Facílima Fúria

42 5 2
                                    

Foi em março, não se sabe muito bem o porquê, ou se sabe, mas ele é muito vergonhoso, um moço alto com traços europeus morreu deitado na cama. Simples e trágico, inconfundível.

O funeral começou às 10 horas de uma belíssima manhã de domingo, parecia que o corpo do defunto era tão saboroso a terra que toda a vegetação em volta se alegrou e mostrou a sua cor verde da maneira mais radiante possível, as lágrimas dos parentes, regaram as flores murchas que ansiavam por um pouquinho de tristeza... a água que emanava dos olhos dos convidados, mesmo salgada, era deliciosa a aquelas orquídeas que já estavam enjoadas da doçura da felicidade.

Mesmo com a flora tão bem sintonizada com a plenitude, o clima do enterro era de altas expectativas sobre a reação da viúva.

Todos diziam que nunca houve uma mulher tão apaixonada pelo marido como ela. Para que seja mais esclarecido, a mesma já escreveu mais de cem poemas para o marido antes mesmo de eles se conhecerem.

Como isso era possível?

Ela já sentia dentro de seu coração rochoso e com pouquíssima energia que um terremoto se aproximava, como tantos cientistas que preveem eras inteiras do universo, ela já previa que ele viria e a agradaria com o seu calor capaz de dar energia ao seu semblante sem cor e paixão.

E no final da celebração, todos os convidados se retiraram do cemitério e deixaram a viúva.

A mesma olhou para o marido com tanto ódio, que a fúria influenciou a densidade do ar, agora tão pesado, fez o corpo do ex-amado, cujo pseudônimo agora era "odiado", levitasse no ar.

— Como!? — ela se debatia ferozmente, pior que um cachorro ciente do fim de sua existência — fizeste eu provar do melhor, do amor mais puro, da alegria mais evidente, da sensação mais maravilhosa, para que agora me abandonasse dessa forma, me deste um banquete para que depois nunca mais fosse alimentada?!

Naquele momento toda a energia que ele deu a ela em anos de relacionamento, transformou-se em fogo ardente que carbonizou o corpo de seu odiado.

Ela sorriu, antes de cair morta consumida pelo próprio ódio.

O mais impressionante de tudo isso, foi que ela sequer conhecia esse homem.

Incalculáveis - ContosWhere stories live. Discover now