3 - Além do Porão

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- Como ela soube que eu sou um Transmorfo? - perguntou Kaleb caminhando ao lado de Mohamed.

- Tia Lamine tem... - Mohamed expirou. - Tinha... Uma intuição muito aguçada. Bastava alguém se aproximar sem ela precisar olhar que saberia de que natureza se tratava!

- Estou impressionado! - admitiu o rapaz e lançou um sorriso ao outro.

Os garotos caminhavam na trilha mencionada pela Sra Lamine, depois de quase não encontrarem a saída dos túneis subterrâneos além do porão. Precisou Mohamed enfeitiçar uma pedra para dissipar a escuridão naquela parte. O rapaz sardento passara o caminho pelo subsolo todo praguejando por não terem deixado-o trazer sua mochila, mas Kaleb lhe dera verdadeiros sermões, e o rapaz forçadamente compreendera.

O pedregulho que Mohamed enfeitiçara clareava fracamente o caminho entre as distorcidas árvores daquela parte da Floresta Sibéris. Para a sorte de ambos, feixes de luz branco penetravam por entre as copas dos carvalhos e eucaliptos, revelando uma lua cheia viva e deslumbrante. O chão era pavimentado com rochas que aparentavam ter sido tiradas do fundo do Rio Ahor, o rio que cortava a floresta. Mesmo que fosse de agrado aos olhos de quem a cruzasse, durante à noite, a trilha mais parecia uma estrada no interior de um cemitério abandonado.

- Estamos perdidos - sussurrou Mohamed e se aproximou de Kaleb. Ele se pôs a olhar pela densa mata que os cercava.

- Não! Claro que não! Estamos fazendo o que Sra Lamine nos ordenou.

- Te falei que ela é meio biruta?

- Ela se mostrou muito sábia - Kaleb o olhou torto e lhe deu um empurrãozinho, mas Mohamed voltou a se achegar ao rapaz. - Está com medo?

- Não. Estou me prevenindo.

- De quê?

- Caso alguma coisa me puxe de repente, você poderá me salvar a tempo antes de me devorarem.

Kaleb soltou uma risadinha.

- Fica tranquilo. Não há criaturas nessa parte da floresta! - E deu dois tapinhas nas costas de Mohamed.

- E os Filhos da Mata?

- Eles não perambulam durante o luar.

- E por que não?

- Eles comemoram.

- Comemoram o quê? - indagou Mohamed, desviando o olhar para o rapaz.

- Eles vivem com uma crença. Acreditam que se cortejarem a Lua, ela os recompensará de alguma forma.

- Mas a Lua é só um pedaço de rocha que gira em torno de Sartre!

- E que se não fosse por ela, estaria bem mais escuro e sombrio agora, Mohamed. - Kaleb o encarou, sorriu. Pelo silêncio que se fez, teve certeza de que dera um tapa na cara dele. - Na verdade - continuou o rapaz. - Há uma lenda de que, antes da Lua ser Lua, ela era um espírito que pairava pela floresta. Quando viu que a escuridão tomava de conta de tudo durante a noite, a Lua resolveu sacrificar sua forma espiritual, e a essência dela subiu ao céu e se aglutinou, virando a... - Ele apontou para cima, esperando que Mohamed respondesse.

- A Lua! - O garoto olhou para cima, mas tudo que viu foi a parte inferior da copa das árvores.

Quando os rapazes se deram conta, uma névoa tinha cobrido o ambiente, escondendo a trilha totalmente. Mas Mohamed, movimentando a mão sobre ela, fez com que o caminho tornasse à visibilidade. Kaleb, novamente, estapeou duas vezes as costas do rapaz.

- Mas e você? - perguntou Kaleb, com os olhos fitos no outro. - Quem é você, afinal?

- Mohamed Brankovic Bashar, se é que isso é do seu interresse.

O Segundo Herdeiro - A Caçada Onde histórias criam vida. Descubra agora