Eu só queria que a minha vida fosse um sonho e que pudesse acordar quando eu quiser. Ou um livro onde eu poderia só ler, talvez uma música só para escutar. Qualquer coisa seria melhor do vive-la, o que é um verdadeiro caos. Normalmente, eu costumo dizer que a vida é aquilo o que fazemos dela, mas de uns tempos pra cá, pude perceber que não. A vida é algo programado mas sem você saber como funciona, você só tenta resolver, mas é como se nunca desse certo. Uma ilusão.
"Lottie, cadê a sua mala?" ouço a voz alta de minha mãe na nossa, até então, sala.
"Eu já to descendo com ela" termino de fechar a mala e desço as escadas deixando a mesma em frente a porta.
Observo a minha casa vazia, podendo soar eco na mesma. Mudança é uma coisa tão chata. Parece até um sonho que passei meu último fim de ano na casa que moro a quinze anos. Vou sentir tantas saudades, que nem consigo explicar direito.
"Bom, acho que já está tudo aqui não?" minha mãe passa a mão no bolso de sua jeans de uma maneira rápida, conferindo tudo que, possivelmente, passa pela sua cabeça.
Ouço a buzina do táxi em frente a porta, sinal para a gente colocar as coisas no mesmo. Depois de tudo posto no carro, dou um longo suspiro quando sou a última a sair daquela casa. Última vez. Vivi tantos momentos bons aqui. tão felizes com a minha família que chega a ser doloroso deixar para trás.
"Qual é o destino senhora?" o taxista pergunta enquanto eu me aconchego no banco de trás.
"Aeroporto internacional" minha mãe diz sorridente enquanto coloca o cinto de segurança.
Em um trajeto rápido, chegamos lá e o motorista insiste em nos ajudar. Fazemos o chek-in e esperamos um tempo, até dar a hora exata de entrar logo no avião. Quando dá a hora, apresentamos nossos passaportes e entramos nele, logo nos acomodamos numa poltrona que foi a escolhida pela loca da minha mãe, perto das saídas de emergência. Digamos que ela tenha pânico de viajar, só digamos. Quando o avião decola, sinto um enjôo terrível, que depois passa.
"Se quiser o remédio está aqui está bem?" ela diz notando a minha aparência esbranquiçada. Ela sabe que eu fico enjoada com qualquer tipo de viajem.
Agradeço a ela, que se vira para o lado e logo cai no sono, e posso concluir que ela não dormiu a noite toda. Seus cabelos castanhos claros compridos escorre pelo banco do avião e ouço seu resmungo pela falta de conforto em deitar.
Pego meus fones de ouvido e ponho Heathens do Twenty One Pilots pra tocar. Olho pela janela, e dou um suspiro longo quando vejo Phoenix ficando cada vez menor, até eu não poder mais ver. Tudo o que tinha, escola, amigos...ficou para trás. Tanta coisa aconteceu, tanta coisa mudou que eu penso que não acompanhei e estou demorando a digerir tudo isso.
Meus pais são divorciados a seis anos, o que foi muito difícil pra mim. Meu pai nunca foi muito romântico ou carinhoso. Mas ele amava a família, ou pelo menos eu achava. Ele traiu minha mãe com a sua assistente. Quando minha mãe descobriu, ficou arrasada claro, mas ela deu chances pra ele se perdoar. Foram longos dois anos de fingimento de um casamento perfeito, até que veio o divórcio. Creio que foi um alívio para a minha mãe, apesar de que no começo foi difícil pra ela, pra mim e para meu irmão Charlie, que na época tinha dezesseis anos.
Eu passei anos tentando entender porque meu pai fizera isso, eu nunca cheguei entender ao certo. Minha mãe é tão linda com seus olhos verdes brilhantes e um sorriso que faz qualquer homem cair aos seus pés. Como ele pôde fazer isso? Largar anos de casamento, dois filhos, por uma loira oxigenada? Eu fiquei com tanto ódio que quanto fui visitá-lo pela primeira vez em Seattle, dois anos depois, falei muito e nós brigamos feio ao ponto de eu não vê-lo desde então. Ou seja, ele trocou a família que dizia que amava por ela. Babaca.
