Três dias depois, Elisa estava em seus aposentos, ajeitando os fios encaracolados de suas longas madeixas negras, testando vários penteados frente ao espelho. Suspirou frustrada e entediada, saindo pelo corredor. Não havia mais o que fazer naquela casa.
Ao chegar à beira da escada, pôde visualizar o piso inferior. Vicent estava parado frente à porta, recepcionando a visita. Elisa sentiu uma imensa vontade de refazer o caminho de volta ao quarto, mas não podia adiar aquele momento para sempre.
Quando desceu os degraus e seus passos ecoaram pela sala, a atenção de ambos se voltou a ela.
— Srta. Scarioth! Iria chamá-la agora mesmo.
— Sem problemas, Vicent! — respondeu aproximando-se do homem e da mulher — Pode nos deixar a sós, por favor.
Ele apenas assentiu e retirou-se.
Estavam um tanto constrangidas e sem jeito, não sabiam o que dizer uma à outra. Talvez estivessem tentando juntar forças dentro de si mesmas para iniciar um diálogo. Enquanto Elisa evitava os olhos azuis, reparou nas pétalas roxas e amarelas que estavam no pequeno buquê.
— Eu sei que está confusa. Eu compreendo, por isso me mantive distante por alguns dias, mas não quero que se afaste. Eu gosto de você, Elisa, e estes dias sem vê-la, sem saber o que se passa em sua mente, estão atormentando-me.
A morena cedeu, cruzando íris castanhas com as azuis. Sentiu uma fraqueza, mas prosseguiu em seu ato de intrepidez.
— Me perdoe, eu precisava pôr os pensamentos em ordem. Eu também gosto de você, Alessia. Não posso lhe garantir que de fato consegui entender o que está acontecendo, mas eu quero.
— Você não precisa entender. Só precisa sentir, Elisa.
As duas ficaram em silêncio, os lábios da loira estavam retos e contraídos, suas sobrancelhas levemente franzidas, quase como uma súplica, mas o brilho das órbitas expressava um fundo de esperança enquanto entregava as flores para a jovem à sua frente.
Elisa as segurou, examinando melhor e observando suas cores. Sentiu a textura aveludada sob as pontas dos dedos e imaginou qual era seu significado. Não eram as clássicas brancas, então supôs que haviam sido escolhidas por algum motivo.
— O que significam?
— O coração é misterioso.
"De fato". O pensamento fora mútuo, mas nenhuma o exprimiu.
— Quero que venha comigo conhecer um lugar — disse Alessia
— Que lugar?
— Descobrirá quando chegarmos — a loira lhe dirigiu um sorriso junto à uma piscadela e Elisa fez uma expressão desconfiada, mas aceitou.
A morena deixou o buquê sobre a mesa e as duas partiram na carruagem que as esperava ao lado de fora. Ficaram em silêncio durante a maior parte do tempo, enquanto a moça dos olhos cor de café observava o caminho, em uma tentativa falha de identificar para onde iam.
A carruagem as deixou em um bairro que Elisa tinha certeza de que nunca estivera antes.
— Onde estamos?
— Soho.
O sorriso de Alessia estava radiante quando ela pegou em sua mão, guiando-a rapidamente, entrando e saindo de várias ruas até chegar em uma pouco movimentada. Entraram em um pequeno edifício, subindo pelas escadas estreitas que chegaram em uma porta escura. A loira tocou a campainha e logo puderam ouvir uma voz feminina:
— Pois não?!
— Estamos aqui para a hora do chá.
A face de Elisa imediatamente demonstrou sua confusão, encarando a moça ao seu lado, que apenas apertou sua mão, pouco antes da entrada ser aberta, revelando uma jovem mulher de cabelos e olhos castanhos claros, usava calças semelhantes às do dia em que Elisa havia reencontrado a loira, seu sorriso se alargou ao ver a jovem que imediatamente abraçou.
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Dois Corações
RomanceA última década do século XIX acaba sendo um tanto conturbada para a jovem Elisa, que ao retornar à Londres após 6 anos, se vê apaixonada por não apenas uma, mas duas pessoas completamente diferentes, uma mulher e um homem escocês com um passado atr...