Capítulo 9 - Uma pitada de história para dar consistência

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Eu já tinha tido minha fase jovem e inconsequente

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Eu já tinha tido minha fase jovem e inconsequente. Tive anos da minha adolescência em que meus pais não me entendiam e que eu queria estar o mais longe possível deles. Naquela época, eu praticamente memorizava o que eles diziam para ir completamente contra. Não podia sair com minhas amigas? Eu saía. Não podia beber? Eu bebia. Não podia falsificar minha carteira de identidade e entrar em baladas? Era exatamente o que eu fazia. Usava a desculpa de que só estava querendo acumular experiências. Tinha decidido muito nova que seria escritora e aquilo era necessário. Então, mesmo quando meu instinto me dizia para escutá-los, eu ignorava. Mesmo quando eu podia sentir o medo das possíveis consequências arrepiando cada centímetro da minha pele, eu ainda caía de cabeça. Nunca sabia direito aonde estava pisando, mas ia mesmo assim.

Quando entrei na faculdade, já me contava como vitoriosa por ter sobrevivido todas as furadas nas quais tinha entrado. Mas dali para frente tudo se acalmou. Conheci Kendra e nós nos encontramos como amigas. Mas ela era bem mais calma, bem mais caseira. E eu fui descobrindo a beleza naquilo. Morar longe dos meus pais também tinha me ajudado a perceber que eu sentia a falta deles. E nós acabamos ficando muito próximos. Depois de vários anos vivendo tudo intensamente e me sentindo invencível, eu tinha colocado os pés no chão e virado até bastante entediante. Nem pensava mais em meus dias de liberdade, como gostava de chamá-los. Nem sentia mais que fazia parte da minha história. Ainda lembrava de cada detalhe, às vezes até tinha saudades de poder viver sem ter noção de problemas, só que ainda parecia ter acontecido com outra pessoa.

Mas ali, sentada logo atrás de Johann, eu podia sentir os vestígios daquela garota que eu tinha sido, aquela que tinha medo de tudo e, ao mesmo tempo, não tinha medo de absolutamente nada. Ele dirigia sua moto como se ela fosse uma extensão de seu braço, equilibrando perfeitamente a velocidade e o peso dela em todas as curvas que fazia. Eu me agarrava a ele, sentindo o atrito do ar nos meus braços fazer minha pele arrepiar. E o medo descia frio na minha espinha toda vez que ele parecia prestes a nos derrubar, mas subia de volta como euforia quando ele conseguia manter o controle.

Não que eu não confiasse nele. Eu tinha racionalidade o suficiente dentro da minha cabeça para confiar que ele não nos mataria. Ele sabia dirigir uma moto, tinha vindo da sua cidade na Alemanha assim, seguindo o caminhão de mudanças. E ele mesmo tinha usado aquilo como argumento para eu aceitar subir atrás dele. Eu sabia que tudo ficaria bem. Senão por tudo isso, então pelo jeito que ele tinha me sorrido quando me entregou o capacete naquela tarde, convencido e confiante.

Mas o resto do meu corpo não tinha tanta certeza. Eu não podia controlar os arrepios. E nem o frio na minha barriga. Definitivamente não conseguia controlar todas as vezes que algum carro passava por nós e eu fechava os olhos e o abraçava mais apertado. Eu repetia para mim mesma que já tinha feito coisa muito pior, que estava tudo bem. Mas não adiantava. Abria os olhos e ria nervosamente em seu ombro, mas ainda sentia o frio na barriga me fazer segurar Johann mais firme.

Não era minha primeira vez. Já tinha andado de moto antes, algumas poucas vezes. O suficiente para ter me feito sonhar em arriscar mais, pelo menos quando era mais nova. Só que nunca tinha ido tão rápido, nunca por tanto tempo. Nunca em uma estrada tão estreita e mal sinalizada. Me sentia como os corredores da Tour de France, que se matavam para conseguir se manter em cima da bicicleta. O que encaixava bem, já que Johann tinha dito que eles costumavam passar por boa parte daquele caminho. E quem sabe nós não os encontraríamos por ali?

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