II- Duas horas

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Se passaram três dias desde que acordei em um trem no ano de 1849, devo dizer que estava sendo legal conhecer aquele lugar daquela forma, Londres era bonita, não haviam tantos carros nas ruas, que eram apenas repletas de pessoas e crianças, alegres e sem preocupações. Não gostava de me gabar, mas a casa estava ficando ótima, eu e meu pai havíamos conseguido arrumar e dar uma boa limpeza no lugar. Agora estávamos pintando meu quarto, algumas vezes olhava para trás e ele estava pronto para me jogar tinta, mas sempre que eu ia fazer o mesmo ele implorava dizendo que seus trapos eram caros, vindos de um alfaiate francês e muito requisitado, e assim os risos se instalavam pela casa.
Nesses três dias eu também notei ter ficado bem mais alto, estava medindo 1,74 agora, tamanho suficiente para ficar ao lado dos jogadores de rugby e até fingir ser um deles, mesmo que ainda não gostasse muito de cheirar suvaco ou de correr pelo campo molhado, e também, ser mais alto não era tão diferente assim, nunca entendi o motivo de a altura de um homem ser tão importante para as garotas, era pra pegar potes em lugares altos? Era o único sentido que conseguia dar a aquilo.

- Você está pintando a janela.

Falou o mais velho enquanto gargalhava após eu passar o pincel no vidro, havia me perdido de novo em meus pensamentos, ou talvez no grupo de garotas que passava pela rua, ele olhou para o mesmo lugar que eu e deu três tapinhas em minhas costas fazendo um sinal com o rosto para que eu fosse lá. Só podia estar louco, ele já havia comentado sobre isso no meu segundo dia aqui, disse que na minha idade já tinha até uma namorada, quase perguntei o que ele fazia solteiro agora, mas isso seria algo cruel, não fazia ideia do que acontecera com minha mãe, pelo menos não a dessa época, e tinha medo de perguntar, acho que as mulheres dessa época não costumavam sair em viagens como geóloga, e a resposta para um pai solteiro fosse um pouco mais triste e trágica que o divórcio. Minhas bochechas ficaram vermelhas e eu o olhei meio torto como se a idéia fosse estúpida, ele gargalhou de novo e insistiu para que eu tirasse a roupa suja e fosse até as garotas, agora paradas na estrada como sempre faziam, rindo e conversando de uma forma que nem parecia ser tão difícil fazer amizade. Com elas. Resolvi fazer o que meu pai queria, ao menos para ser humilhado e enfim ele perceber que não tinha jeito com mulheres, então fui ao quarto do lado e tirei os trapos sujos de tinta, joguei o cabelo para trás e vesti uma roupa mais comum, camisa branca e calças se suspensório, odiava aquilo mas não consegui encontrar nenhuma que não os tivesse, então desci as escadas e caminhei até o lado de fora. Quando sai elas olharam direto para mim do outro lado da estrada, mesmo ainda longe das mesmas meu corpo travou e não conseguia andar até lá. Minha experiência com garotas não era muito boa desde o sexto ano quando recebi uma carta de amor assinada como Nancy Harper, e quando fui falar com ela sobre aquilo a mesma disse não se lembrar de nada, me fazendo passar vergonha na frente de várias amigas, meses depois descobri que Chuck era quem tinha posto a carta, quando fui tirar satisfação o mesmo me deu um soco no rosto que doeu por quase uma semana.
As garotas também começaram a rir do outro lado da estrada de terra, olhando diretamente para mim, mas não eram risadas cruéis, eram apenas risadas baixas como se eu estivesse fazendo alguma gracinha para elas, então meu corpo se relaxou o suficiente para que caminhasse até lá, mesmo que com o andar de um idiota amedrontado, que basicamente eu era naquele momento. Quando cheguei perto o suficiente para lhes cumprimentar dei um sorriso e me curvei um pouco.

- Senhoritas.

Sério? Senhoritas que droga estava fazendo, tenho certeza que se olhasse para trás meu pai estaria na janela coçando a nuca sem entender nada, do que estava acontecendo. As jovens caíram numa gargalhada mais forte ainda quando as cumprimentei, então olhei meio torto e confuso para elas até uma das cinco, que tinha os cabelos negros e soltos até a cintura e usava um vestido azul claro me olhar de cima a baixo e segurar o riso apontando o indicador para meu rosto.

Por trás do RelógioOnde histórias criam vida. Descubra agora