Capítulo 2

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Internato Religioso aos arredores de Florença, agosto de 2018*

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Internato Religioso aos arredores de Florença, agosto de 2018*

Valéria

A conversa com o doutor de Santi não resultou em nada do que eu pretendia, mas que droga!

Faço o caminho de volta para o dormitório com um péssimo humor e lá está a minha companheira de quarto: gravidíssima e chorando pelos cantos, como sempre.

Juro que quero empatizar, quero mesmo, mas não tenho muita paciência para histórias trágicas de amor.

Ana Flor já me contou tudo o que aconteceu na sua vida e como ela veio parar aqui – uma merda que seja menor de idade e que tenha que enfrentar os pais para ter um pouco de independência, mas com isso, tenho certeza que o bom doutor a está ajudando.

Até me admiro que ela tenha mostrado alguma fibra ao correr atrás da própria emancipação e também da forma como ela se dedica aos estudos e está finalizando matérias muito rapidamente, mas quando ela começa a choramingar por causa do boy lixo e da falsiane que ela pensa que é sua amiga, juro que tenho que me conter para não bater o desconfiômetro pra dentro dessa garota!

Tá na cara que a tal Jacinta é a pior talarica que existe, mas ela se recusa a acreditar!

Aí quando eu mando a real, nossa, Valéria é péssima, Valéria não tem sentimentos, ah, faça-me o favor!

Sei que Ana Flor as vezes pensa que eu não gosto dela, que eu sou fria de propósito, mas não é nada disso! Eu só quero que essa garota acorde pra vida porque isso tudo é um desastre anunciado, mas ela não vê!

Só por que eu perguntei se no Brasil todo mundo é bocó assim, nossa, o mundo quase acabou!

___ Ah Florzinha, não vai me dizer que seu mundinho cor de rosa de amor tá abalado outra vez! – pergunto, depois que entramos na privacidade do nosso quarto.

___ Ele mudou tanto comigo, Valéria, nem parece a mesma pessoa naqueles e-mails, está com ciúme do doutor de Santi, chego a ficar ofendida!

___ Ele está com ciúme do doutor gostosão sem nem sequer saber como ele é? O cara é esperto!

___ Valéria!!!

___ Só você que parece que vê um velhinho solícito e assexuado quando trata com o doutor, Aninha, todas aqui acham ele gato e um poder naqueles ternos de três peças!

"Ainda que tenha sido um belo filho da puta comigo", é o que eu emendo em pensamento.

___ Tá, mas a gostosura do doutor a parte, e que parte! Seu "anjo" é bem idiota e olha que surpresa, ele é um cara, como você espera que fosse diferente?!?

___ Ele é diferente! – é claro que é isso que ela pensa, coitada! – Era...

___ Vai ver que é excesso de porra acumulada, você sabe o que dizem, sobe à cabeça e o cara tá só no cinco contra um já tem meeeses! – provoco para ver a cara de choque que ela faz, céus, não sei como é que essa menina está grávida, tão pudica! - E não vai dizer que com ele não é assim, ele é um cara amiga, dezoito anos e uma vida de responsabilidades, praticamente um pai de família com três irmãos pé no saco pra sustentar e cuidar, uma namorada há milhas de distância que ninguém pode saber e só traz problema pra ele, nossa, não me espanta se ele jogar tudo pro alto e extravasar de vez em quando!

___ Eu não trago só problema... Eu nunca quis ser um fardo pro João, eu...

___ É o maior problema da vida dele, Ana Flor! Se você não existisse pro João, o empregão dele não estava ameaçado, ele podia estar pegando geral e bem, não sofrer tanto. – OK, eu fui fundo demais dessa vez, até eu mesma consigo reconhecer isso!

Mas quando é que essa garota vai acordar pra vida? Eu só estou tentando fazer com que ela seja um pouco mais casca grossa! É praticamente um trabalho de caridade aqui, pessoal!

