter seus fios curtos no lugar. Trabalhava na escola Sênior Wirs, na parte norte da cidade. Todos os dias fazia o mesmo trajeto. Levantava-se cedo, às cinco em ponto, e passava quase uma hora se maquiando, para simular certa beleza natural, de quem nunca se maquia. Sua roupa sempre era escolhida no dia anterior, e bem passada, embora sempre a amassasse enquanto ensinava seus alunos o que quer que fosse. Ao chegar na escola, fazia questão de passar pela diretoria, pelos olhos de Vladmir, o diretor do colégio. Ele nunca lhe disse nada, mas seus olhares indiscretos diziam tudo. Era questão de tempo até Lilia traçá-lo, como fez com o professor Henrique, de educação física. Embora tivesse sido apenas um caso, Henrique ainda tinha algum sentimento pela mulher, em segredo.

       O batom começava a descascar na boca e Lilia tirava o resto com os próprios dentes. Pensou em parar para retocá-lo, mas, em seguida, desistiu. Tirou um lencinho da bolsa e esfregou até sair todo o resto do batom. Olhou em seu relógio de pulso. Era por volta das quatro da tarde. Se tudo ocorresse bem, estaria em casa às oito.

       Chegou em um apartamento de poucos andares. As varandas com confortáveis cadeiras e janelas com cortinas cintilantes e finas que sempre lhe chamavam a atenção. Pela porta de trás, Lilia entrou e subiu pelo elevador até o quarto andar. Enquanto o aparelho subia, ela checava sua imagem no espelho. Tirou uma pastilha refrescante da bolsa e pôs na boca.

       O número era 418. Lilia já conhecia muito bem o apartamento. Os vizinhos alí também já a conheciam. Assim que chegou em frente à porta, tocou a campainha e logo foi atendida.

"Vem cá, minha gostosa.", Fred lhe agarrou e a puxou para dentro. Em seguida, beijou-a com vontade, pressionando-a contra a parede. Rapidamente tirou sua blusa e jogou a mulher na cama. Ela retribuía os toques do homem, beijando-o. Enquanto ele a tocava, satisfazendo-o a si mesmo, Lilia olhava para o quadro logo atrás dele e de frente para ela. Era um quadro de Fred com sua esposa e seus dois filhos.

       Deitada, na cama barulhenta que pertencia à outra mulher, Lilia fumava. Fred, exausto, estava deitado, ainda ofegante.

"Você é a minha rainha.", disse.

"Sei...", respondeu ela, indiferente, enquanto soprava a fumaça.

       De repente, seu celular tocou. Apressada, levantou da cama, ainda nua, e foi procurá-lo em sua bolsa. Encontrou-o.

"Alô?", apagou o cigarro no cinzeiro. "Oi, quanto tempo! Estou morrendo de saudades.", um sorriso se abriu no rosto de Lilia. "Sério? Estou indo para aí."

       Assim que desligou o aparelho, a mulher se meteu no banheiro e ligou o chuveiro.

"O que você está fazendo?"

"Tomando banho.", disse enquanto se ensaboava.

"Por quê? Quem era no telefone?", perguntou ele, ciumento.

"Uma amiga que chegou de viagem."

"E precisa tomar banho para ir vê-la?", estava desconfiado.

       Ela não respondeu. Rapidamente, pegou suas roupas e as pôs. Calçou o sapato de salto alto, ajeitou o cabelo molhado.

"Tenho de ir, até breve meu cachorrão.", beijou-o.

"Espere, você chegou agora a pouco!"

"Sábado estarei livre.", pegou suas coisas e saiu.

       Com muita pressa. Lilia foi até sua casa e trocou de roupa. Pensou, inicialmente, em não ir à sua residência para ganhar tempo, mas, achou que seria imperdoável ela chegar em seu destino com cheiro de perfume masculino. Assim que chegou no apartamento escuro, pôs um vestido justo cor vinho e retocou o batom. Enquanto se arrumava, alguns risos escapavam. Mal podia conter-se. Desceu as escadas, com seu salto fazendo barulho no chão. Em passos rápidos, atravessou a rua e pegou um táxi, que estava estacionado. Vinte minutos depois, chegou em frente a um hotel. Antes de descer do veículo, checou sua imagem no espelhinho da maquiagem. Em seguida, olhou ao redor e viu um homem moreno, cabelo raspado e barba bem aparada. Era ele.