IV. A garotinha na estrada

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"Nisto erramos: em ver a morte à nossa frente, como um acontecimento futuro, enquanto grande parte dela já ficou para trás. Cada hora do nosso passado pertence à morte. "

Sêneca


— Olá a todos, turma, sou Hizashi Yamada, seu novo professor de Química II. – O homem que Shouto havia visto na sala dos professores andava pela frente da sala, escrevendo seu nome e telefone no quadro, a ponta do pincel arranhando a superfície e provocando aquele barulho infernal de arranhar o qual fazia todos contorcerem o rosto em uma careta. — A professora anterior está de licença para o nascimento do bebê e, portanto, eu assumirei a disciplina por alguns meses como um favor especial para o diretor. – Ele se voltou então para os alunos, guardou os óculos escuros no bolso da camisa, e se apoiou na mesa, os dedos espalmados na madeira e a expressão sorridente demais para aplacar a sensação que o invadia. — Venho observando sua turma desde o início do ano letivo e creio que não teremos muita dificuldade em nos entender. Então, se não houverem perguntas, vamos começar a aula.

Em meio a agitação de pessoas se curvando para retirar os cadernos e canetas das mochilas, Shouto estudou o novo professor. Aquela sensação fervilhante em seu âmago ainda continuava presente, e todos os seus instintos lhe diziam para não confiar nele. Havia algo, como uma sombra negra rondando seus ombros, esticando seus tentáculos de escuridão pelo ar como se estes desejassem capturar algo. Ele nunca havia visto nada como aquilo antes e não saber apenas o deixava ainda mais desconfiado.

O homem prosseguiu:

— Vamos estudar hoje as Funções Orgânicas. As Funções Orgânicas são formadas por átomos de carbono, motivo pelo qual também são chamados de compostos carbônicos. Elas podem ter diferentes grupos funcionais, sendo os principais: hidrocarbonetos, funções oxigenadas, funções nitrogenadas e funções halogenadas. Segundo o planejamento deixado, vocês estudaram os hidrocarbonetos na aula passada, sendo assim alguém pode me dar um exemplo?

A turma olhou em volta, num consenso típico de que ninguém havia estudado, regado a olhos desviados e cabeças baixas, quando Iida ergueu a mão:

— Os hidrocarbonetos são funções orgânicas que possuem somente átomos de carbono e hidrogênio. Os anéis aromáticos ou benzênicos são os mais simples de se identificar.

— Ah, já sei! – Denki estralou os dedos. — São aqueles que parecem um ovo frito, não é?

A turma riu.

— Isso mesmo, Kaminari – o professor concedeu. — O anel de benzeno está entre os compostos mais utilizados no dia-a-dia, estando presente no petróleo e sendo usado para produzir alguns tipos de borrachas, corantes, detergentes e explosivos, além de atuar como componente das fórmulas químicas de diversos sedativos.

A aula prosseguiu em uma revisão geral dos assuntos abordados até então e na apresentação de novos conteúdos. Shouto seguia o professor, atento a todos os seus gestos e fala, em busca de algo que fundamentasse suas suspeitas infundadas e baseadas em nada além de sensações e na terrível aura que ele emanava. O sinal tocou, mas Hizashi os reteve sob a balbúrdia que só um intervalo poderia trazer.

— Não se esqueçam de entregar os trabalhos até a semana que vem. Detestaria ter de mandar alguém para a recuperação tão cedo. – O tom era de alguém que não estava brincando, porém, todos os alunos riram como se aquilo fosse uma grande piada. Shouto não riu, mas sentiu os olhos se fixarem em si, como se aquele fosse um aviso dedicado exclusivamente a ele. — Turma dispensada.

O almoço era um evento que Shouto preferia evitar.

Bom, não a comida, e sim as pessoas. Elas sempre tentavam ser legais apenas para se aproximar do novato misterioso que havia comprado briga com Bakugou no primeiro dia, como se isso fosse lhes render alguma coisa. Talvez fosse. Shouto apenas não entendia muito bem os níveis de relação social e o que lhes renderia sentar em sua companhia 30 minutos todos os dias.

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