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Segunda-Feira

- Bom dia, rainha do vexame! - Lúcia veio correndo até mim assim que me avistou no campus 

- Mulher para de gritar - pedi 

- Ainda de ressaca? 

- Não, apenas com sono - sorri 

- Estudou? 

- Você sabe que não - revirei os olhos 

- Você deveria começar a ter mais responsabilidade com as coisas, Mari - Lúcia falou sério quando nos sentamos em uma das mesas do refeitório 

- Não começa com isso agora, amiga - respirei fundo e passei a mão pelos cabelos 

- É sério Mari saia da sua bolha 

- Eu sei que você está certa, tá? 

- Ah é? Então reconhece seus privilégios de seu pai conseguir bancar seus estudos e seus luxos? 

- É claro que reconheço 

- Então por que não se esforça? Cara existem várias pessoas na nossa turma que trabalham para bancar a faculdade, não tem tempo pra si, enquanto você...

- Enquanto eu fico de bunda pra cima o dia inteiro, eu sei disso, eu sei - interrompi ela - Olha não é como se eu fosse uma burguesinha filha de papais ricos, tá? Só conseguímos fazer com que meu pai pagasse meus estudos, pois minha mãe o ameaçou, ele nunca pagou sequer um mês de pensão pra mim durente minha vida inteira 

- Então isso muda o contexto? Não é um privilégio? 

- Aí sinceramente Lúcia as vezes não dá pra conversar com você - me levantei 

- Só estou querendo abrir seus olhos, querida. No mundo onde vivemos se você não for boa o suficiente está cortada 

- Eu sei 

- Então saía do seu comodismo 

         Eu não a respondi e saí do refeitório deixando minha amiga para trás. Sei que ela não está errada em nenhum aspecto, que sou irresponsável e que vou pagar por isso no futuro, mas eu me sinto estagnada, não sei o que estou fazendo. Lúcia por outro lado batalhou para estar aqui, depois de tentar por dois anos finalmente conseguiu uma vaga na federal. Sua mãe já idosa, recebe uma aposentadoria que cobre basicamente apenas o valor de seus remédios, por isso minha amiga trabalha algumas vezes por semana em um mercado durante a noite para ajudar a manter a casa e a se manter também. E mesmo com toda essa correria ela é uma das melhores da turma, enquanto eu com todo meu tempo livre sou apenas uma aluna na média e isso a incomoda muito.

- Perdida em seus pensamentos novamente, lindinha? - Lucas me acompanhou no corredor 

- Quando não estou, não é verdade? - rimos 

- Mulher, me conta sobre sexta, como você se resolveu com àquela menina? 

- Menina? - perguntei confusa 

- A do drink 

- Ah sim - passei a mão pelos cabelos - Eu lavei a camisa dela e foi só isso 

- Vocês chamaram a atenção do bar inteiro sabia? 

- Sinal de que a noite não estava boa o suficiente para vocês ficarem prestando atenção nas confusões dos outros - alfinetei 

- Hahaha como você é engraçada 

- Eu sei que sou, mas dá licencinha que agora eu tenho um teste para fazer, bebê. Beijos 

...

- Otávia, vamos almoçar comigo, por favor - fiz charminho 

- Olha eu te disse que não estou afim de comer, muito menos com você 

- Pronto... - revirei os olhos - O que eu fiz agora? Todo mundo resolveu ficar contra mim hoje?

- Olhe você consome a paciência de todas as pessoas ao seu redor, sabia?

- Se você me disser o que eu fiz, eu posso tentar me redimir 

- Que dia é hoje? - ela parou e ficou me encarando com os braços cruzados e cara de cachorrro raivoso 

Eu dei uma risadinha de bandido 

Olhei para os lados 

Remexi nos cabelos 

- Sinceramente como alguém pode ser tão esquecida assim??? Cadê o nosso trabalho de Ética? Você sabe que a gente tem que entregar ele até as 11:59 e tá aí com o horário da tarde livre, eu sei bem que você nem começou a editar...

- Como você sabe? - interrompi 

- Caramba você relata até quantas vezes defeca no twitter e não falou nada sobre o trabalho então você definitivamente esqueceu 

- P*rra - resmunguei 

Mas não por descontentamento dela estar me dando sermão, mas porque eu realmente tinha esquecido 

- Eu vou para casa - falei sério e me despedi da minha amiga com um beijo na bochecha 

...

Eu não fico chateada com minhas amigas por sempre terem palavras duras pra mim e quando eu digo sempre, é sempre mesmo. As vezes até eu mesma me vejo como uma criança crescida, sabe? Fugindo de responsabilidades, literalmente fazendo a sonsa e eu sei que tenho que parar com isso, a vida não é um parque de diversões, mas fazer o que velho se eu não posso ver um barzinho que já me imagino lá sentada naquela mesa amarela gritando "E ainda digo mais! Esta nem é a pior parte!" 

Mas acabou a brincadeira 

Só que eu realmente estou com fome agora e preciso comer 

De barriga vazia não há como ter ressaca moral.




Fora do contextoOnde histórias criam vida. Descubra agora