— Você não o matou? — exclamo alto demais. Mordo o lábio com força e fecho os olhos por um momento.
— Eu não podia. — ela diz friamente.
— Certo. — suspiro sem saber o que fazer. — Ele vai fugir, tenho certeza que daremos o nosso melhor para achá-lo. Se você tiver alguma ideia de algum lugar que ele possa ir, por favor não deixe de nos avisar.
— Ah, mas eu sei para onde ele vai. — ela diz, sombria. Um sorriso sem humor toma conta de seu lábio, repuxando apenas o canto de sua boca.
— Para onde ele vai? — me inclino na cadeira.
— Ele vem pra cá, pra delegacia. — encosto novamente na cadeira. Por um momento quase reviro os olhos, paro no último segundo ao perceber que o gesto não é nada profissional.
— Então o assassino vai vir se refugiar na delegacia? — não consigo evitar o sarcasmo na minha voz. — Eu acho muito difícil, sabe?
— Não se ele fingir ser a vítima. — há um brilho quase divertido nos olhos da garota. Ela parece histérica, isso sim.
— Como assim? — pergunto achando a ideia cada vez mais absurda.
— Jungkook é um bom ator, ele sabe fingir. — ela sorri mostrando os dentes, parece alucinada. — Ele ficou para trás, não vê? Ele sabia para onde eu estava indo, ele poderia ter simplesmente pegado o carro e vindo atrás de mim! Nós dois sabemos que ele é melhor no volante que eu, principalmente naquelas estradas. Mas não, ele ficou, consegue imaginar por que?
— Jimin ainda estava vivo. — ergo uma sobrancelha.
— Isso também, ele deve ter ficado com medo que o Jimin saísse daquele lugar. Mas a razão principal não é essa.
—Qual é? — respondo curto e grosso.
— Ele vai pôr minhas digitais nos cadáveres dos meninos, deixei minha mala lá. Assim, quando a perícia for investigar, vão achar nossas digitais, a minha e a dele. Consegue ver a confusão que vai ser? Ah sim, ele vai vir aqui na delegacia, ele vai contar a história dele, mas uma história onde ele é a vítima. — ela fala isso de forma mecânica, quase como se tivesse decorado um texto.
Algo que ela me disse no início do relato chama minha atenção. "Só quero que escreva o que aconteceu, quero que escreva exatamente do jeito que estou contando". Olho para a garota com desconfiança, por isso que ela queria que eu escrevesse do jeito que ela contou? Por que pensou na possibilidade de mais alguém tentar contar a mesma história? E a reação dela... não é bem a reação que eu esperaria de alguém que acabou de ver quatro amigos morrerem. Essa expressão fria... distante. Por outro lado, quem sou eu para julgar como ele está reagindo? Presenciar essa cena com certeza deixou marcas profundas em Callia, o fato dela não saber reagir não pode torná-la imediatamente uma culpada.
— Eu não acho que...
— Seokjin, precisa vir aqui! — diz Katy, aparecendo na porta.
— Não está vendo que estou fazendo um relatório? — pergunto furioso.
— Há alguém que também deseja fazer um boletim de ocorrência. — sinto a respiração ficar presa na minha garganta quando levanto lentamente.
Abro a porta da saleta e caminho pelo corredor, ciente de que minhas mãos estão suando, ciente de que estou respirando alto demais. Empurro a porta que dá direto para a recepção da delegacia já sabendo o que vou encontrar ali, mas ainda assim ofego quando o vejo.
A descrição que Callia deu é precisa, ao menos na aparência física. Cabelos negros, olhos escuros, pele alva e porte atlético. Sim, eu reconheceria Jeon Jungkook pelas descrições que escrevi.
Mas aquele garoto alí não parece um assassino. Ele tem cortes por todo o rosto, os olhos estão arregalados, o corpo todo treme, sua aparência é tão perturbada que sinto que terão que dar alguns calmantes para ele.
Jungkook me vê, e antes que as palavras saiam de sua boca, eu sei exatamente o que ele vai dizer. E ele diz.
— Eu vim relatar o assassinato dos meus amigos, preciso que me ouça. — a voz dele treme e some enquanto ele continua olhando o ambiente com olhos desesperados.
A porta giratória da delegacia abre outra vez, usando um enorme casaco de pele de urso, o delegado Min Yoongi entra no ambiente. Há olheiras embaixo de seus olhos evidenciando seu sono interrompido.
— Desculpe a demora, meu carro atolou. — diz simplista.
Olho mais uma vez para ambos os adolescentes, meu turno acaba aqui, o que quer que venha depois, Yoongi resolverá. Entrego o relatório de Callia para o delegado que olha o ambiente absorvendo a tensão.
Quando pego meu casaco na cadeira, fico feliz por não ter que resolver esse caso. Na porta, paro e olho para os adolescentes uma última vez.
Callia aparece na recepção. Seus olhos encontram os de Jeon do outro lado da sala. Ela lança um olhar de ódio para Jungkook, e naquele breve momento eu me pergunto o que significa. Um olhar de ódio de uma vítima para o assassino, ou o olhar de ódio de uma assassina que deixou sua vítima escapar?
E ao olhar para aquele garoto que tremia no canto da delegacia, eu me perguntei também o que aquele gesto significava. Uma encenação bem feita para escapar sem ser preso, ou o medo real por encontrar a assassina em sua frente?
Fim.
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s(ʜᴇ)'s ᴀ ʟɪᴀʀ
Fanfiction6 amigos vão para uma cabana. Só dois deles voltam vivos. Um deles é o assassino. O outro é a vítima. Quem está falando a verdade? Quem está mentindo? Capa por: @httaee - Se você estiver lendo essa história em qualquer outra plataforma que não seja...