Capítulo 1

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O que eu vou contar aconteceu quando a praga provocada pelo corona vírus, após se espalhar pelo mundo, chegou às aldeias indígenas do Mato Grosso do Sul. É uma história que traz esperança, pois fala de como, através de um guarda-roupa velho, três crianças indígenas da Aldeia Jaguapiru chegaram em terras longínquas e desconhecidas e viveram a maior aventura de suas vidas, para salvarem sua avó centenária acometida pelo vírus.

Naqueles dias as crianças não estavam indo às escolas, por causa do contágio – era o que se dizia –, por isso elas estavam aprontando só em suas casas mesmo. Mas a intenção era enlouquecer qualquer um com quem convivessem, mas principalmente as suas mães – e ninguém tinha dúvidas quanto a isso.

Nesse tempo, vivia na Aldeia indígena Jaguapiru uma garota da etnia Kaiowá chamada Açucena – palavra que significa flor branca. Ela não morava em uma oca. Mesmo porque, esse tipo de habitação era coisa rara por aquelas bandas. Sua casa era de material, como se dizia, ou seja, de tijolos e coberta de telha tipo Eternit. Uma casa pequena compartilhada ainda com sua mãe, seu pai e seu irmãozinho de seis anos Kaluanã, chamado por todos de Kalu.

Em uma manhã Açucena estava no quintal quando viu chegar por ali um garoto. Ela se assustou um pouco porque ele chegou muito de repente e as pessoas não estavam assim, por se dizer, frequentando a casa dos outros. As palavras mais repetidas nos últimos meses, e que eram a principal recomendação era: FIQUE EM CASA! Então não era de se esperar que alguém surgisse, assim do nada, no seu quintal.

O menino parecia ter a mesma idade dela e quando ela olhou bem, pareceu se lembrar dele de algum lugar, só não sabia de onde.

— Oi — disse Açucena, para não parecer mal-educada.

— Oi — ele disse. — Você mora aqui?

— Sim — ela disse notando que ele tinha uma vasilha na mão.

— Minha tia me mandou perguntar se vocês não têm um pouco de açúcar para arrumar. É só até ela receber na semana que vem. Então ela devolve.

— Quem é sua tia? — perguntou açucena. Ela nunca tinha visto aquele menino e não tinha a menor ideia de quem ele era sobrinho.

— Irani. Ela mora bem ali — ele disse mostrando a casa mais próxima. 

— Ah! Sim. — respondeu Açucena. — Eu sei quem é ela. Só acho que não conheço você.

— Então. É por causa da covid, sabe. Minha mãe pegou a doença no frigorífero onde trabalhava. Ela não sabia que tinha pegado e transmitiu a doença para quase todo mundo lá em casa: meu pai, minha avó e minha bisavó. Só eu não peguei. O pessoal da saúde levou eles lá para o hospital da Missão, para onde estão sendo levados os contaminados da aldeia. Daí decidiram me deixar com minha tia e meu tio. Tive que ficar uma semana só dentro do quarto, mas agora fiz outro exame e estou liberado.

— Nossa! Eu não sabia. Que bom que você está bem. Como é mesmo o seu nome?

— Ítalo.

— Ítalo, vou pegar o açúcar pra você.

Foi assim que Açucena e Ítalo se conheceram. Eles não tinham consciência disso, mas a praga estava só começando. E como ninguém podia ir a lugar nenhum, passaram a se ver todos os dias no quintal. E logo o irmão de Açucena, Kalu, junto com o cachorro da família, o Thor, estavam integrados com eles nas brincadeiras.

  

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O último valeOnde histórias criam vida. Descubra agora