Gosto de não pensar isso a maior parte do tempo, mas desde o Natal que a minha cabeça não sossega e se permite esquecer essa história que tanto me assombra desde então. Prefiro dormir e tentar repor o sono que eu perdi ontem na minha despedida daqui com meus amigos.
(...)
"Hey dorminhoca" minha mãe me cutuca e eu abro meus olhos logo reclamando de dor na coluna. Esses bancos não são nada confortáveis mesmo.
No caso, ela me chamou para comer mesmo, o que eu agradeço, pois minha barriga não para de roncar. Só que eu sou muito anta e esqueci de tomar o remédio de enjôo, e logo após aquele sanduíche maravilhoso, acabo vomitando no saco plástico pendurado no banco da frente.
Graças a Deus consegui voltar a dormir. Era um vôo de oito horas e meia, na certa eu iria dormir quase ele inteiro. Para mim, se passaram apenas minutos desde que dormi até pousarmos, mas olhei no meu mais novo fuso horário já adaptado pelo celular, se passaram quatro horas e quinze minutos. Levanto pegando nossas bagagens de mão e saio junto com ela do avião. Passamos e pegamos o restante das coisas, que eram muitas aliás. Duas mulheres, oito malas e dois táxis.
"Bem-vinda a Londres meu bem" minha mãe diz enquanto olho pela janela.
O tempo nublado não tira a beleza da cidade. Seus prédios que parecem ser de outra época, toda essa arquitetura me fascina completamente o que me faz sorrir largamente. Começa a nevar quando passamos em frente a London Eye. Passamos por uma enorme praça onde as crianças não se importam com a neve e brincam alegremente. Tivemos que esperar um pouco porque começou um transito horrível, o que agradeci mentalmente pois posso continuar admirando tudo. Essa cidade é maravilhosa! Como nunca vim aqui antes?
Depois de quase uma hora, estávamos parando em frente a uma grande casa cinza e branca, com jardim na lateral e grandes portões pretos de ferro na entrada. Um homem sai na porta quando começamos a tirar as malas do carro e ele vem ajudar junto com mais uns dois empregados.
Bem-vinda a sua nova vida Lottie.
Penso comigo mesma.
"Que bom que chegaram" o homem sorri, e quando isso acontece logo o reconheço. Bruce Malik, noivo da minha mãe.
"Éramos para estar aqui mais cedo, mas o transito não deixou" ela diz sorridente e eles se beijam, me fazendo virar o rosto.
"Olá Lottie, que bom vê-la" ele se aproxima de mim e tenta algum contato, mas me mantenho parada e apenas aceno.
"Fala aí" digo e sorrio sem mostrar os dentes. Ele fica meio sem graça, e o olhar da minha mãe me repreende pela minha atitude.
"Bem... vem, vou mostrar tudo para vocês" ele diz indo na frente e vou junto por último. Cada vez que a gente se aproxima da grande casa, que inclusive era muito bonita, mais meu estômago fica revirado.
Tantas coisas acontecendo, e a cada passo que dou parecendo que ia progredir, me sinto em um regresso infinito. Queria ser igual ao meu irmão, que quando descobriu, quase soltou fogos de alegria. Eu já pensei que ficaria pelo resto da vida sem a minha mãe.
Eu acho que estou mesmo é com medo. Medo de mudar. Medo do que não sei. Medo do que esse país novo, essa cidade nova possa reservar para mim.
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oie!! Então eu reescrevi essa história, adaptei algumas coisas, mudei outras... enfim. Postando de novo porque eu gosto MUITO dela e não paro de pensar desde 2016 (quando eu comecei a escrevê-la). Espero que gostem e boa leitura!
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Heathens// Z.M. (HIATOS)
FanfictionO novo casamento da mãe de Charlotte a fez mudar de país e se habituar a uma nova vida. Se já era difícil essa mudança, imagina lidar com o arrogante e intenso meio irmão?