O Garoto da Live

3. Olhos Brilhantes

Jelle Albuquerque

Era visível a alegria da minha mãe ao me ver. Eu estava sim, muito feliz de vê-la, senti falta dela e do meu pai, mas não entendo a necessidade de fazer um jantar com pessoas que eu nem conheço para comemorar a minha volta. Por que não poderíamos sair só nós 3?

Faz 4 dias que cheguei de New York, mas pretendia voltar logo. Foram 4 anos morando fora, me acostumei, é como parte de mim. Fiz todo meu ensino médio lá, voltar para o Brasil, de princípio, foi bem estranho.

Quando eu cheguei, a primeira coisa que procurei foi a igreja, uma das coisas que mais senti saudade. De cara, um tal de Matteu me perguntou se eu queria participar da live, para ser sincero, tenho experiência em mexer com câmera, aceitei. Logo ele me escalou no Guimbal da quarta, me deu um breve resumo de como funcionava e passou os horários.

São exatamente 18:45, tenho de sair daqui 15 minutos pra chegar no horário, não posso atrasar no primeiro dia. Estou com uma calça preta jeans, e uma camiseta UV preta também, nos pés um coturno na mesma cor, e no pescoço minha corrente. Termino de me ajeita e pego a chave do carro.

-Tchau mãe, tchau pai! Até mais tarde-beijo o rosto deles e saio de casa
-Vai com Deus! Até mais tarde-escuto a mesma gritar

Entro no meu carro e dirijo em direção a igreja, lembrando das milhões de coisas que tenho que resolver essa semana. Enquanto estava parada do semáforo meu celular toca, atendo e conecto com o carro.

Ligação on;

M:Olha só quem resolveu me atender!
-Tinha que dar atenção pro meu nego preferido
M:Tá de bom humor hoje gatinho? Nem parece aquele cavalo com quem eu moro
-Brasil me traz uma vibe boa
M:por falar nisso, arrumei as últimas coisas do meu passaporte hoje, acho que semana que vem ele chega. Nós veremos logo, hermanito.
-Eu passei 4 anos com você, qual a dificuldade de me deixar em paz por um mês?
M:Assim você me machuca! Mudando de assunto, chegou algo no seu e-mail?
J:Ainda não, as matrículas começaram essa semana
M:Chegou uma coisa aqui em casa da NYU
-Já?
M:Bom, o diretor era seu fã e estudou lá, e ainda te deu 2 cartas de recomendação. Você tá com moral
-Bom...ainda assim espero as outras chegarem, mandei pra Oxford, Stanford e Harvard. De qualquer maneira, pretendo voltar somente no final do ano, ou no começo do ano que vem
M:6 meses sem você meu amor? Aí meu coração
-Para de ser gay! Você podia vir passar o natal e o ano novo aqui, ou pretende ir para o México?
M:minha mãe quer ir para Barcelona ver meu pai, é meio estranho eles continuarem tão amigos mesmo depois do divórcio. Não tô afim de ir, acho que vou pra aí daqui duas semanas, e vou de novo no natal, sempre quis conhecer o Brasil
-Isso se chama maturidade. Vem mesmo, você vai amar, vou pedir pra que minha mãe preparar seu quarto, me informe o dia que você vem, eu te busco no aeroporto. Mas me diz, conseguiu resolver oque eu te pedi? O garoto tá bem?
M:e tem alguém melhor do que pra isso? Claro que sim, a casa é nossa. Tudo nos conformes, já comecei a mudança, não vou mexer no seu quarto, essa parte é sua. Tive que enfrentar uma belíssima burocracia, mas eu tenho meus contatos. Ele tá bem, vai viajar com Rose esse semana, só volta no mês que vem
-Perfeito. A divisão dos gastos continua a mesma
M:Com certeza
-Preciso desligar, me mantenha informado caso tenha alguma intercorrência, e me diga se mais alguma universidade mandar alguma carta
M:Ok

Ligação Off;

Mical era de longe, meu melhor amigo dos Estados Unidos. Tínhamos nosso grupo, mas eu morava com ele desde os meus 16 anos. Ambos aprendemos, de forma dolorosa, que não devemos confiar em todo mundo, nem naqueles que convivem conosco.