Então eu emendo:

___ Agora o que você tem que pensar, é como seria a sua vida se ELE não existisse! – aponto para ela – Todas essas lágrimas não estariam sendo derramas, você poderia estar planejando onde vai morar e como vai ser depois que pegar a grana dos seus pais a que tem direito e puder recomeçar a sua vida em qualquer lugar do mundo, e bem, antes disso, o quanto poderia aproveitar a companhia do Dr. de Santi quando ele te levar daqui e você já não estiver com esse barrigão nada sexy!

Rio, mas é claro que ela não acha graça nenhuma.

___ Não é de mim que você está com raiva, Flor, é da vida, mas se ela está uma merda nesse nível, só você mesmo pode fazer alguma coisa pra mudar!

Arremato e suspiro. Sei que não adiantou nada!

Só espero que tudo fique bem quando essa bomba realmente estourar!!!

Atualizo as minhas redes sociais com montagens de fotos das viagens que eu já fiz: para todos os efeitos, estou fazendo um mochilão pelo mundo enquanto decido que universidade vou cursar – como se o mundo não soubesse que eu vou fazer direito, ass...

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Atualizo as minhas redes sociais com montagens de fotos das viagens que eu já fiz: para todos os efeitos, estou fazendo um mochilão pelo mundo enquanto decido que universidade vou cursar – como se o mundo não soubesse que eu vou fazer direito, assim como o meu irmão, meu pai e meu avô.

Confesso que não é exatamente por causa da herança familiar que eu adoro as leis, no entanto: gosto do que posso fazer com elas, por aqueles que mais precisam.

Ao contrário do meu pai que é quase que exclusivamente um advogado empresarial e meu irmão que é tributário, eu não quero ganhar a vida ajudando empresários a encontrar lacunas que os fazem pagar menos impostos. Quero trabalhar para aqueles que tem problemas reais, como o que tenho em mãos exatamente nesse momento.

Por isso fiquei tão frustrada com a conversa com o doutor de Santi: ele é um advogado que batalha pelos direitos familiares, é bem conhecido pelo jeito, pesquisei sobre o cara assim que eu soube com quem teria que lidar aqui.

Imaginei que ele fosse querer o melhor para essa criança, que estivesse aqui para defender os direitos dela, em primeiro lugar!

Mas aí ele age como se EU estivesse fazendo alguma coisa errada. Mostra uma vã esperança de que eu vá mudar de ideia e criar esse bebê.

Em que mundo ele pensa que isso daria certo?

Olhe para mim por mais de cinco minutos: você realmente acha que eu tenho estrutura para criar um ser humano?

Eu, a imbecil que se apaixonou e foi abertamente enganada. Eu, que saí do armário por causa de um sentimento que foi exclusivamente destinado a uma única pessoa (eu nunca me senti atraída por qualquer mulher que não fosse Celine!), comprei uma briga com meus pais e a sociedade por algo que eu não faço ideia mesmo se sou!

Eu falo da Ana Flor, mas eu sou um trem descarrilhado prestes a se acidentar, porra!!! Como é que ninguém vê isso???

Só estou tentando fazer o melhor por essa criança, que é inocente de toda a idiotice e podridão que cercaram a sua concepção!

Mas aí eu sou julgada como fria, calculista, amoral. Eu vi tudo isso nos lindos olhos acinzentados do doutor.

Quer saber de uma coisa?

Foda-se! O doutor, a sociedade, o mundo!

Se eu era a pecadora que gostava de mulheres, agora sou a vadia que nem sabe quem é o pai do próprio filho.

Me julguem como quiserem!

Se é essa a máscara que eu vou ter que usar para passar por isso, que seja!

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*Parte desse Capítulo é contada do ponto de vista de Ana Flor Canavarro no Vol. 1 da série, "O nascer do Amor".

Jardim dos Girassóis - Vol. 3 - As Leis da LuxúriaOnde histórias criam vida. Descubra agora