Capítulo 3

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Diego

Chego no São Cristóvão com meu antigo carro. Não acredito que meu pai manteve meu carro, um camaro. Acho que já não tenho idade para andar em um carro tão chamativo, mas não contive o sorriso ao me lembrar das aventuras que tivemos ali. Essa época passou. Hoje no almoço já deixei acertado para substituir o carro.

Desço na garagem privativa e antes de olhar em volta já sei que todos estão olhando. Cheguei na recepção com a percepção de que nada mudou por aqui. Ainda continua uma recepção grande, ótima estrutura, com balcões de atendimento separados por Box, atendentes uniformizadas socialmente, e o movimento de sempre. Dou uma olhada e adentro com minha maleta e meu jaleco no ombro, tiro meus óculos de sol e já percebo alguns olhares femininos. Vejo Andrea, que trabalha aqui desde que eu estava na graduação e vou direto cumprimentá-la. Ela sempre foi ótima comigo, sendo casada e mãe de duas menininhas lindas.  Me aproximo de Andrea e ela abre um sorriso genuíno.

-Doutor Diego, meu Deus, você está de volta. Que felicidade.- Me abraça com o carinho de sempre. Retribuo o abraço caloroso dela, notando as outras atendentes nos olhando com curiosidade. Diferente dos meus colegas, eu sempre evitei misturar as coisas no serviço. Sempre gostei de manter uma linha entre diversão e trabalho. 

-Andrea, quanto tempo, como estão as coisas por aqui?- Percebo que a atenção de Andrea vai para a porta quando ela ia começar a me responder.

-Espero um momento doutor, preciso falar com Ana Lara. - Vira-se para a porta e chama em voz alta e quase estupefada uma funcionária que já ia passando direto. Era loira, cabelo nos ombros, baixinha. Bem baixinha. E quando Andrea a chamou mais alto ela olhou para cima e veio com um sorriso no rosto.

E porra, que sorriso. Mas não era pra mim, era para Andrea.

Eu congelei ali no lugar, vendo ela se aproximar parecendo uma menininha, mas ao mesmo tempo...

- Ana Lara, Cassio já ligou aqui três vezes me perguntando de você.

-Mas eu só me atrasei por dois minutos...- Ela  responde com uma voz doce, meiga e chorosa. De repente parece notar minha presença, mesmo com meu tamanho dando dois dela em altura e largura.- Oh, bom dia doutor.

Aceno com a cabeça ao seu cumprimento e continuo a observar ela. Um rosto de anjo, olhos castanhos, boca em formato de coração que falava com Andrea como se eu não estivesse ali.

De repente percebi que eu estava ali, olhando para ela enquanto ela não me deu uma segunda olhada. Despediu-se de Andrea e andou meio correndo sem olhar para trás enquanto eu não conseguia tirar os olhos dela. Posso parecer um idiota arrogante mas não sou ruim de se olhar.

Volto meu olhar para Andrea e ela me olha com curiosidade. Me recomponho e pergunto com meu tom mais indiferente.

- Quem era a moça? - Porque eu simplesmente não resisti saber um pouco mais daquela meio metro. 

- Ana Lara. É a secretaria da Radiologia. Começou aqui na recepção do Pronto Atendimento e com um ano subiu para a Radiologia.

-Não me lembro dela... - Trabalhava com minha mãe, que é medica radiologista. 

-Ela começou logo que o senhor foi para Nova Iorque. Tem três anos aqui. Um amor de pessoa.

- Hum... - Respondo o mais indiferente possível.

- Doutor... eu não te avisaria se não fossemos próximos, mas é melhor não tentar um movimento. Ela é bem reservada e nunca saiu com ninguém do hospital. Nem porteiro, nem médico, e nem por falta de oportunidade. - Diz Andrea com um meio sorriso.

- Eu não preciso desse aviso, Andrea. Mande o primeiro paciente em cinco.

Saio sem esperar uma resposta. Seja lá o que Andrea pensou que viu em meu rosto esta enganada. Eu só fiquei curioso por ela agir de forma diferente do que estou acostumado e isso não e arrogância, é só um fato. Entro no meu consultório e esqueço de tudo ao olhar exatamente como deixei. Como se o tempo não houvesse passado. Era boa a sensação de pertencer.

