"Mesmo sabendo que um dia a vida acaba, a gente nunca está preparado para perder alguém."
— Nicholas Sparks
Perder alguém nunca é fácil ainda mais quando é alguém tão próximo de nós. Sempre me falaram que a dor muda a gente, mas eu nunca imaginei que mudasse tanto assim... A dor nos faz querer se afastar de todos por mais que as pessoas ao nosso redor naquele momento nos ame. E foi assim que eu me senti e fui isso que eu fiz...
No auge dos meus 22 anos nunca pensei que passaria por tanta turbulência assim, que sofreria a dor do luto dessa forma. Sempre imaginei que perder alguém doesse, mas nunca pensei que doesse tanto e aqui estou eu sentada no banco de uma igreja, igreja do qual eu frequentava aos domingos rigorosamente, a pedido da minha mãe, na verdade; por ordem dela que sempre foi muito devota e religiosa.
As pessoas me cumprimentavam me desejando força, mas eu estou fechada demais em meu casulo para responder qualquer coisa, simplesmente aceno com a cabeça. Não tenho forças para pensar em nenhuma frase, então prefiro me calar. Estou sentada no primeiro banco próximo ao altar. A pouco mais de 5 metros se encontra o caixão da pessoa que eu mais amei na vida. Aquela que me deu à luz, que me ensinou a dar os primeiros passos, que estava comigo no primeiro dia de aula, no primeiro aniversário, que me fez acreditar no amor e que me fez me tornar tudo que sou hoje. Que me ensinou o caminho certo e me fez ter os princípios que tenho!
Ao meu lado está meu pai e ao lado dele, minha avó materna, que chora sem parar pela perda da única filha. Meu pai se encontra mudo desde quando foi declarada a morte da minha mãe, ele não derramou uma única lágrima, seu rosto não tem expressão alguma, é como se um completo vazio fizesse parte dele agora. Mesmo eu não tendo uma relação muito próxima com ele, ele continua sendo meu pai e eu sei que o amor que ele teve e sempre terá pela minha mãe é verdadeiro. Mas, meu pai nunca foi de demonstrar muito seu lado sentimental, desde pequena nunca vi meu pai me dizendo eu te amo. Abraços eram somente em datas comemorativas e ainda aquele abraço de 2 segundos, seguido com um tapinha nas costas. Minha mãe sempre dizia que meu pai sempre foi extremamente reservado e fechado. Filho de militar sempre foi criado assim em casa, sem muito carinho e contato físico dos pais, que já são falecidos. Ao contrário da minha mãe que acredito que por ser filha única sempre teve muito amor. Filha de dona de casa e marceneiro, nunca teve muito luxo, mas sempre teve o que muitos não tem: amor. Eu sempre me perguntei como meus pais ficaram juntos sendo os 2 tão diferentes? Minha mãe falava que meu pai tinha um lado que só ela conseguiu ver, que por mais distante que ele parecesse ser, era um homem bom que nos seus poucos momentos era bem carinhoso com ela. Juro que ainda não vi esse lado do meu pai. Não que ele fosse grosso, ou algo do tipo comigo. Isso ele nunca foi, mas também nunca foi lá muito carinhoso. Comigo ele sempre foi muito rígido. Não tive permissão de sair de casa até os 16 anos, era da escola para casa e de lá para a escola, e eu não poderia desobedecer. Ele nunca me bateu, mas suas broncas eram piores que qualquer tapa. Sempre tive muito respeito por ele.
— Está na hora Maria Eduarda... — senti a mão firme do meu pai em meu ombro me avisando estar na hora de dizer minhas últimas palavras sobre a minha mãe. Respirei fundo, criando coragem para dizer tudo sem desmoronar em cima do púlpito. Escrevi poucas palavras sobre ela porque sabia que se dissesse muito eu não aguentaria, o baque era demais para mim.
— Ok... — assenti com a cabeça e fui em direção ao palco, com o meu pequeno caderno nas mãos. Abri em cima do púlpito, li novamente o que escrevi pela milionésima vez e respirei fundo mais uma vez... — Minha mãe sempre foi a mulher que qualquer um gostaria de ter em sua vida. Era uma mulher excepcional, tanto como mãe e como esposa, acredito eu... — a maioria das pessoas riu, mesmo em meio as lágrimas acharam um motivo de felicidade.
