Capítulo 7 - Bata tudo em um liquidificador

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No dia seguinte, Johann e eu criamos um plano para acabar com meu bloqueio. Ele chamou de receita de inspiração, como escreveu na próxima página em branco do meu caderno, que tinha ganhado uma capa nova com ilustrações de um brasileiro grafiteiro que ele tinha conhecido em Frankfurt alguns anos atrás. Antes de mais nada, nós procuramos juntos na internet algumas dicas, depois decidimos que dividiríamos os passos entre nós dois. Cada um daria uma ideia, e eu tentaria todas. Mas ainda tinha um detalhe: eu só saberia o que ele tinha de sugestão na hora em que fosse coloca-la prática.

Para a primeira, ele me levou a uma igreja em Amboise que tinha sido construída no século treze. Ela era bem pequena, feita toda de pedra, sem muita ornamentação. Nós ficamos sentados em um dos bancos até os poucos turistas que tinham entrado conosco fossem embora.

"Levanta," ele disse, fazendo o mesmo e indo se colocar na frente do altar. "Finge que essa é uma catedral e você está entrando pela porta da frente," aquela igreja só tinha uma porta aberta e era na lateral.

"Não tenho nem ideia de como isso vai me ajudar a escrever," falei, mas fui até o outro lado da igreja. Mesmo estando o mais distante possível dele ali dentro, só tinha uns dez metros entre nós. Abri as mãos no ar. "E agora?"

"E agora você é Marianne," ele disse, metade triunfante, metade apreensivo.

"Como é?" Questionei, enquanto um sorriso se abria em meu rosto, porque eu definitivamente tinha que ter entendido errado.

"Sabe no final do segundo livro, quando ela acha que Lech a traiu e o encontra pela primeira vez depois de tanto tempo na catedral?" Conforme ele falava, meus olhos iam dobrando de tamanho.

"Se eu sei? Fui eu que escrevi."

"Então, a minha primeira ideia é reproduzir essa cena," ele estava agora inteiro orgulhoso da sua ideia.

Mas eu ainda me sentia perdida. "Como você sabe?" Perguntei. Não era como se meus livros já tivessem virado séries e filmes para ele descobrir de uma forma fácil e nem tão confiável o que acontecia.

Johann deu de ombros, como se não estivesse prestes a admitir algo que me faria me encantar ainda mais por ele. "Eu li os livros, oras. O que pensou que eu fiquei fazendo nas noites em que você voltava para o hotel?"

Era melhor que eu não respondesse o que me veio à cabeça dentro da igreja.

"Eu nem vi nenhum livro na sua casa."

"Leio no Kindle, é claro," ele disse, fazendo um gesto com a mão para acabar aquele assunto. "Não tem muito como ficar acumulando livros se eu nem sei quanto tempo vou passar em cada país. Agora vamos ao que interessa. Você é Marianne."

"E você é o Lech?"

"Não sou?" Ele abriu os braços e percebi pela primeira vez que tinha se vestido de propósito de preto dos pés à cabeça.

Eu ri, com o absurdo de tudo e já sabendo que seria a tarde mais estranha e interessante da minha vida.

"O que você quer que eu diga?" Ainda estava perguntando para ele, Johann, mas ele teve outros planos.

"Eu não quero que você diga nada, Marianne. Não tem nada que possa dizer depois do que fez."

Ainda lutava com o sorriso que não parecia disposto a se dispersar em meu rosto, mas tentei acompanhá-lo. Eu tinha prometido, afinal, e, só de pensar que ele tinha se esforçado para ler meus livros e me ajudar me deixava ainda mais inclinada a tentar tudo que podia.

"Sabe, eu achava que nós éramos diferentes," falei, sentindo que entrava na personagem. Era muito mais fácil do que esperava, era como escrever em voz alta. "De todas as pessoas do mundo, eu achava que você era a única que me entenderia, que não me questionaria, que estaria do meu lado, independentemente de saber ou não o que me motivava," minhas palavras foram ficando mais duras, acompanhadas dos passos que eu dava em sua direção. "Era para você estar do meu lado, Lech!" Aumentei minha voz, apontando para o chão.

Receita (Infalível) de InspiraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora