Manhã de 03 de agosto,
Por Pedro,
Tive um sonho lindo naquela noite, via longas e brancas asas envolverem meu corpo, sentia o abraço mais reconfortante que poderia ser capaz de experimentar. Ainda adormecido, fui capaz em sentir uma extrema alegria e paz.
Algo que não sentia a meses, não depois de parar com minhas orações.
Ao acordar, ainda estava entorpecido por aquele sentimento puro que apaziguava meu coração.
Enquanto abria meus olhos lentamente, dando ao meu corpo seu tempo para poder sair da cama e começar o dia, olhei para o lado em busca de minha esposa adormecida, vendo-a de joelhos dobrados e mãos unidas próximas aos lábios que sussurravam sua prece matinal. Por um breve segundo a invejei, invejei sua força e fé em servir nosso senhor Deus, em continuar a pisar onde agora éramos julgados por aquilo que escolhemos respeitar e aceitar. Ela carregava uma fé por nós dois, servia aos céus por nós dois, pois eu já não era capaz em suportar aqueles olhares e murmúrios condenatórios sob o teto onde deveria haver amor e compaixão. Onde antes eu via verdade, agora, só fazia-me sentir culpa e medo.
– Bom dia, amor. – A voz de Claudia arrancou-me do devaneio, o sorriso doce me fez empurrar tais pensamentos para o fundo de minha mente no mesmo instante em que o vi.
– Bom dia, querida. – Disse-lhe me levantando enfim. – Que horas são?
– Cedo, não são nem oito da manhã. – Respondeu ao apoiar as mãos sobre o colchão e levantar-se. Enquanto amarrava os cabelos em um rabo de cavalo curto, seguiu a falar. – Queria fazer o café da manhã para seus pais antes de acordarem. São nossos últimos dias aqui, então quero ajudar um pouco mais nos afazeres.
– Sabe o que vão falar sobre...
– Que somos visitas e não precisamos nos preocupar com isso.
– Exatamente. – Falei sorrindo. – Vá começando, irei escovar os dentes e já te ajudo. – Disse por fim, sabendo que Claudia iria seguir com sua decisão mesmo sabendo da bronca que levaria mais tarde.
Alguns minutos depois fui para a cozinha, o cheiro de café fresco perfumando a casa, algumas frutas e bolos de milho e laranja sobre a mesa fizeram meu estomago se agitar com os primeiros sinais de apetite. Me sentei a mesa enquanto Claudia terminava de filtrar a bebida negrume.
– Sempre lembro da minha infância quando vejo essa mesa, toda manhã.
– Sua nostalgia é clara, amor. – Minha esposa falou, enfim se sentando ao meu lado. – Da para ver a felicidade em cada sorriso que da.
Nossos lábios se uniram em um singelo e breve beijo.
– Quer um pouco de queijo branco, ou, goiabada? – Perguntou-me.
– Na verdade os dois, mas eu mesmo pego, pode deixar. – Falei antes que ela se levantasse para o fazer. – Jonathan ainda não acordou? – Indaguei indo até a geladeira.
– Ainda não fui ver – Falou ela, antes de bebericar seu café. – Só irei comer algo e já do uma olhada.
– Fique tranquila, faço isso também.
Disse colocando o queijo e o doce de goiaba sobre a mesa, indo até o quarto onde nosso filho repousava. Dei leves batidas na porta e aguardei respostas.
– Pode entrar. – Jonathan disse do lado de dentro, e assim o fiz. – Bom dia, pai. – Saldou-me com um sorriso suave no canto da boca, ainda deitado sobre a cama, suas muletas apoiadas no criado mudo ao seu lado.
– Bom dia filho. – Fui até a cama, parando de pé ao seu lado. – Sua mãe já fez o café.
– Eu senti o cheiro. – Falou ele, me parecendo um pouco desanimado. – Poderia trazer algo aqui para mim? – Indagou com receio.
– Porque não se senta à mesa conosco? – Rebati sua pergunta, me aproximando mais para sentar-se ao seu lado. – Em breve iremos embora e seus avós já perguntaram o motivo de você não participar das refeições conosco. Mas nem mesmo eu sei a resposta...
Deixei minha fala morrer, olhando em seus olhos. O silencio pairou sobre nós por alguns segundos.
– Eu sei que deveria ignorar, mas é que tipo, aqueles comentários da vovó me incomodam, prefiro evitar estar perto para não desrespeitar ela. – Confessou fazendo um esforço para se sentar sobre o colchão.
– Ela não faz por mal, filho. Sua vó já é uma idosa, conseguir entender coisas diferentes das quais ela aprendeu a vida toda é difícil e...
– Você mudou, aprendeu mesmo tendo vivido anos pensando da mesma forma que ela. – Cortou minhas palavras, eu podia sentir que aquela conversa o afetava tanto quanto a mim. – Então ela também poderia..
– Eu precisei quase perder você, Jonathan. Não ache que foi fácil, que é fácil aprender a mudar algo assim. – Senti minhas mãos tremerem, estava ficando tenso em segundos.
Apertei meus joelhos para que ele não percebesse meu nervosismo.
– Eu só... – segurou a fala por um momento, esfregando o rosto com as mãos, a leve bufada mostrou que tentava conter algumas palavras rudes. – Não consigo ouvir mais nada sobre o meu irmão e ficar na minha, mesmo sendo minha vó, não iria me segurar cara.
Mais uma vez ficamos na quietude. Mesmo querendo que ele mudasse de ideia e se juntasse a nós, o entendia e não podia força-lo a algo.
– Tudo bem, fique aqui no quarto. Trago algo para você e digo que não está se sentindo bem. – Falei, me levantando logo em seguida.
– Valeu coroa. – Agradeceu dando um breve sorriso, aliviado de certa forma. Retribui o sorriso antes de sair.
Ao deixa-lo e fechar a porta, não pude evitar de perguntar-me: era daquela forma que Jonas passou a vida me enxergando, como alguém com a qual ele não queria estar, uma pessoa que preferia evitar a todo instante por medo, angustia ou até mesmo, raiva. Desde novo, sobrecarregado por uma angustia consumidora, um temor sufocante da condenação eterna que sempre esbravejei em seus ouvidos. Aquelas coisas ecoaram em seu coração por anos de torturas internas.
Ser um pai de verdade parece nunca ter sido meu papel, nem mesmo agora, não quando Jonathan parecia ter mais força e coragem que eu, um pulso mais firme para defender seu irmão caçula das palavras preconceituosas de minha mãe.
Que homem fraco e amargurado eu me tornei?! Que homem cheio de ódio e ignorância eu era?!
Não era só sobre aprender a aceitar meu filho como era, aprender a conviver com nossas diferencias e ama-lo além delas, eu realmente estava buscando alcançar isso, vê-lo feliz após tudo que fiz era uma das coisas que eu mais desejava.
Mas será que as coisas iriam se concertar dentro de mim? O abalo que minha fé sofrera ressoava em minha alma a dois anos, a rachadura em meu espirito era profunda e dolorosa e talvez eu a merecesse. Afundar naquele mar de angustia intima e secreto, talvez fosse meu preço a pagar.
VOCÊ ESTÁ LENDO
A Força de Amar. ( Livro 2.)
RomanceO amor é pesado, abrasador, mas acima de tudo, quando é de verdade, ele é forte! Por este sentimento somos capazes de grandezas, estraçalharmos as barreiras de nossos próprios limites há muito criadas. Ele nos torna gigantes dum simples grão de arei...