16 de Fevereiro de 2020;
Miguel.
Ajoelhado na beira do lago, as lágrimas escorriam pelas bochechas sem permissão, até cair sobre as águas, pensando em cada minuto que se passou, bem ali. Queria afirmar que tudo aquilo poderia ser no máximo um pesadelo ruim, mas não era.
Confuso, mas pensar no que era apenas para ser uma manhã de domingo em família, se tornou a pior manhã de toda a minha vida.
A manhã havia começado de forma comum, como sempre. Jessy e Johnny acordaram mais cedo, e já me esperavam para nosso pequeno passeio de domingo no lago. Johnny estava bem mais animado que o comum, se isso fosse possível para uma criança, já que todos os dias ele era assim, só que um pouco mais. O garoto corria sem parar pela casa enquanto comemorava que hoje poderia mergulhar no lago junto comigo, seu "papai".
Sim, pai. Jovem demais para isso? Talvez. Mas ele e Jessy eram as pessoas unicamente preciosas na minha vida.
Eu nunca fui de fazer más escolhas, muito menos, fazer loucuras. Mas é o que acontece quando jovens sem pensar no dia de amanhã fazem, e eu não era diferente deles. Jessy foi a causadora disso, e o fato de sermos perdidamente apaixonados um pelo outro, tornava tudo mais.. difícil. Tempo depois, ela engravidou e em seguida nos casamos. E eu, em nenhum momento pensei em desistir, pois era ela (e agora Johnny) as únicas peças que faltavam na minha vida.
Como em todos os domingos, Jessy "tomaria Sol" e eu ensinaria nosso filho a nadar. Já naquele dia, eu havia alugado um barco só para nós três, apenas para desestressar de uma semana que foi cheia tanto para Jessy, que merecia o devido descanso, quanto para mim, que só queria me divertir com eles. Nós andamos lado a lado até o píer, onde o barco estava encalhado, entramos e dali, só pensava em espairecer e passar o tempo com a minha família.
Mas os planos mudaram, sem que notássemos.
Tudo mudou quando uma enorme nuvem escura, tomou conta de todo o céu acima do lago, e após os estranhos trovões, os raios caíam tão próximo ao barco que a estrutura tremia. O lago estava estranhamente mais agitado, e as ondas atingiam o barco com tanta força que a qualquer momento poderia virar.
Como se não fosse o bastante daquele estranho fenômeno natural, ventos fortes faziam tudo desaparecer de nossas vistas e tudo parecia totalmente fora do normal.
Jessy estava na água quando tudo começou, ela nadou até o barco e eu a segurei pelas mãos em uma tentativa desesperada de puxá-la para dentro do barco. Em vão.
— Segura minha mão! — Eu gritava desesperado como se aquilo fosse funcionar de alguma forma. Tentava segurá-la mais forte, mas algo parecia puxá-la de volta toda vez.
— Miguel!
Suas mãos estavam escorregando das minhas, e o vento era forte, a água também. O pequeno Jhonny estava abraçado em uma das pilastras do barco, chorando ao ver a cena. Até que vejo suas pequenas mãozinhas se soltarem daquela pilastra devido ao pequeno não ter força o suficiente para lutar contra o vento. E ali estava eu, entre salvar minha mulher ou o meu filho. E sabia que se decidisse o resgatar, teria que soltar Jessy, e o mesmo aconteceria se eu escolhesse segurar a mulher que amava.
Meus olhos e os de Jessy se encontraram, e antes mesmo que pudesse fazer algo, sentia ela lentamente desistir de tentar se salvar. Por mim, por nosso filho.
— Eu te amo. — Essas foram as últimas palavras que eu escutei saírem de seus lábios.
Jessy então soltou suas mãos das minhas caindo na água, logo desaparecendo em meio às ondas.
Eu corri o mais rápido que consegui para onde Johnny se encontrava e segurei seu pequeno corpo contra o meu, enquanto no mesmo instante uma grande onda vinha de encontro ao barco. E então, o barco virou.
