Capítulo 2

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Uma semana havia se passado desde o dia em que minha mãe "assumiu" o relacionamento com o Rogério. Matheus ainda estava bravo com tudo, mas estava começando a aceitar melhor. Acabei descobrindo que ele era só um ano mais velho que eu e que estudávamos em escolas próximas. 

Preciso dizer que à princípio achei que ele fosse somente um garoto irritante e egoísta, mas com o passar do tempo... Eu queria dizer que mudou alguma coisa, mas continuo achando isso. Rogério aparentemente achou que passar meu whatsapp para ele seria uma forma de fazer que a gente criasse algum tipo de laço e a ideia seria realmente boa se Matheus não fosse um pentelho.

Ele me mandava mensagens com memes durante a noite quando estava entediado, mesmo eu dizendo que não curtia (Talvez eu gostasse, mas não vindo as 1 da manhã durante minha leitura noturna), insistiu e segue até hoje mandando. Fora que vivia reclamando do quanto estava chato o dia. Pensei em parar de responder, mas era realmente importante para minha mãe que eu me desse bem com ele. Parei de pensar em Matheus ao chegar na escola, eu gostava de chegar mais cedo que o horário para poder entrar sem ter que passar pelo meio das pessoas, algo em ver os corredores vazios e silenciosos me acalmava. Pensar que em menos de 20 minutos outros estudantes estariam lotando aquele espaço e conversando alto sobre o que quer que tivessem feito no dia anterior era algo que não me deixava exatamente animada. Multidões nunca foram meu forte.Entrei na sala de aula, quinta-feira era dia de começar com redação, o terceiro ano estava quase aí e com ele as provas para faculdade, estar pronto para redação era o mínimo. Sentei numa carteira perto o suficiente da lousa para ficar longe da bagunça do fundão, mas longe o suficiente para que não fizessem algum comentário me chamando de 'nerd' ou algo idiota do tipo. Tirei meu material e peguei o livro "O Médico e o Monstro" de Robert Louis Stevenson, voltando para o momento do depoimento do médico Henry Jekyll sobre como ter se tornado alguém desprezível como Hyde por livre e espontânea vontade. Parei para pensar nisso e sinceramente não conseguia julgar o Dr. Jekyll, poderia mesmo chamá-lo de mal por, pelo menos uma vez na vida, querer viver sem ter que se forçar a ser bom o tempo todo? Sem ter que se preocupar com seu nome ou da sua família sendo sujo por algo que fez em um momento em que só se deixou levar? Sem ter que colocar as necessidades do outro acima das suas, ou mesmo os sentimentos?Ainda tomada por aquelas questões, a professora entrou na sala segundos antes do sinal tocar que foi seguido por 20 alunos entrando apressados na sala, a conversa que vinha alta ia morrendo aos poucos quando a professora se levantou para falar.


-Bom dia, Alunos. Imagino que todos tenham tido uma ótima semana com bastante inspiração para a produção textual. - Ela disse com uma voz que tentava passar uma animação que a mesma não tinha.


Dona Julieta era uma Sra. de 59 anos, seu cabelo liso e comprido grisalho estava preso em um coque perfeitamente arrumado, usava um óculos de aro redondo, uma camiseta azul marinho, uma calça social e sapatilhas. Sua pele era branca, devia ter pouco mais de 1,60 M, o rosto redondo e amável trazia consigo o cansaço de 35 anos lidando com adolescentes em sala de aula.


-Hoje iremos ter uma proposta de redação em dupla... -Ela fez uma pausa conforme os alunos começaram a comemorar e tentar formar duplas- ...As duplas serão interclasse, o que significa que irão fazer par com alguém de outra sala para essa aula.


A sala fez um som de decepção, o qual não acompanhei porque para mim não fazia diferença. Uma redação em dupla é uma péssima ideia quando se está estudando para um vestibular onde as provas são individuais. Por outro lado, ter uma opinião diferente da sua pode te ajudar a construir melhores argumentos o que por agora seria ótimo.

Choro da Meia-NoiteOnde histórias criam vida. Descubra agora