"...e se pudesse desejar algo queria ser a garantia de que nunca mais o visse"

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Mannon Vanderwall trabalhava para se soltar do cachecol, a seda escorria entre seus dedos enluvados e se prendia ao seu pescoço a cada movimento o tecido parecia menos disposto a deixá-la. Sua cabeça latejava com a violência que Cecile estilhaça vinho de 1970 contra as longevas paredes de Hardwicke, a mesma violência que Orlo e Mannon costumavam entorna-las, a única diferença era que agora Mannon as tomava sozinha, aquela noite, acompanhada de páginas amareladas encadernadas em couro, palavras colocadas de uma forma que a deixava mais embriagada que o vinho.

Dominic Montfort. O nome ainda martelava em sua cabeça, causava um onda, a engolfava, deslizava novamente então as profundezas escuras.

E voltava, cada vez.

Um tremor a percorreu, sua cabeça gritava, alguém parecia estar martelando seu crânio incansavelmente, batida após batida, deixando Mannon tonta, exausta. Seus óculos escuros não pareciam fazer o trabalho de bloquear os raios solares que perfuravam sua visão.

Ela piscou, apenas uma leve batida das pálpebras, cílios longos e escuros se misturando, podia os sentir levemente no início da bochecha, mas então, essas sensações e pensamentos se perderam no espaço entre um segundo e outro, pois no seguinte em que o mundo se abriu novamente, parecendo muito mais cheio, claro e principalmente turvo, caído, levando os passos de Mannon a se tornarem cambaleantes, ela conseguia sentir os livros e a xícara de café extremamente quente deslizando, podia quase os ver se estraçalhando ao chão, mas não, o corpo de mannon foi segurado, impedido de se chocar contra o chão molhado.

"Você está bem?" A voz ansiosa de uma garota, não como a Mannon que já enrouquecida pelo cigarro mas algo cítrico, limpo, Mannon sentiu -enquanto sua visão continuava a escurecer e sua cabeça a pesar - uma mão firmemente segurando seu antebraço, a garota soltou um leve sorriso nasal, debochado, ácido, como se alguém tivesse cometido alguma idiotice épica "é claro que você não está bem, que pergunta estúpida, desculpe." Mannon conseguia ver agora, olhos azuis, muito azuis a encaravam, cabelo preto, - não como os seus - era artificialmente preto, a tinta já começava a escorrer e se tornar um profundo tom castanho.

A garota a percorreu com os olhos por um momento, enquanto murmura algo sobre precisarem sentar, o tom pálido de Mannon, seus olhos que não conseguiam focar e a garganta arranhada. Ela se ouviu dizer que estava bem, mas era visível que não, se lembrou momentaneamente que não tomava os remédios a alguns dias.

"Venha, vamos sentar." Mannon sentiu seus joelhos baterem contra a pedra fria e ela os obrigou a dobrar, sua cabeça lentamente parava de doer naquela frequência absurda, Mannon olhou para a garota, era bonita, muito bonita, não o tipo de beleza que sua família possui, fria, artificial, feita, era algo natural, simples, imperfeito.

Ela, no entanto, parecia familiar, pequenos pontos e traços de seu rosto, o formato de seu rosto, o nariz fino e longo, o toque, mas principalmente seus olhos, um tom muito específico de azul, claro, cristalino, Montfort. Mannon Vanderwall engoliu em seco, pois não havia encontrado apenas um deles mas dois.

Se você encontrar um deles saiba que o outro está virando a próxima esquina. Era isso que diziam sobre ela e Nicholas, sentiu seu coração afundar, mas se recusou a pensar sobre isso, sobre qualquer coisa envolvendo sua família.

"Você quer uma água?" Considerando como eram parecidos e Mannon havia acabado de conhecer Dominic, aquela só poderia ser Nora, a irmã mais nova e muito mais energética de Dominic, segunda filha dos Montfort, outro casamento, haviam desaparecido de uma hora a outra como a própria Mannon. Ela sentiu os dedos da mulher -Nora- apertarem seu ombro, Mannon não percebeu o quanto estava se apoiando a aquele toque até que ele a deixou, a mão passando nervosamente entre os cabelos, sibilando algo em uma língua que Mannon não conseguiu identificar.

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⏰ Última atualização: Mar 03, 2023 ⏰

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