Capítulo V

89 23 125
                                    


Passei a noite em claro, apenas pensando sobre o que a Mesa vai estar conversando na próxima reunião, que será daqui a dois dias e o que é este Movimento, que pode estar em ação agora mesmo.
Então comecei a pensar em formas de descobrir quem são os líderes do Movimento. Talvez descobrindo os nomes dos revolucionários que foram punidos com a morte, e quem são seus parentes vivos hoje, e isso é fácil porque estão nos arquivos da área de segurança, e dessa porta eu tenho a chave, já que quando comecei me enxotaram para arrumar esses arquivos, então faço uma nota mental. Faço outra nota, para ficar de olho no computador do meu pai, e assim que ele der uma brecha eu preciso olhar e ver o que a Mesa anda fazendo. Outra nota mental para conversar com Filipe, afinal ele é um Gênio e enquanto eu estava preocupada com minha falta de habilidade há 5 anos, ele com certeza estava bem atento aos acontecimentos.


Assim que tenho um tempo no trabalho, vou para a sala dos arquivos e me tranco lá, as pessoas não vão muito ali, mas é melhor prevenir. Lembro de arrumar duas caixas inteiras com a etiqueta de “Rebelião”, eles foram bem discretos com o nome, vai ser fácil.

Parece que aconteceram muito mais do que uma rebelião ao longo desses trezentos anos. A primeira foi quando decretaram a pena de Adam Heinrich, o primeiro empático, ao que parece o Vale não reagiu bem a morte do candidato a Eleito. Candidato a Eleito? Minha mãe não citou isso ao falar dele, estranho. Por que eles seriam tão radicais com um candidato a Eleito, um dos membros da Mesa, quando eles são tão coniventes uns com os outros? Será que a Mesa não queria Adam como Eleito? O que é obvio que ia acontecer, já que sua morte gerou uma rebelião. Bem, isso não importa mais, e o que eu estou procurando é bem mais recente.

Finalmente encontrei os arquivos do ano 3295. Nomes, preciso dos nomes. Aqui estão: Danieli Lacan, Giliard Souza, Hamilton Engels, Inácio da Silva, Jaqueline Murilo, Julio Machado, Luciane Marshall, Luzia Engels, Thomas Diderot, Vladimir Paz. Alguns sobrenomes aqui não me são estranhos. Começo a procurar as fichas individuais. Não tem nada, mas quando eu arrumei estavam aqui, tenho certeza. De qualquer forma anoto em minha agenda os nomes.

- Engels, é claro.

- O que tem eu? – Vitor me dá um susto e eu quase derrubo a prateleira de arquivos.

- Você é louco? Me deu um susto - ele encara minha agenda.

- O que tem ai? – um esboço de sorriso convencido começa a surgir. – Não me diga que veio atrás da minha ficha, veio? Se você está tão interessada é só perguntar. Só não posso prometer um casamento, você sabe né, eu sou Dualista e você é… afinal, você é Curandeira? – a facilidade com que ele me irritava era absurda.

- Que tal você se meter na sua vida, Engels?

- Isso, exatamente. Por que estava falando o meu nome mesmo?

- Não estava falando o seu nome – infelizmente o fato de eu saber atuar muito bem, não vai funcionar com um Dualista.

- Hum, e eu não sei que você está mentindo, né? Pode falar – talvez seja mais fácil tocar na ferida, o assunto dos pais ainda está recente.

- Vi o nome dos seus pais em um arquivo e demorei a associar a você. Luzia e Hamilton Engels, certo? – cutucando uma fera ferida, é assim que me sinto.

- Por que você estava mexendo no arquivo dos meus pais? – ele estava irritado.

- No caso, não estava. Eles não estão mais aqui Vitor, e isso é um pouco estranho, não acha? – porque eu acho. No Vale, a política é de registrar absolutamente tudo, e os arquivos nunca são jogados fora, tanto que encontrei a ficha do Adam.

- Não. Meus pais eram Revolucionários, acho normal que eles tenham mandado para o lixo essas fichas.

- Então porque mandariam fazer agora? Há dois anos essas fichas ainda estavam aqui, eu arrumei. E mais ninguém entra aqui, Vitor.

- Por que você quer tanto saber? – agora é o momento que eu vou embora, porque não tem como mentir para ele.

- Não é da sua conta - ou talvez seja.

- Ou talvez seja, não? – às vezes parace que eles lêem mentes.

Passei por ele e acabei esbarrando em seu ombro, já que ele estava tão próximo. Mas tive uma sensação muito estranha, algo como medo e, acho, interesse, não sei explicar.

- O que foi, Sara? – olhei para trás quando ouvi meu nome, é difícil ele me chamar pelo nome.

- Nada – a sensação não me deixava.

- Tá tudo bem? Você vai vomitar? Parece – irritante. Mas talvez eu quisesse vomitar.

- Não. É melhor eu voltar ao trabalho, e você também, aposto que você ainda tem muitos casos para analisar, não? – ele sorriu.

- Até mais, Sara – ele passou por mim e pude sentir o cheiro amadeirado de seu perfume, era agradável.


Estava intrigada com a sensação que tive quando esbarrei em Vitor, eu fiquei com medo e interessada? Absolutamente não. Do que eu teria medo? Dele? Não. Das fichas que sumiram? Também não, apesar de isso estar parecendo bem estranho.

- Mariele?

- Presente – sempre com uma caneta na boca.

- Você deveria parar com essa mania, imagina quantas bactérias não têm na sua boca neste momento? – insinuei com a sobrancelha.

-Eca, que nojo. Você tem razão – comecei a rir da sua reação.

- Mariele, eu queria saber uma coisa – ela fez um gesto positivo com a cabeça. - As fichas que ficam guardadas nos arquivos são jogadas fora?

- Você trabalhou nos arquivos, sabe que não.

-Então isso nunca aconteceu?

- Não aqui na Ala de Inteligência, pelo menos. E se algum documento for retirado é preciso ter um registro também. Mas não jogado fora.

- Um registro, onde?

- Se for na área de segurança, comigo, no meu computador. Sempre com os líderes da área. Por que a curiosidade? - parou de digitar e voltou a olhar para mim. Mais uma dualista.

- Curiosidade – isso basta, porque é verdade.

- Só curiosidade?

- Também faz parte do meu trabalho, né? Acho que preciso entender melhor este lugar – isso com certeza é verdade.

- Bom, se precisar de mim, é só perguntar. Ah, e para matar sua curiosidade, alguns documentos foram retirados semana passada – não dá mesmo para enganar os Dualistas.

- Quais documentos?

- Você sabe quais, não sabe?

- Quem pegou, Mariele?

- Essa informação eu não posso dar – voltou a me olhar.

- Alguém da Mesa? – voltou a digitar. O que eu interpreto como um provável sim.

E ai as coisas ficaram mais estranhas. E se quem veio pegar esses documentos foi o Burke? Será que suas políticas extremas têm a ver com os Revolucionários? A Mesa também desconfia de um Movimento? Provavelmente, a Mesa é composta por Gênios e um deles é o Paulo, que trabalha na Ala de Agricultura, com o Marcus e a Michele. Eu não devo ter sido a única a presenciar conversas intrigantes. Quantos passos à frente a Mesa estava? Isso me parecia perigoso. Nunca fui fã das políticas extremistas da Mesa, políticas punitivas.

Pandora categoria 5Onde histórias criam vida. Descubra agora