Em meio às ondas formadas do lago, o desespero foi maior quando notei estar sem o garoto em meus braços, abria os olhos e podia ver destroços do barco que afundava a minha volta. Sem encontrá-lo, nadei até a superfície desesperadamente.
— JOHNNY! — Meus gritos eram de puro desespero. — Filho!
Sem resposta, voltei a mergulhar na água, e nadei por mais tempo do que imaginava aguentar sem respirar, mas em vão. Nem sequer Jessy eu pude encontrar. E nisso se passaram os minutos seguintes, até horas. Até que a exaustão me venceu e precisei nadar até a borda do lago.
Agora estava ajoelhado na beira do lago, as lágrimas escorriam pelas bochechas sem permissão, até cair sobre as águas, pensando em cada minuto que se passou, bem ali. Muitos questionamentos invadiam minha mente. A minha vontade era de retornar ao lago, e passar o resto da minha vida procurando por eles. Mas não era possível, pois os raios estavam se intensificando cada vez mais, o vento era tão forte que se formou um pequeno tornado no meio do lago, e agora, ele vinha na minha direção. Rapidamente me levantei de onde estava, e com muita relutância corri até o carro que estava próximo ao lago.
Ao dar partida no veículo segui diretamente para casa, mas o estranho era que no meio do caminho muitos carros e casas estavam destruídos, mas aquilo não parecia obra apenas de um possível tornado ou algo causado pela ventania. Havia algo a mais, mas era algo que eu não iria parar o veículo para saber.
Mesmo após o casamento, decidimos morar com meus pais por insistência dos mesmos, eles adoravam Jessy, e amavam o pequeno Jhonny. Sendo assim, a primeira coisa que fiz foi procurá-los. A casa de minha família não era distante, e era meu único destino agora. Então ao chegar na frente da residência, saltei do veículo apressado e adentrei a porta da frente como um foguete.
— Pai! — Grito enquanto atravesso o hall de entrada e a sala de estar. — Mãe?!
E então ao atravessar a porta para a cozinha ouvi um barulho alto de diversas panelas caindo ao chão.
— Mas o que.. — Travei no mesmo instante. — NÃO.. NÃO, NÃO, NÃO, NÃO!
Meu corpo perdeu as forças, se ainda havia alguma. Eu repetia a mesma palavra, como se fosse mudar algo se eu negasse o que estava vendo a minha frente.
O corpo de meu pai estava no chão da cozinha, faltava um membro, como se tivesse sido arrancado brutalmente por algo de extrema força. Seus olhos ainda abertos, transmitiam um olhar de pavor em seus últimos segundos de vida. O sangue ainda pingava quente de seu corpo, mas ele estava sem vida.
— Miguel... — Ouvi a voz que praticamente sussurrava, mas reconheceria aquela voz aonde quer que estivesse.
— M-mãe! — Me levantei de onde, estava seguindo aquela voz e a encontrei encostada no corredor ao lado da cozinha. — Não se mexe... Vai ficar tudo bem. Vai ficar.. eu prometo, mãe.
Aquelas palavras eram ditas mais para meu auto-convencer, pois o olhar da mulher a minha frente era de paz. Ela sabia que não sobreviveria aquele ferimento. Ela fitou meus olhos e sorriu.
— Não se preocupe. Está tudo bem, filho.. — Ela tentou me acalmar, mesmo que em seus últimos segundos de vida, ainda tentava me convencer de que tudo ficaria bem. Com sua voz que sempre me acolheu, que eu nunca esqueceria. — Eu te amo, filho.
Era a segunda vez que ouvia essa frase no dia de hoje, e era a segunda vez que ela era dita por alguém que eu amava, antes de perdê-la. Dentro de poucos segundos sua mão caiu sobre a minha, e não foi mais possível sentir sua respiração.
Ela havia partido.
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Elysium The End
General FictionMeu nome é Miguel, tenho 20 anos e aparentemente sou filho de Anúbis. Quem ele é? Um deus egípcio. Sim, deuses existem, mas não apenas um, e sim todos eles. Desde Zeus, até Tupã. Todos eles são reais, e estão em guerra. Confuso? Vou explicar de form...