Do lado de dentro do banheiro era possível escutar o som abafado da multidão que circulava pelo aeroporto, enquanto Clara apontava uma tesoura para Lorenzo serenamente deixando o rapaz confuso. A loira insistiu até Lorenzo aceitasse segurar o objeto ainda cheio de duvidas, em seguida se virou para o espelho a sua frente com os olhos fechados e soltou o rabo de cavalo que era preso por um elástico fino, enquanto pessoas entravam e saiam do banheiro.
- Corte. - Um leve sorriso de satisfação passou brevemente por seu rosto enquanto dizia aquilo.
- Eu? Por que? - Sua atenção se dividia entre a tesoura em sua mão, o longo cabelo a sua frente e o rosto da loira refletido no espelho.
- Sim. Eu não posso me olhar no espelho, isso seria um desastre. Anda logo!
- O único cabelo que eu já cortei em toda a minha vida foi o meu. Eu é quem vai fazer um desastre aqui! - Exclamou.
- Tudo bem, eu gosto seu corte de cabelo, pode fazer igual. - Sorriu novamente. - Agora para de enrolar e corta logo, nós temos coisas mais importantes pra fazer.
Lorenzo respirou fundo e lentamente cortou algumas mechas ainda estranhando a situação, quando o cabelo que antes batia na cintura da loira ficou na altura de seus ombros o jovem já estava acostumado com o som e a sensação de manusear o objeto. Clara continuou com os olhos fechados durante todo o processo, mas uma sensação estranha aqueceu seu peito enquanto tentava se imaginar com aquele corte de cabelo, andando como uma pessoa comum pelas ruas de Paris, mesmo mudando, sempre que pisava naquela cidade o sentimento de ser alguém ordinária a encontrava, e essa sem duvidas era a melhor coisa que sentia dentre todas as outras pequenas felicidades de sua vida. Seu coração quase saiu pela boca quando Arisha a acordou e a levou as pressas para o aeroporto lhe dando documentos novos e as passagens para Paris, não podia lembrar da ultima vez que esteve tão feliz.
- Seis, esse seu amigo... - Lorenzo hesitou.
- Continue
- Você já entrou na mente dele, certo?
- Sim, isso é um fato.
- Você é telepata também?
- Ah, entendi... Eu tentei, tá bom? Venho tentando usar a telepatia pra falar com ele desde que voltamos para aquele lugar, mas Tau não me responde. - Mordeu o lábio inferior e deu um suspiro pesado.
- Logo vamos descobrir o motivo, não se preocupe.
Lorenzo pediu para que Clara se virasse para que ele pudesse admirar o seu trabalho, o rapaz não conseguiu conter o sorriso que nasceu em seu rosto quando percebeu que não importava o que Clara fizesse com seu cabelo isso definitivamente não mudaria a forma única de sua beleza. A loira perguntou impaciente se já havia terminado e com a resposta positiva de Lorenzo ela o arrastou para fora do banheiro unissex segurando as malas quase vazias e caminhando firmemente para fora do aeroporto. O dinheiro que tinham mal deu para o taxi, Clara decidiu ir ao restaurante onde conheceu o amigo, antes de encontrar Tau pois queria se prevenir.- pelo menos foi isso o que ela disse para Lorenzo. Entrou pelos fundos do estabelecimento onde deixou escondida perto da lata de lixo uma chave para emergências. Ao descer as escadas e abrir a porta do que um dia fora seu quarto ela não viu nada mais do que uma dispensa, sacos de todos os tipos de alimentos que era usados para preparar as mais deliciosas comidas daquele lugar.
Clara encarrou o lugar em silencio por um tempo enquanto Lorenzo aguardava confuso uma explicação da loira a sua frente, mas ela apenas se virou, fechou a porta e subiu as escadas sem dizer nenhuma palavra. Era uma manhã de um dia de semana, o restaurante estava fechado e Clara aproveitou para visitar o balcão do local, passou a mão por de baixo do mesmo e tirou de lá um revolver. Entregou nas mãos de Lorenzo que só conseguia observa-la calado, sentia que se dissesse algo aquela situação deixaria de ser tão mirabolante e se tornaria apenas algo perdidamente estupido, afinal, quem usaria um revolver quando se tem habilidades tão convenientes como as deles? Então ele apenas a seguiu e obedeceu quando ela mandou que não olhasse e nem falasse com ninguém até chegarem na casa de Tau.
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Não Olhe Em Seus Olhos
Science FictionSeis crianças que vivem como cobaias por causa de suas capacidades sobre humanas, vêem suas perspectivas mudarem absurdamente quando uma delas é induzida a se rebelar. Dez anos se passam após as crianças serem separadas. Suas vidas tomam rumos compl...