— Ela me ensinou tudo que sei e me transformou no que eu sou hoje. Devo minha vida, literalmente a ela. Filha única, de pais simples. Foi criada no interior nunca teve uma vida de luxo, mas sempre teve o amor dos pais. Sempre foi ensinada a amar e respeitar o próximo, seja ele quem fosse, ela sempre me falava: "Duda, o amor supera qualquer coisa, mas nunca coloque o próximo à cima do seu amor-próprio. Ame o próximo, mas primeiro ame a si mesmo." E assim eu fui criada cercada de amor por ela e nunca imaginei que hoje eu estaria passando por isso. Ela sempre dizia que viveria o bastante para me ver adulta e feliz, adulta eu fiquei, agora feliz... Isso eu não sei quando irá acontecer, já que o meu maior motivo de felicidade está agora dentro de um caixão. Eu sei que de onde ela estiver ela sabe que eu ficarei bem, ela sabe que me ensinou tudo que aprendeu, que eu vou seguir pelo caminho correto e que mesmo que eu tropece em alguns pedregulhos, sempre vou encontrar o caminho de casa. Mãe, eu quero que você saiba que eu te amo e que sempre amarei, eu fico feliz que agora a senhora não sofre mais, que descansou e que foi muito feliz... — não consegui mais prosseguir com o discurso, as lágrimas tomaram conta do meu rosto. Eu chorava de soluçar e ali naquele momento, pela primeira vez desde que minha mãe ficou doente, eu culpava Deus por levar ela de mim, culpava por fazer ela sofrer tanto. Por perder a pessoa que eu mais amava no mundo, para uma doença tão devastadora quanto o câncer.
Eu chorava por saber que ela nunca veria eu me formar, mesmo estando tão perto, que ela não estaria no meu casamento, que não conheceria seus netos e que não envelheceria ao lado do rabugento do meu pai. Eu chorava mais ainda por saber que ali não era mais meu lugar, que eu teria que deixar tudo que eu amava. O lar em que fui criada, as pessoas que me viram crescer e o pouco da família que restou. Eu não suportaria continuar na casa em que minha mãe viveu por tantos anos. As lembranças já doíam muito, mesmo fazendo alguns dias de sua morte...
Voltei a me sentar e o resto do velório e o funeral passaram como um borrão para mim. Lembro que meu pai falou poucas palavras em homenagem a minha mãe, minha avó também falou lembrou das peraltices dela, na infância e de como ela sempre foi uma criança feliz. Lembrou que mesmo algumas horas antes de morrer ela agradeceu a Deus por tudo, mesmo com fortes dores. Dores que nem com a medicação extremamente forte faziam cessar. Mesmo em meio a tudo isso minha mãe continuou sorrindo. As palavras da minha avó me fizeram voltar naquele momento, me fez reviver suas últimas palavras...
— "Seja feliz minha doce Duda... Ame e permita ser amada, não deixe a dor da perda te fazer esquecer que o amor é belo. Não se feche para as oportunidades da vida, sofra seu luto, pois ele é necessário, mas não o leve com você para sempre. Você merece o mundo e eu sei que em algum lugar tem alguém que vai te fazer extremamente feliz... Assim como eu fui ao lado do seu pai. Não se esqueça nunca que eu te amo e que onde quer que eu esteja, eu sempre estarei olhando por você..." — eu não consegui permanecer no quarto depois disso. Minha mãe faleceu 20 minutos depois, em casa como era seu desejo. Desse dia até o funeral eu não lembro de quase nada. Lembro que passei os dias na cama, só levantando para fazer o essencial. Minha melhor amiga permaneceu comigo todos os dias desde a perda dela até o funeral. E ela estava ali ao meu lado, segurando minha mão naquele momento e me fazendo ser forte, enquanto o amor da minha vida era enterrado, debaixo de sete palmos de terra.
Essa é uma dor que eu sei que nunca vou superar...
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Até A Última Folha | Livro 1 (DISPONÍVEL NA BUENOVELA)
RomanceLivro l da Trilogia Jornadas do coração "O amor só vale a pena, quando encontramos alguém que nos transforme na melhor versão de nós mesmos" Maria Eduarda havia acabado de perder a pessoa que mais amava no mundo: Sua mãe, que faleceu devido a um câ...