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Na hora do almoço faço a troca do Camaro por um Porsche preto e discreto. Almoço e logo volto para meus pacientes. Por volta das 15:00 horas Guga bate na porta.

-Parada para um café? Ainda se lembra do Amadeu?- Pergunta Guga com meio corpo dentro do consultório, segurando a porta.

-Ah cara, seria ótimo. Deu uma acalmada no movimento, só vou avisar Andrea.

- Já avisei.- Diz Guga com o sorriso sacana.

Deixo o consultório e vamos para a lateral onde fica o Café do Amadeu. O lugar e um tipo de ponto do bate papo, aconchegante e acessível. Passei muito tempo lá com Guga e outros residentes. Era bom ver que isso também não mudou.

Ao entrar no lugar em uma mesa mais afastada vejo a loira de mais cedo. Ela esta focada em alguma leitura mas de onde eu estou não consigo ver do que se trata. Esta alheia a tudo que acontece ao redor, bebericando um suco com um canudo na boca que me faz ter pensamentos nada inocentes. Porra, só vi essa menina uma vez, ela nem é meu tipo e já estou tendo uma semi ereção por causa de um canudo. E ela esta alheia a isso também. 

Detalhe. Ela nem olhou para mim, diferente das outras mulheres na lanchonete. Penso em perguntar a Guga se ele a conhece mas ele logo responde minha pergunta ao falar alto o suficiente para que ela escutasse, enquanto nos encaminhávamos para o balcão de pedidos.

- Ana Lara minha linda, será hoje o meu dia de sorte?

A garota levanta os olhos com diversão e um sorriso.

- Você sabe que o problema não é você doutor, sou eu.- Responde em uma voz suave entre séria e divertida. Me pergunto se ela já ficou com Gustavo. Certamente que sim, eles pareciam ter intimidade. Fiquei um pouco incomodado. Gustavo não perdoa ninguém.

- Mais uma para a sua lista?- Perguntei assim que sentamos na nossa mesa com nosso café e pão de queijo, mesmo distante tinha uma boa vista do rosto dela.

- Ana Lara? - Ele cai na gargalhada e eu não consigo acompanhar então dou um sorriso forçado. - Não cara, pelo menos não por minha causa, pois se dependesse de mim eu até casava com ela.- Olhei assustado para ele.- Tudo bem, não casava, mas ai vai a verdade, Ana Lara é diferente. Chamei ela pra sair algumas vezes e ela sempre educadamente me recusou, logo sua recusa virou uma piada interna. 

 Arrisco uma olhada em sua direção e paraliso quando percebo que ela esta olhando diretamente para mim, meu coração falha uma batida. Que porra é essa?Me olha mais alguns segundos e abaixa a visão guardando suas coisas e se levantando. Eu simplesmente não consigo parar de olhar para ela. 

Suas maneiras comedidas, ela é pequena e parece ser suave em cada parte. Vejo que alguém fala com ela, dois rapazes na mesa de trás. Ela parece conhece-los porque sorri para o que quer que seja que eles dizem. E que sorriso.

 Um dos rapazes se levanta sorrindo e ela tenta se defender de alguma coisa, então ele bagunça seu cabelo como eu faço com Laura. Ela fica irritada, mas divertida e fingi jogar suco nele. Ela chama ele de Alexandre, acena um tchau meio irritado e vai para a porta sem olhar em qualquer direção. Quando volto meus olhos para Gustavo ele esta me olhando e se segurando para não rir.

- O que foi isso?- Ele pergunta rindo- Cara você precisava ver a sua cara. Que minha irmã não saiba que você está interessado em Ana Lara porque se não ela fará da vida da coitada um inferno.

- Não estou interessado em ninguém, nem conheço ela. E sua irmã não tem nada haver com  minha vida, Gustavo.

Ele faz uma cara de diversão e continua seu café.

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Tabom que não ficou mexido... eu aviso ou vocês avisam?

SEM CULPA - DEGUSTAÇÃOOnde histórias criam vida. Descubra agora