Capítulo XXXIX - Lidando com Casamentos

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Anne sentiu que a vida tinha um sabor de anticlímax durante as primeiras semanas após seu retorno a Green Gables. Sentia falta da alegre camaradagem de Patty's Place. Durante o último inverno, havia idealizado sonhos brilhantes, sonhos esses que agora tinham se transformado em pó ao seu redor. No atual estado de desgosto consigo mesma, não conseguiu recomeçar a sonhar imediatamente. E então descobriu que, enquanto a solidão com sonhos é gloriosa, a solidão sem eles tem pouco encantamento.

A jovem não tinha voltado a ver Roy após a dolorosa despedida no gazebo do parque, mas Dorothy foi vê-la antes que fosse embora de Kingsport.

— Lamento tanto por você não se casar com Roy! Queria muito tê-la como irmã. Mas você está certa. Ele iria entediá-la terrivelmente. Eu o amo, e ele é um garoto doce e adorável, mas não é nem um pouco interessante. Aparentemente ele deveria ser, mas não é.

— Isso não vai estragar a nossa amizade, vai, Dorothy? – Anne perguntou, melancólica.

— Não, de jeito nenhum! Você é uma pessoa boa demais para perder o contato. Se não posso tê-la como irmã, quero tê-la como amiga. E não se aflija por Roy. Ele está imensamente triste agora – tenho que ouvir suas queixas o dia inteiro –, mas ele vai superar. Ele sempre supera.

— Oh... sempre? – perguntou Anne, com uma ligeira mudança no tom de voz. — Então ele já superou antes?

— Meu Deus, sim! – admitiu Dorothy, com franqueza. — Duas vezes. E ele se queixava igualmente nessas ocasiões. Não que as outras moças tivessem, de fato, recusado seu pedido de casamento; elas simplesmente anunciaram o noivado com outros rapazes. Mas é claro que, quando ele conheceu você, jurou para mim que nunca antes tinha amado de verdade. Disse que os sentimentos anteriores tinham sido meras fantasias de adolescente. Mas não creio que você precise se preocupar.

Anne decidiu seguir o conselho. Sentia uma mescla de alívio e ressentimento. Roy havia afirmado, com grande convicção, que ela era a única a quem tinha amado. E, sem dúvida, ele acreditava nisso. Mas era um consolo saber que, muito provavelmente, ela não havia destruído a vida dele. Existiram outras deusas, e Roy, de acordo com Dorothy, decerto tinha a necessidade de estar venerando em algum santuário. No entanto, a vida fora despojada de muitas outras ilusões, e Anne começava a pensar, entristecida, que a existência parecia muito vazia.

Na tarde de sua chegada, ela desceu do quarto com o semblante pesaroso.

— O que aconteceu com a velha Rainha da Neve, Marilla?

— Oh, eu sabia que você ficaria triste por isso – disse Marilla. — Eu mesma fiquei. Aquela árvore estava ali desde que eu era menina. A grande tempestade que tivemos em março a derrubou. O tronco estava completamente apodrecido.

— Vou sentir tanta falta! – lamentou Anne. — Meu quarto não parece o mesmo sem ela. Nunca mais conseguirei olhar pela janela sem a sensação de perda. E, oh, nunca antes cheguei em Green Gables sem que Diana estivesse aqui para me dar as boas-vindas.

— Diana tem algo mais para pensar agora – disse Mrs. Lynde, de forma significativa.

— Bem, conte-me todas as novidades de Avonlea – pediu Anne, sentando-se nos degraus da varanda, onde o sol da tarde caía sobre seus cabelos numa fina chuva de ouro.

— Não há muitas novidades além daquelas que já lhe contamos por carta – prosseguiu Mrs. Lynde. — Talvez você não saiba que Simon Fletcher quebrou a perna na semana passada. É uma grande coisa para a família dele. Estão fazendo uma centena de coisas que sempre quiseram fazer antes, mas não conseguiam estando ele por perto, aquele velho enjoado.

Anne da Ilha | Série Anne de Green Gables III (1915)Onde histórias criam vida. Descubra agora