Ídolo Chamuscado II

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Eu tento não me mover muito embaixo da cama, mas é inevitável dar uma ou outra respirada profunda para acalmar o coração acelerado. Os segundos passam e não ouço os passos de Edimar, que a esse ponto já deveria estar deambulando por aqui. Talvez não consiga descer as escadas com a perna inchada? É possível... Também é possível que ele esteja descendo as escadas de maneira lenta e cuidadosa. Eu poderia aproveitar isso para sair correndo, mas, com a perna dolorida, vou terminar morrendo de tanto rolar pelos degraus. Posso até quebrar a perna no processo.

Punc... punc... Os passos dele começam a soar.

Ouço-o assoviar fiu fiu fiu.

— Cachorrinho? — canta num sussurro suave. — Cadê você, cachorrinho? Vem brincar, vem... Deixa eu rasgar a tua goela...

Punc... punc... punc... Seus passos soam mais altos, indicando proximidade. Punc... punc... punc... Está rondando pelo corredor. Brarc! Um som de impacto me faz arquejar de susto. Brarc! Brórrrrr! Deve estar arrombando uma porta com a barra de ferro. Se ele vai procurar por todos os quartos, não vai hesitar em olhar embaixo de todas as camas. Não é seguro eu ficar aqui.

Arrasto-me para fora da cama e me levanto. Vejo tudo como se estivesse de olhos fechados. O único móvel visível aqui é a cama, que tem um forro de tecido vermelho e brilhoso todo amassado, com os travesseiros brancos manchados com respingos de sangue. Arrasto lentamente os pés na direção da saída. Ao encontrá-la, paro um passo antes de me expor no corredor. Inclino a cabeça para olhar afora. À esquerda estão as escadas de onde vim. À direita está o corredor mergulhado em preto.

Avisto uma porta de madeira despedaçada na segunda porta do outro corredor, exatamente na minha direção nordeste. É lá que o Edimar está. Os segundos passam e nenhum som é emitido por aquele quarto. Está mais silencioso do que deveria. Nenhum som de passos ou de objetos sendo revirados. Nem parece que Edimar está por aqui. Pode estar tentando me enganar para me fazer baixar a guarda... Não... Do jeito que está louco, não acho que ele tenha essa esperteza. Pelo menos a minha perna já está um pouco melhor, agora. Se ele me vir, posso dar uma corrida para despistá-lo.

Saio para o corredor, caminhando passos lentos pelo corredor. Detenho os passos, prestes a me expor frente à entrada para o quarto onde Edimar entrou. Inclino a cabeça e observo o interior escuro, que está totalmente vazio. Em cima da cama ao fundo, de forro rosa e brilhoso, vejo as minhas roupas amassadas em cima: minha camisa preta, meu calção jeans azul, meu tênis brancos, até a minha cueca amarela está lá. Rodo os olhos por toda a escuridão do quarto e não avisto qualquer sinal da presença de Edimar. Parece mesmo que ele não passou por aqui... Teria ele ido para outro quarto? Seja o que for, preciso pegar as minhas roupas de volta, e se elas estão aqui, então a minha lanterna deve estar também. A lanterna é o mais importante de tudo.

Adentro o quarto, com os ouvidos antenados a qualquer ruído, mas o silêncio domina. Chegando à cama, olho novamente ao redor. Pego a cueca e visto com rapidez. Pego o calção e o visto a seguir, dando uma rápida agachada para subi-lo até a minha cintura. Pego a camisa e a visto por cima da cabeça. Para calçar o tênis, sento-me na beirada da cama e calço um pé após o outro, amarrando os cadarços em nós firmes, com isso eu estou completamente vestido. Levanto-me da cama e me retiro do quarto. Nenhum sinal de Edimar Videlo.

Caminho lentamente pelo corredor, com os olhos girando para uma porta e para outra. O canto do meu olho esquerdo detecta uma luz. Viro o rosto para uma porta entreaberta e daqui avisto a minha lanterna acesa no chão. Estico a mão e empurro lentamente a porta. Vejo mais um quarto escuro e bagunçado. Ao entrar, fecho lentamente a porta atrás de mim. Agacho-me e pego a lanterna de volta. Não sei se é a mesma que estava usando, mas é exatamente igual. Desde que funcione, não faz diferença.

Jardines - Tragédia Utópica (Completo)Onde histórias criam vida. Descubra agora