IV - Casos de Família

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- Ah, mas que mer

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- Ah, mas que mer...

Inferno. Essa é a palavra que eu usaria para descrever minha semana. Não bastasse o vexame essa manhã com o vizinho, eu terminei de atolar o pé na merda de vez. Literalmente. Lá se vai meu all star amarelo favorito. Eu olho em volta, procurando algo com que eu possa limpar meu tênis na saída do supermercado enquanto me equilibro com trocentas sacolas num final de tarde de sabádo. Qual deve ser o tamanho do cachorro para ele conseguir fazer uma bosta tão grande?

Deve ser do mesmo porte do Daniel.

Não consigo acreditar que desperdicei quatro dos meus preciosos anos com esse cara. E pensar que estávamos até planejando noivar. Patético. Eu nunca iria imaginar que convidar a Natasha para almoçar me levaria a ter futuras dificuldades de passar pelas portas. Isso mesmo, eu ouvi o berrante. Agora eu abaixo a cabeça e passo de lado para não bater a galha nos batentes. Não que exista um manual de como trair sua namorada, mas acredito que se existisse, a primeira regra seria trancar a porta. É claro, eu tinha a chave, mas pelo menos fizesse um esforço, poxa.

Lá estava eu na quarta-feira a tarde, de pé na calçada esperando a Nat. Tínhamos acabado de almoçar no nosso PF favorito e, quando chegamos na esquina, ela percebeu que tinha esquecido sua jaqueta no restaurante e voltou para buscar. Estava mandando uma mensagem para Manuela quando a buzina de um carro me fez olhar para frente. Foi assim sem querer que avistei o meu - até então denominado - namorado, saindo de um edifício do outro lado da avenida, com um buquê nas mãos.  Rosas, que romântico. Ele deve estar mesmo empolgado para sábado. Nada estranho até então, uma vez que ele trabalha num escritório ali perto.

Na verdade, eu deveria ter desconfiado que o buquê não era para mim, uma vez que ele só me deu flores duas vezes em todos esses anos de namoro: no nosso primeiro encontro - "where is my flowers?"; e outra no dia dos namorados, três anos atrás. E, se tais fatos não fossem suficientes, creio que ele entregando as rosas para uma loira parada na frente da vitrine de uma loja de vestidos a alguns metros de onde eu estava poderiam confirmar minhas suposições.

Apesar de não conseguir ver seu rosto, ela me parecia estranhamente familiar. Ele a abraçou logo após entregar as rosas - espero que tenha abelhas -, não deixando dúvidas sobre a existência de certa intimidade entre eles. Eu estava chocada, para dizer o mínimo. De todos os meus relacionamentos, o Daniel foi o mais longo. Desde sempre atencioso, me apoiando em todos os meus projetos e em todas as minhas crises. Não vou dizer que ele era perfeito, ou que nosso relacionamento era de tal forma, mas havia confiança um no outro. Ou assim eu pensava.

Eu continuei os observando, sem conseguir desviar meu olhar. Onde eu já vi essa garota antes? De repente, um ônibus passou na minha frente, bloqueando a visão no exato momento em que ela virava o rosto, mas não rápido o suficiente para que a perdesse de perfil. Sofia. Uma onda de alívio me atingiu direto no peito, e eu suspirei sem nem ao menos perceber que segurava a respiração. Que pessoa horrível você, Hana. Sofia é alérgica a abelhas, criatura!

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