Capitulo 1

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A miséria reina aqui, todos sabem desse lugar sujo, mas nunca fazem nada para nos ajudar.
Em baixo, que é como chamamos aqui, vivem os mais humildes e de mais bom coração que eu já conheci, mas também vivem prostitutas e os ladrões.

Os guardas reais dificilmente vem aqui, no caso só para retirar alguém morto, mas para o restante que acontecia aqui de nada eles adiantavam.

Vi minha mãe apanhar por muito tempo do pai da minha irmã e eu me lembro todos os dias da minha vida da primeira vez que pedi socorro por ela.

Eu tinha 13 anos quando meu padrasto agrediu minha mãe pela primeira vez, eu não sabia o que fazer, mas não fiquei parada.

Eu saí de casa correndo e passei pelos corredores apertados, que são como as ruas dos cortiços, procurando por um guarda para pedir ajuda e eu corria e corria e não entendia porque não tinha nenhum.

Ao mesmo tempo que eu tropeçava e esbarrava em várias pessoas pelo caminho, eu já me via chegando ao centro do vilarejo, mas não entendia.

Os guardas não são para proteger as pessoas?
Porque não tem nenhum aqui em baixo? Eu me questionava.

Cheguei em cima, no vilarejo, parei e com o desespero tomando conta de mim já fui em direção ao primeiro guarda que eu vi.

-Senhor, senhor me ajuda. -Eu peço com a respiração ofegante e com tom de desespero.

Ele me olhou de cima a baixo reparando principalmente nas minhas roupas. Parecia nem ter se preocupado com meu desespero.

-Você veio de onde menina? -Ele perguntou ainda mantendo sua postura

-O pai da minha irmã está batendo muito forte na minha mãe, você tem que fazer alguma coisa. -Ele se abaixou para ficar da minha altura e olhou nos meu olhos

-Isso é coisa lá de baixo, você é de lá, não é?

-Sim. -Falei reparando em seu bigode grisalho assim como seus cabelos.

-Coisa de baixo não é problema nosso! -Ele se levantou, ajeitou seu uniforme e virou as costas e saiu andando.

-Eu vou contar tudo para o Rei e a Rainha, que você não quis ajudar a minha mãe. -Eu gritei com os olhos cheios de lágrimas. Ele apenas olhou e riu de mim. Me senti um lixo!

Saí correndo mais rápido ainda em direção ao castelo, mas já estava cansada e não conseguia correr tão rápido quanto eu queria, várias pessoas olhavam para mim com olhares diferentes enquanto eu passava.

Sem querer tropecei e derrubei um cesto de um moço, cheio de pães e manteiga. Parei por um segundo e olhei para o chão e vi os cachorros se aproximando para comer.

O homem careca e gordo com avental me olhou com ódio e eu voltei a correr, ele correu atrás de mim gritando que eu iria pagar por aquilo.

Eu corri e corri, mas ele puxou o laço do meu vestido me fazendo cair de cara no chão, ralando os cotovelos, joelhos e as mãos.

-Sua peste, você vai pagar tudo. -Ele disse gritando comigo.

Eu me encolhi toda no chão e machucada fiquei sem reação, mal tínhamos o que comer. Eu nunca se quer peguei nenhuma libra nas minhas mãos.

-Eu não tenho dinheiro, eu preciso ir até o castelo. aproximou de mim. -Me desculpe senhor. -Minha voz trêmula entregava o quanto eu estava assustada.

-Se você não tem dinheiro pode me pagar de outra forma. -Se abaixou na minha direção e passou a mão sobre meus cabelos, enxugou uma das minhas lágrimas com sua mão áspera.
-Você deu sorte que eu gosto de garotinhas, as loiras, mas você com esses cabelos castanhos e esses olhos verdes me chamaram um tanto a atenção.

Ele se levantou e me puxou violentamente pelos braços para que eu ficasse de pé. Com a visão toda embaçada de tantas lágrimas presas aos meu olhos só pude escutar uma voz.

-Deixa ela, ela não vai pagar de forma alguma para você. Eu quem vou! -Olhei e era um rapaz não muito mais velho que eu, tirou uma nota e duas moedas do bolso e entregou para ele.

-Sorte sua menina, sorte sua! -O homem disse olhando para mim e pegou o dinheiro da mão do rapaz e saiu andando.

O Rapaz veio na minha direção na hora, eu limpei minhas lágrimas e pude reparar em seus cabelos loiros, suas sardas e como estava bem vestido.

-Você está bem? -Ele colocou suas mãos em meu ombro e eu dei um passo para trás.

-Eu não tenho dinheiro. -Digo e ele sorri.

-Calma, eu não quero seu dinheiro só quis te ajudar, aliás eu sou o Henry. -Ele falou sorrindo e esticando a mão para me cumprimentar.

-Eu sou Maya. -E aí me toquei que não podia perder mais tempo. -Preciso ir no castelo, não posso ficar aqui.

Ignoro totalmente o seu cumprimento e volto ao desespero. Me viro e no mesmo instante ele puxa minhas mãos raladas.

-Maya me conta o que houve, eu vou te ajudar. -Eu me virei para ele e por um segundo achei que poderia mesmo.

-Você não pode me ajudar, o Rei e a Rainha tem que saber o que acontece lá em baixo. -Pude ver a feição dele mudar completamente para uma cara de confuso.

-Você acha que chegando lá com as roupas sujar, toda machucada e fora que não está com vestimentas a altura, alguém vai escutar você? Não vão, sinto muito em te dizer isso. -E na hora que ele disse isso pude ver que ele reparou em minha tristeza e meu silêncio disse muito mais por mim. -Olha agora entendi que você é de baixo, eu não ligo e vou te ajudar.

-O pai da minha irmã está batendo na minha mãe e nós estamos fracas porque quase não temos o que comer, minha mãe vai morrer assim, ela não vai aguentar. -Desabafei aos prantos.

-Como é o nome dele? -Ele me encara.

-Patrick. E porque nenhum guarda quis me ajudar? Eles não me escutam.

-Volta para sua casa, não posso fazer muito agora, mas prometo que vou atrás de você e resolver isso. -Então vejo ele arregalando os olhos e olho para trás, vejo o homem dos pães cheio de guardas com ele. -Maya, corre! Agora, vai!

Eu não queria deixar ele ali, mas estava machucada e não conseguia parar de chorar, não pensei duas vezes. Corri.

Quando cheguei aos corredores de baixo pude por um instante me sentir segura.

Voltei o mais rápido para minha casa. Quando cheguei encontrei minha irmã e minha mãe desmaiadas, as duas com hematomas.

-Meu Deus. -Susurrei baixinho colocando a mão na boca.

-É Maya, hoje você decidiu correr. -Levei um susto quando reconheci a voz de Patrick.

-Você é um covarde, como você pode bater na sua própria filha, ela é só uma criança.

-Eu vou matar todas vocês aos poucos e vender suas carnes para comprar o tanto de vinho que puder. -Disse ele dando gargalhadas ao fim.

Então um grande estrondo veio da porta e uma fumaça  não lembro de nada além de ver tudo rodando e desmaiar.

No dia seguinte acordei com a minha mãe chorando aos meus pés, perguntando se eu estava bem. Reparamos que o Patrick havia sumido.

Estávamos com medo de quando ele iria aparece, se passaram 3 dias, 1 mês, 1 ano e nunca mais soubemos dele.

Do Outro LadoOnde histórias criam vida. Descubra agora