Margarida

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"O dia está ensolarado, no entanto, está frio

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"O dia está ensolarado, no entanto, está frio. Esse é meu clima favorito. Tem junção mais perfeita que essa? Há o sol com temperatura agradável e logo depois um sopro gelado que faz os pelinhos da nuca subirem. Isso me faz sorrir e aparentemente você também. Parece tranquila hoje, como se soubesse que está tudo bem e não tem nada com o que se preocupar. Esse pensamento de fato, está certo. Mas eu não sei exatamente o que se passa por sua maldita cabeça, você é um paradoxo e eu deveria ser o paradoxo, Eve.

Bom... Para combinar com o dia, lhe trouxe margaridas mais cedo antes de ir a praia. Agora elas já não estão mais aqui, devem ter murchado. Margaridas não são muito resistentes, mas sabia que elas não são flores mas sim uma inflorescência? Isso quer dizer que cada pétala sua, é uma flor. Impressionante, não é? Acho que estou me tornando uma especialista em flores... Talvez quando você acordasse, poderiamos ter um jardim, o que acha? Seria belíssimo. Eu regaria as flores todas as manhãs e depois faria o café com pão feito em casa e queijo colonial. Você acordaria, sentaria na mesa e eu lhe perguntaria como foi o sonho que te fez gritar e falar a noite inteira, você não lembraria pois estaria com fome e doida para comer uma fatia do pão. Eu sorriria e celaria meus lábios em sua testa... Não seriamos Bonnie e Clyde, Eve. E eu poderia me acostumar com isso.

Quando criança, fui para um orfanato pois minha mãe morreu de câncer e meu pai não teve muito tempo para me cuidar. Tinha notas incríveis, era comportada, mas não fiz laço algum de afeto com ninguém. Era sozinha, não gostava de me enturmar. Certo dia, pus fogo no dormitório onde ficava e voltei para os cuidados de papai. Anos depois, ele me colocou novamente no mesmo lugar e eu achei que seria bom. Voltei a ser uma das melhores alunas, sempre tirando notas altas mas nunca acompanhada. A solidão desde cedo me abraçou. Eu me apeguei a ela.
Todas essas coisas me fazem pensar que não há inocência nenhuma em mim e nem nunca houve. Nem mesmo quando criança e eu não vejo isso como algo ruim. Gosto de quem sou e se não fosse pelo passado, não estaria aqui. Não há nada que eu me arrependa até hoje. Não há remorsos, traumas... Todos os assassinatos, a violência, o sangue... Isso tudo é o que sou. Se me arrependece estaria fadada ao suicídio e eu não acho que esse seja o meu estilo.
Me pergunto se o que estou sentido é o laço que nunca tive. Se for, sinceramente, não quero perde-lo. Como escrevi na carta anterior, isso é o que me mantém sã. Me diga, Eve. Esses laços acostumam ser permanentes? Eu adoraria que o nosso fosse. Gosto do jeito que me sinto quando estamos por perto porque nunca é algo planejado. É perfeitamente espontâneo. Aquela eletricidade... Você a sente também? Tenho quase certeza que sim. Ela me trás algo quente. Coisa essa que eu nunca provei antes. Não sei descreve-la, saiba que é bom.

Hoje as palavras estão me faltando mas queria escrever. É como uma conversa sem respostas. Sabe quando as crianças tem um amigo imaginário? É como isso, no entanto, você está aqui. Deitada, em um sono profundo e eu estou a espera de qualquer movimento. Acho... Acho que isso me dói um pouco, mas nunca irei admitir para mim mesma.
Enfim... Espero que esteja tão bem quanto aparenta estar, Eve.

Com amor,

La Villanelle."

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