VI

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Gustav mantinha os pés sobre sua mesa e encarava o lento ventilador de teto enquanto ponderava sobre seu breve encontro do Perséfone. A mulher dos chapéus elegantes parecia uma madrasta nova de alguma novela mexicana cheia de sentimentos dramáticos e explosivos, mas nem por isso menos bonita. A parte da beleza ela possuía, mas a dos sentimentos estava longe. A ruiva falava tão fria e pausadamente que o jovem se questionava se aquilo fora uma ameaça ou só uma conversa normal. Era algo a se pensar.

De repete a porta principal foi escancarada e o bonito mas irritante Detetive Arcos entrou ofegante na sala. Bem que Gustav ouviu um carro mesmo. Matteo checou rapidamente o espaço antes de encarar o outro. Gustav fechou a cara. Aqueles fofoqueiros. Ele tinha visto os dois idiotas todo atrapalhados no celular, mas jamais chegou a imaginar que a estupidez tinha levado eles a ligar para o detetive. Aparentemente Gustav teria que cumprir a promessa feita na semana passada para que algum tipo de respeito se estabelecesse naquele desmanche.

— Isso é uma propriedade privada, saia. — pediu tentando manter a civilidade. O outro não merecia, claro.

— Onde está a mulher? — o detetive se aproximou e guardou o revólver no coldre.

Gustav teve que segurar o súbito riso que surgiu em decorrência da cena. Era hilário que o detetive estivesse entrando esbaforido na sala a procura de uma mulher como um marido traído.

— Não sei do que está falando. — respondeu friamente depois de engolir o riso.

— Não estou brincando, Gustav. — ele por fim chegou na frente da mesa. O peito subia e descia irregular por causa da pressa, sem nenhum sobretudo dessa vez. Os cabelos pretos e curtos estavam bagunçados e os olhos, febris. O jovem queria aquela imagem, mas em outro contexto.

— Eu muito menos. — guardou o papel dado por Perséfone na primeira gaveta. — Agora, detetive, a menos que tenha um mandado, por favor, retire-se. — iria se fazer de difícil sim.

O Detetive Arcos o ignorou e checou o esconderijo por dentro e por fora antes de voltar para a sala. Ouviu ele dizer qualquer coisa para Matão e Pigmeu nesse meio tempo.

— Vim te buscar. — disse sem mais nem menos. — Arrume suas coisas, você vai pra delegacia comigo.

Gustav demorou um pouco para processar a informação.

— Perdão?

Matteo deu a volta na mesa e parou na frente do jovem.

— Vamos, Gustav, coopere. — franziu o cenho. — Aqui não é seguro.

— Matteo, eu não sei que tipo de droga você usou, mas funcionou. — quando o outro não saiu do lugar o jovem persistiu. — Eu? Na delegacia? Você está louco se acha que eu vou abandonar minha suada liberdade para ficar atrás das grades.

— Não vim te prender.

O jovem conteve uma resposta malícia.

— Mas vai se continuar me perturbando. Tentativa de assassinato. Agora vaza. — apontou para a porta.

O detetive inspirou fundo. Pareceu contar até três. Ele o olhava determinado. Segurou uma das mãos do jovem e o puxou para uma pequena porta quase escondida na parede direita. Entrou no quarto improvisado e deixou o menino sentado na cama antes de virar-se para o pequeno guarda roupa. Abriu e começou a retirar tudo.

Gustav fechou a cara e cruzou os braços.

— Não adianta. — protestou. — Eu não vou.

— Os Barões virão atrás de você. — retrucou sem nem olhá-lo e jogou as roupas na cama. — É perigoso.

— Eu sei me cuidar.

— Com aqueles dois idiotas? Ah, duvido. — balançou a cabeça abrindo as gavetas.

Irritado, o jovem levantou-se e voltou a guardar as roupas a medida que o outro tirava de lá.

— Eu não vou neste caralho. — disse pausadamente jogando as roupas de qualquer jeito dentro do guarda roupa.

— Gustav, não teste a minha paciência. — o impediu de continuar. — Você vai comigo nem que seja amarrado.

— Ah, seria uma proposta interessante se eu não estivesse puto. — admitiu. — Não tem alguma lei que diz que eu não sou obrigado a ir? — não deixou o detetive continuar. — Exatamente. Sai, sai.

— Não vou deixar você se matar. — Matteo não moveu-se um centímetro.

— Como se você se importasse, detetive, não é comigo que está preocupado. É com a sua consciência.

O jovem conseguiu deixar o detetive sem palavras pro algum tempo.

— Eu prometi ao seu pai...

— O que? — interrompeu, estressado demais para aquela conversa. — O que prometeu? — apontou o indicador no peito dele. — Que ia me comer debaixo do nariz dele? Porque foi isso que você fez. — provocou, ácido.

Matteo deu um passo para trás e engoliu a seco.

— Eu não me orgulho disso. — disse por fim.

— Eu estou pouco me fodendo pra você. — rebateu e deu mais um passo.

Matteo balançou a cabeça e desviou os olhos.

— Se... se ao invés da delegacia, nós formos pra minha casa, você vai de bom grado? — perguntou cauteloso, queria tirar o foco daquela conversa.

— Eu não vou pra lugar nenhum. — voltou a guardar as roupas.

— Gustav, seja razoável. Você sabe que é mais seguro na minha casa. Não vou te levar pra delegacia. — apelava para o bom senso do rapaz. — Só até a poeira baixar. Eu prometi ao seu pai que ficaria de olho em você.

Segurou o braço dele novamente.

— Matteo, quem tem dívida com o velho é você. — soltou um sorriso maldoso e viu o outro fechar os olhos. — Quem sente remorso por ter transado naquela noite é você, e só você.

O detetive voltou a abrir os olhos e encarou o outro.

— Eu penso nisso o tempo todo. — segredou com um olhar tão penetrante que Gustav sentia que não podia se mover. — Não sai da minha cabeça.

— Meu pai?

— Você. Aquele dia. — corrigiu com uma voz absoluta.

O jovem sentiu calafrios descerem a espinha e uma resposta podia aparecer entre suas pernas.

— Mentiroso. — murmurou baixando a guarda.

Gustav deslizou os olhos para o guarda roupa. Puxou uma bolsa de acampamento lá do fundo e jogou para o detetive, depois começou a socar roupas lá dentro. Não disseram mais nada.

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