Fallin' All In You

Dopamina

Nosso corpo é uma totalidade, invólucro e transporte de quem realmente somos. Não devemos olhar para ele em partes. Frequentemente, estamos desatentos e sequer notamos os sinais de aviso que ele emite. Seja uma enxaqueca que nos tira o sono, até mesmo o coração acelerado ao ser exposto a determinada situação ou pessoa. Fomos criados para usá-lo no automático, sem preocupações ou medo. Até que o mesmo pare de funcionar corretamente e o coloque contra a parede: preste atenção em mim, seu estúpido. Por isso, a medicina existe, sana grande parte das dúvidas e oferece o tratamento necessário para que se possa seguir em frente, maltratando-o, uma vez ou outra, inevitavelmente.

Meredith estava atenta ao seu naquele momento, pois encontrava-se perdida, mesmo sabendo exatamente onde estava: dentro de um táxi no estacionamento do Grey-Sloan. Seus batimentos cardíacos frenéticos, sugeria que ela estava prestes a cuspir o órgão para a fora. Não restava dúvidas de que aquele era o local mais previsível que poderia escolher, contudo, precisava de uma despedida digna para o que restou de Ellis. A urna com as cinzas dela jazia em seu colo. Seu celular não parava de tocar e ao verificar o visor, percebeu que a bateria iria acabar em alguns instantes. Derek ficaria furioso, mas dane-se. Precisava de ar fresco, porém uma tempestade atingira Seattle naquela noite e a impedia de abrir a janela do carro. Observou algumas pessoas correrem para se abrigarem da chuva e praguejou-se por nunca andar com o guarda-chuva. Árvores chacoalhavam e galhos quebravam-se, assustando-a. O motorista balançava a perna direita impacientemente. Tinha que sair dali o quanto antes e isso incluía ficar encharcada.

Pagou a corrida e abriu a porta do carro. Por sorte, havia trazido o casaco de Addison, que embora não protegesse suas pernas expostas do vento congelante que a fazia estremecer, lhe aquecia os braços e exalava aquele doce e marcante perfume de baunilha, tranquilizando-a. Colocou a urna embaixo do braço e saiu em disparada, correndo por entre os carros e motos estacionados. Sentiu a água entrar em contato com sua pele imediatamente, escorrer pelo rosto e ensopar o cabelo e roupas, deixando-as pesadas e atrasando ainda mais a linha de chegada.

Os trovões ensurdecedores e relâmpagos clareavam o céu, quando Meredith finalmente adentrara o saguão, pingando. Ofegava e tremia de frio, preocupando-se, instantaneamente com seu bebê. Poderia pegar uma pneumonia no estado deplorável que se deparava. Merda. Respirou fundo e dirigiu-se ao elevador, sem prestar atenção em nada à sua volta. Estar no hospital lhe causava uma sensação de déjà vu inconfundível, como se automaticamente estivesse à espreita, aguardando o pior.

Assim que chegou no terceiro andar, deparou-se com Bailey conversando com um paciente e logo esquivou-se, desviando o caminho em direção as salas de cirurgia. Não queria ser vista ainda. Espiou se a segunda sala estava desocupada e somente um cadáver situava-se na mesa, sendo fechado por um dos internos. Andou até o lavatório, varrendo o olhar pelo corredor, antes de entrar. Apenas médicos com os quais não mantinha contado e enfermeiras.

Perfeito!

Necessitava de privacidade para o que estava prestes a fazer.

Mal abriu a porta e a viu.

– Meredith. – ela disse, terminando de lavar as mãos, olhando-a de soslaio.

– Desculpe, pensei que a sala estivesse disponível.

– E está. – disse. – Minha paciente não resistiu. – explicou, virando-se para ela, arregalando os olhos. – Olha seu estado, você está batendo o queixo, precisa trocar de roupa ou pode acabar pegando uma pneumonia. – disse, aproximando-se, sem saber ao certo como proceder.

E sorriu, surpresa, ao vê-la vestida novamente em seu casaco, que agora topava na altura das suas coxas.

– Posso? – pediu permissão, apontando para a urna, a fim de segurá-la e deixá-la sobre o lavabo.